Foto
– Trecho do livro “A tolice da inteligência brasileira”, de Jessé de Souza.
Tal como ocorre com Jair
Bolsonaro e seus filhos, a classe média brasileira, a qual de tempos em tempos se
manifesta nas ruas contra o governo trajando a camisa verde e amarela da
seleção brasileira de futebol, pede intervenção militar para tirar os petistas (comumente
chamados de petralhas por eles) do Palácio do Planalto, nutre sentimentos
saudosistas pelo regime civil-militar brasileiro, chama Jair Bolsonaro de
“Bolsomito”, diz que “o Olavo está certo”, acredita que programas sociais como
o Bolsa Família são esmolas e fábricas de vagabundos, tanto fala em
meritocracia (sendo que a meritocracia que eles pregam não passam de um
eufemismo para darwinismo social), vaia e xinga médicos cubanos em aeroportos, fala
que fulano da mídia que não comunga ideologicamente com eles é “pago pelo PT”, só
sabe falar em corrupção (e ainda trajando uma camisa que carrega o símbolo de
uma entidade extremamente corrupta e que tem arruinado cada vez mais com o
futebol brasileiro nos últimos anos, a CBF de Ricardo Teixeira, José Maria
Marin e Marco Polo del Nero), reclama dos 13 anos de PT no poder (mas ao mesmo
tempo fecha os olhos para os dois decênios de PSDB no governo do estado de São
Paulo), vaiou a Dilma em pleno Itaquerão durante a abertura da Copa do Mundo
2014 e que hoje em dia tem como herói o juiz Sérgio Moro e a República de
Curitiba, é comumente vista como fascista por seus detratores.
Uma que assim
classificou a classe média brasileira (em especial a de São Paulo) é a
professora Marilena Chauí. Em várias ocasiões a professora da USP (a qual
rejeita a ideia de que aqui no Brasil aqueles que ascenderam socialmente graças
a programas sociais como o Bolsa Família são uma nova classe média) assim a
classificou, como por exemplo, em um evento do PT em maio de 2013 (onde disse
que a classe média é “uma abominação política, porque ela é fascista, uma
abominação ética, porque ela é violenta, e ela é uma abominação cognitiva,
porque ela é ignorante”), em uma palestra no Sindicato dos Advogados de São
Paulo em julho de 2013 (discurso esse que causou muita polêmica na mídia) e a
entrevista ao grupo Jornalistas Livres em janeiro de 2016. O rótulo de fascista,
conceitualmente falando, faz ou não faz sentido no caso específico da classe
média brasileira, em especial a paulistana?
Foto
– Marilena Chauí sobre a classe média tupiniquim.
Nos pronunciamentos em
questão, a professora paulistana falou uma série de coisas corretas a respeito
da classe média tupiniquim, como por exemplo, o fato de que é uma abominação
política e que é ignorante (pois pensa e sonha em ser parte da classe
dominante, mas em realidade não é e nunca será), mas pisou na bola quando falou
que esse mesmo grupo social é fascista. E por que dizemos isso? Primeiramente,
dizer que a classe média é fascista implica em dizer que ela é partidária e/ou
simpática daquilo que Aleksandr Dugin[1]
chama de Terceira Teoria Política. Em algum momento essa classe média (salvo
talvez um ou outro gato pingado) se mostra simpática à ideologia fundada por
Benito Mussolini na década de 1920 ou qualquer um de seus derivados, entre eles
o Integralismo de Plínio Salgado. Não raro vemos essa gente classificar como
irmãos ideologias como o comunismo e o nazi-fascismo, com base no que diz gente
como Olavo de Carvalho (vulgo Sidi Muhammad Ibrahim) e outros de sua patota que
de quando em quando postam textos no site Mídia sem Máscara.
As periódicas
manifestações da classe média nos sugerem que esse estamento social, tal qual
Bolsonaro e seus filhos, é simpático ao sistema democrático liberal-burguês
vigente no Ocidente hoje em dia. Ao passo que o fascismo do tempo de Mussolini
não tinha esse mesmo apreço pela democracia liberal-burguesa, assim como era
avesso ao conservadorismo tradicional, era nacionalista e em seus primórdios
tinham uma proposta de mudança revolucionária da sociedade (ainda que depois da
ascensão ao poder tenham se enveredado uma política de conciliação de classes
similar a que Lula fez aqui no Brasil). E, além disso, como chamar essa classe
média de fascista sendo que ela se mostra bem despolitizada (ou politizada bem
porcamente) e que, do alto de sua soberba e arrogância, acha-se a suprassumo da
sapiência e do esclarecimento, mas que é tão ou mais alienada pela mídia de
massa quanto, por exemplo, os pobres de lugares como o sertão nordestino e as
favelas do Rio de Janeiro (com a diferença que as pessoas da classe média para
cima são os alienados gourmet)? A própria maneira com esses elementos tratam
temas como a corrupção demonstra bem isso. E a raiva com que a classe média tem
mostrado em suas periódicas manifestações contra o governo (quer seja nas ruas,
quer seja em redes sociais) é também sintomático do fato de que nesses anos
todos de poder o PT pouco ou nada fez para contrabalancear o poder de veículos de
comunicação de massa como a Rede Record, a Bandeirantes e a Rede Globo, no que
poderia tornar a guerra de informação com esses oligopólios menos desigual.
Muito pelo contrário, Lula e companhia limitada fizeram grandes investimentos
na mídia de massa (segundo artigo do DCM, cerca de R$ 6 bilhões foram
investidos na Rede Globo pelo próprio governo federal entre 2003 a 2013) ao
mesmo tempo em que pouca ou nenhuma atenção foi dada à mídia alternativa, muito
menos criaram uma versão tupiniquim da Ley
de Medios (lei essa que agora Mauricio Macri de tudo está fazendo para
reverter) ou do programa “Alô, Presidente” criado por Hugo Chávez na Venezuela.
Ou mesmo o que Vargas, em seu segundo mandato (1951 – 1954), fez quando criou o
jornal Última Hora (que na época era o único grande jornal que estava do seu
lado). Isso é algo que em um momento como o atual, em que o Partido dos
Trabalhadores se encontra sob o escrutínio público levado a cabo pelo conluio
judiciário-midiático, muita falta faz. E disso a República de Curitiba, diga-se
de passagem, muito bem se aproveitou. Se nada for feito para ao menos
contrabalancear o poder da mídia de massa, essa continuará a manufaturar ad eternum a opinião das pessoas (em
especial dos setores mais abastados) em favor de seus interesses e daqueles aos
quais são favoráveis contra governos de cunho mais popular e o povão continuará
agindo como se fosse uma manada raivosa, histérica e acéfala em manifestações
como a do dia 13 de março de 2016.
Portanto, taxar a classe
média brasileira de fascista e é tão ou mais impróprio quanto chamar Lula e o
PT de comunista e/ou bolivariano. Jessé de Souza, em uma entrevista concedida à
TV Brasil em abril de 2016, classificou esse estamento social como de extrema
direita do ponto de vista político-ideológico, afirmando que ela possui uma
espécie de racismo de classe para com as classes subalternas (o termo mais
correto para esse tipo de sentimento é ódio de classe. Já que pobre não é raça,
e sim estamento social). E. de acordo com Marilena Chauí, a classe média possui
um sonho e um pesadelo ao mesmo tempo: o sonho é ser capitalista (no sentido de
ser proprietária de meios de produção. Ou seja, um capitalista com capital) e
parte da classe dominante, e o pesadelo se proletarizar (ou seja, cair na
escala social e se tornar parte da classe trabalhadora). Dai que nasce aquilo
que a professora paulistana chama de “ideologia da ordem e da segurança”, ou
seja, que a ordem continue a mesma, sem uma única e mísera mudança ad eternum de forma a que suas fantasias
se realizem. E junto com isso vem toda a antipatia a qualquer governo que
resolva mudar essa situação (ainda
que faça mudanças bem superficiais que não mexam realmente com os privilégios
das classes dominantes, como o PT tem feito no Brasil desde 2003).
Resumindo a ópera: os
coxinhas da classe média brasileira, acima de tudo, são, em sua maioria (para
não dizer a totalidade), defensores do status
quo que ai está. São um bando de hipócritas de mão cheia: são uns leões
para denunciar as falcatruas de todo aquele que não comunga com sua cartilha,
mas, ao mesmo tempo, fecham seus olhos para as falcatruas dos políticos aos
quais eles são favoráveis (vê se algum desses elementos se importa, por
exemplo, com o fato de que o tucano José Serra quer entregar através do PL 131 a
Petrobrás para a Shell, a Chevron e outras grandes petroleiras internacionais.
Ou mesmo com escândalos de corrupção do tucanato tais como a privataria tucana,
o mensalão mineiro e o trensalão paulista). Para eles, tudo que importa é a
manutenção de seu status quo e nada
mais. Dai que vem a ojeriza dessa gente pelos petistas de um lado e de outro a
predileção pelo tucanato e por figuras como Ronaldo Caiado e Jair Bolsonaro,
que acabam exercendo a função de cães de guarda do status quo dessa gente. Ou seja, eles são aquilo que Aleksandr
Dugin chama de conservadores liberais. Segundo o pensador russo, o conservador
liberal é o tipo do sujeito que diz amém às mudanças liberais e o avanço do
mundo moderno unipolar, mas de forma mais gradual, e que acredita nos preceitos
liberais da modernidade e ao mesmo tempo acha que ainda é um pouco cedo para os
preceitos da pós-modernidade (ou seja, não se opõe de fato à pós-modernidade).
Mas,
se a classe média em realidade pouco ou nada tem de fascista, o que será que dá
margem para que gente como Marilena Chauí lhe darem esse rótulo? Da mesma forma
com que os termos comunista e bolivariano para a direita raivosa brasileira e o
termo nazista para os sionistas viraram espantalhos retóricos e porretes
linguísticos, para a esquerda, o fascismo ganhou o mesmo significado. Quando o
termo fascismo vem à mente das pessoas, ele geralmente é associado com palavras
como truculência e violência, assim como posturas reacionárias e refratárias a
movimentos e governos populares. E é esse tipo de postura da classe média que
dá margem para ele ser taxado de fascista. Mas há uma diferença abissal entre
ser truculento e refratário a governos de esquerda e movimentos populares
(coisa que qualquer um pode ser, independente da ideologia que professa) e ser
um fascista de fato, no verdadeiro sentido do termo.
Foto - Fascistas italianos x Coxinhas tupiniquins.
Fontes:
A república dos 7 x 1:
da Copa do Mundo ao impeachment. Disponível em: http://blogdojuca.uol.com.br/2016/05/a-republica-dos-7-x-1-da-copa-do-mundo-ao-impeachment/?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook
Arthur Lima – A quarta
ideologia. Disponível em: http://legio-victrix.blogspot.com.br/2015/11/arthur-lima-quarta-ideologia.html
As abominações da classe
média – Marilena Chauí. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=3MX5b3EfMAw
Para Jessé de Souza,
classe média é sadomasoquista ao apoiar as elites. Disponível em: http://jornalggn.com.br/noticia/para-jesse-de-souza-classe-media-e-sadomasoquista-ao-apoiar-elites
Por que o governo coloca
tanto dinheiro na Rede Globo? Disponível em: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/sobre-os-gastos-de-publicidade-do-governo/
Macri disuelve a la AFSCA y amenaza con anular Ley de Medios (em
espanhol). Disponível em:
Marilena Chauí – como
identificar a classe média. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=tL3xmEU7lAI
[1] Leia-se “Duguin”, pois no russo, assim
como em idiomas como o alemão, o polonês, o mongol e o japonês, o som da
partícula g (cirílico Г) não muda em função da vogal seguinte tal como nas
línguas latinas e no inglês.
Eduardo, você esqueceu de colocar nas referências a obra do Jessé de Souza.
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