segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Resposta a Thiago Braga - a indústria do Holodomor, ou do Holodomor enquanto enquanto avatar da russofobia hodierna

Foto – Thiago Braga.

Por meio do canal Brasão de Armas, Thiago Braga postou três vídeos a respeito do famigerado Holodomor nas últimas semanas. E em resposta a ele é que venho aqui escrever um artigo sobre o tema em questão. Tendo em vista que o mito do Holodomor é atualmente um dos principais alimentadores do ódio contra a Rússia que vemos hoje em dia.

Primeiro de tudo, a pergunta que fica no ar é: qual que é o jogo de Thiago Braga? O que Thiago Braga faz atualmente não é nada de novo. Visto que ele, como já dito antes, se utiliza do mesmo expediente que anteriormente tanto os irmãos Neto (Felipe Neto no tempo do Não faz sentido e Luccas Neto no tempo do Hater Sincero – depois de um tempo, ambos após fazerem o pé de meia deles passaram por um processo de branqueamento, jogaram os personagens que antes eles encarnavam para debaixo do tapete e hoje fazem de conta que eles nunca existiram) quanto o Nando Moura se utilizaram no passado para se promoverem na plataforma do You Tube.

Vendo o perfil ideológico do público que acompanha os vídeos dele nos dois canais dele (Brasão de Armas e Impérios AD), ao polemizar com pessoal de esquerda e pessoal islâmico, Thiago Braga quer dessa forma ganhar visibilidade e engajamento por parte do público dele. Em outras palavras, a típica manobra de jogar para a torcida.

E o pior de tudo é que se trata do mesmo Thiago Braga que em vídeo anterior queixou-se (e com razão) do ranço que muitos brasileiros têm em relação a Portugal. Até ai tudo bem. 

O problema é que ele não parece ter escrúpulo algum em alimentar preconceitos (e até mesmo ódio) em relação aos muçulmanos quando ele os retrata como decapitadores contumazes e que a prática de decapitação é algo inerente à religião fundada pelo profeta Muhammad no século VII (sendo que como Mansur Peixoto pontuou em um de seus vídeos, na França houve decapitação por meio de guilhotina até 1977 – ou seja, no ano do lançamento do primeiro Star Wars), e com pessoal de esquerda quando lança vídeos os espinafrando por meio de temas como mitos da Revolução Russa e Holodomor.

Não vai ser nenhuma surpresa se daqui algum um tempo alguma federação ou entidade islâmica do Brasil resolver mover processo judicial contra Thiago Braga por injúria, difamação e danos morais (lembrando que muitas das polêmicas de You Tube tanto dos irmãos Neto quanto de Nando Moura terminaram em processos judiciais, vide o processo que a família da Viih Tube, à época menor de idade, moveu contra os irmãos Neto e os processos de Felipe Neto contra Nando Moura). Como diz o velho ditado, quem procura acha.

Algo também digno de nota é que muitos direitistas, entre eles Marcelo Andrade e Wagner Tomazoni (canal Tragicômico), fizeram vídeos comentando o vídeo de Thiago Braga sobre o Holodomor (como também antes fizeram vídeos comentando os vídeos sobre os mitos da revolução russa), e até reagindo positivamente a ele. Eu, particularmente, não entendo esse pessoal da direita. Eles, que com razão criticam o Felipe Neto (e que fique bem claro uma coisa: quem acha que o Felipe Neto é do campo da esquerda assina um atestado de estupidez e burrice), não parecem dar-se conta de que Thiago Braga se vale do mesmo expediente que lá atrás o garoto do cabelo colorido, no tempo do Não Faz Sentido (ou seja, de quando ele encarnava o personagem antigo dele que usava óculos escuros e hoje faz de conta que nunca existiu), se utilizou para se promover no You Tube. Ou seria dois pesos e duas medidas da parte deles? Pelo visto, quando é para polemizar com esquerdistas e muçulmanos, tudo bem para esse pessoal.


Feito isso, vamos ao tema principal da resenha, a indústria do Holodomor e o Holodomor enquanto alimento da russofobia hodierna e do ódio secular do Ocidente “livre e democrático” para com a Rússia. E isso independente do regime vigente na nação de Gogol, Puškin e Tolstoj. Quer seja o regime imperial, quer seja o comunismo soviético, quer seja a atual república federativa.

Já vou deixando bem claro uma coisa: não vou entrar na presente resenha no mérito de se o Holodomor é verdade ou mito. Pois, em minha humilde opinião, o mais importante dos eventos ocorridos na atual Ucrânia em 1932 e 1933 não são os eventos por si mesmos. Se o poder soviético liderado por Stalin promoveu ou não promoveu uma fome com intenções genocidas contra a população nativa da Ucrânia no biênio em questão. E sim quem promove tais narrativas e como que a narrativa do mesmo vem justificando a russofobia mundo afora, além da instrumentalização do mesmo para promover dentro da Ucrânia a agenda político-ideológica dos grupos políticos que triunfaram primeiro com a Revolução Laranja em 2004 e depois com o golpe do Euromaidan em 2014, com vistas ao estabelecimento de um estado reacionário baseado no sectarismo étnico-religioso.

Norman Gary Filkenstein, judeu sobrevivente dos campos de concentração nazistas, criou um termo para se referir à exploração política e midiática do Holocausto no pós-guerra por parte tanto de Israel quanto de judeus da diáspora, a “indústria do Holocausto”, que inclusive é título de um livro dele publicado em 2000. Incluindo em primeira instância chantagens a bancos suíços, indústrias alemãs e até mesmo países europeus (lembrando que durante muitos anos a Alemanha pagou indenizações a Israel) e o uso por parte de Israel para legitimar seu projeto político no Oriente Médio, incluindo não só o que estamos vendo agora com as ações de Israel na Faixa de Gaza, como também a balcanização de nações árabes e islâmicas como o Iraque, a Síria e a Líbia em última instância.

Com o assim chamado Holodomor também há uma indústria ideológica similar, para não dizer idêntica, tanto no Ocidente em suas cruzadas ideológicas contra a Rússia quanto dentro da Ucrânia, um país dividido entre partes pró-Rússia e pró-Ocidente por conta de fatores como os longos anos de domínio polaco-lituano e austríaco principalmente nas regiões ocidentais do país (algo que os resultados dos seguidos pleitos eleitorais evidenciam), para justificar não apenas a glorificação de figuras históricas outrora execradas tanto sob a Rússia Imperial quanto sob a União Soviética, como também políticas de afastamento em relação à Rússia e de aproximação para com o Ocidente, e em última instância até mesmo de adesão à União Europeia e à OTAN e o massacre da população russófila das regiões sul e leste da Ucrânia. Em outras palavras, o Holodomor enquanto fator legitimador de episódios como o incêndio ao sindicato de Odessa, ocorrido em 2014.

Foto – As divisões internas da Ucrânia.

Dessa forma, pode-se dizer que o Holodomor exerce para a Ucrânia atual papel similar ao que o Holocausto exerce para Israel.

Como dito na primeira parte, após o fim da Segunda Guerra Mundial muitos dos colaboradores ucranianos dos nazistas lograram fugir e se estabelecer no Ocidente, em especial na Alemanha Ocidental (destino de Bandera), nos Estados Unidos e no Canadá. Algo digno de nota é que recentemente, no Parlamento Canadense, houve uma homenagem a um ex-membro da divisão galiciana da SS, Jaroslav Gunka, de 98 anos. E detalhe: na sessão em que a homenagem teve lugar lá estavam presentes não apenas Justin Trudeau, atual premiê do Canadá, como também Volodymyr Zelenskij, atual presidente da Ucrânia. O escândalo que a homenagem em questão gerou foi tal que Rússia e Polônia cogitam expedir pedidos internacionais de prisão para Gunka.

Em 1987, passados já quase meio século do fim da guerra, Douglas Tottle lança o livro “Fraud, Famine and Fascism”. O que o cherry-picking bem típico de Thiago Braga não mostra é que antes de Douglas Tottle lançar o livro dele a diáspora colaboracionista ucraniana estabelecida no Canadá não apenas financiou a produção do filme “Colheita do desespero”, como também queria inserir no currículo escolar canadense do ensino médio a narrativa da fome-genocídio.

Segundo Elena Blinova em seu artigo de 2015 publicado no Sputnik News, “Holodomor Hoax: Joseph Stalin’s crime that never took place”, a narrativa da fome-genocídio promovida pelo poder soviético na Ucrânia no biênio 1932/1933 perpetuou-se da seguinte forma após a derrota dos nazistas na guerra:

“A CIA acreditou que o nacionalismo ucraniano poderia ser usado como uma arma eficiente da Guerra Fria. Enquanto os nacionalistas ucranianos proveram Washington com informação valiosa sobre seus rivais de Guerra Fria, a CIA em troca estava colocando os veteranos nacionalistas em posições de influência e autoridade, ajudando-os a criar instituições semi-acadêmicas ou posições acadêmicas em universidades existentes. Ao usar estas redes acadêmicas formais e informais, os nacionalistas ucranianos disseminaram propaganda anti-Rússia, criando mitos e reescrevendo a história e ao mesmo tempo branqueando os crimes de guerra da OUN-UPA”.

Sobre os colaboradores ucranianos dos nazistas que após a guerra estabeleceram diáspora em países como a Alemanha Ocidental, os Estados Unidos e o Canadá, a história deles foi branqueada e reescrita de tal forma que eles passaram a ser apresentados não como colaboradores dos nazistas que estiveram envolvidos em toda sorte de terríveis crimes de limpeza étnica contra judeus, russos, poloneses e tchecos que eles de fato foram, e sim como combatentes pela liberdade que pela independência da Ucrânia lutaram tanto contra os nazistas quanto contra os comunistas soviéticos.

Blinova segue dizendo o seguinte, sobre o papel da diáspora ucraniana no Ocidente na formação da ideologia da Ucrânia pós-independência:

“Após o colapso da URSS, a diáspora ucraniana desempenhou um papel substancial em formar a ideologia do novo Estado ucraniano. ‘Diferente de muitas outras antigas repúblicas soviéticas, o governo ucraniano não precisou desenvolver novos mitos nacionais do zero, mas importou conceitos prontos desenvolvidos na diáspora ucraniana’, Dr. Rudling sublinhou”.

E ainda sobre o desenvolvimento desse mito na Ucrânia após a Revolução Laranja de 2004:

“Entretanto, foi sob o presidente ucraniano Viktor Juŝenko (que obteve seu poder após o levante apoiado pelo Ocidente de Maidan, também conhecido como a Revolução Laranja) quando o mito anti-russo ganhou seu segundo impulso na Ucrânia. Sob Juŝenko, muitas instituições de ‘gerenciamento de memória’ e ‘criação de mito’ foram estabelecidas no país”.

Na Ucrânia após a Revolução Laranja de 2004, com a ascensão de Vyktor Juŝenko ao poder, o conto do Holodomor não apenas passa a ser promovido na Ucrânia, como também figuras históricas antes execradas nos tempos tzarista e soviético, tais como o chefe cossaco Ivan Mazepa (o qual se aliou com a Suécia contra a Rússia na Grande Guerra do Norte [1700 – 1721], ocorrida durante o reinado de Pedro o Grande) e colaboradores ucranianos dos nazistas como Stepan Bandera e Roman Šukhevyč, foram reabilitadas e passaram a ser exaltadas e glorificadas (lembrando que após o término da Segunda Guerra Mundial, a União Soviética ainda teve que enfrentar os remanescentes da OUN-UPA nos Cárpatos até o começo dos anos 1950, como também enviou agentes ao Ocidente para dar cabo de alguns deles, como foi o caso de Bandera em 1959).

E, para piorar ainda mais as coisas, durante o governo Juŝenko (o qual enviou tropas ao Iraque e ao Afeganistão em apoio a Bush II) na Ucrânia chegou-se ao ponto de Bandera ser considerado e exaltado como herói da Ucrânia (título esse revogado em 2011, com Janukovič no poder, pelo judiciário ucraniano). E segundo denúncias do jornalista Oles Buzina, na época de Juŝenko bonecos de Hitler eram vendidos em lojas ucranianas. Ele mesmo disse o seguinte à época:

“As políticas dos líderes de governo ucranianos levam a um renascimento do neonazismo. Quando (o general Roman) Šukhevyč, que foi oficial das tropas de Hitler, ganha uma condecoração de herói da Ucrânia, é natural que o boneco de Hitler se torne um brinquedo obrigatório nos quartos dos meninos do país”.

Buzina veio a ser morto em 2015, em um atentado promovido por elementos da extrema direita ucraniana.

Foto – Juŝenko ao lado de veteranos de guerra que participaram da divisão galiciana da Waffen SS na Segunda Guerra Mundial.

Após o golpe do Euromaidan em 2014 ocorre o seguinte processo na Ucrânia:

“Forças nacionalistas e fascistas, como o ‘Setor da Direita’ e o ‘Partido Svoboda’, que participaram do novo governo ucraniano, pressionaram por uma nova legislação em um esforço para criminalizar a ideologia comunista e proibir a atividade política dos comunistas. Ao mesmo tempo, os batalhões fascistas foram reorganizados, os neonazistas se juntaram às fileiras do mecanismo estatal e os ataques contra as pessoas que usam a língua russa aumentaram. Tudo isso aconteceu sob a cumplicidade dos EUA e da UE, que usaram a Ucrânia como um ‘cavalo de Tróia’ contra seu concorrente, a Rússia”.

Para além do surgimento de batalhões de extermínio neonazistas como o Batalhão Azov e outros, o então presidente Petro Porošenko assinou em 2015 um projeto de lei que incluía as seguintes disposições legais:

“– Lei nº. 2558: ‘Sobre a condenação dos regimes totalitários comunistas e nacional-socialistas (nazistas) e a proibição da propagação de seus símbolos’ — Isso incluiu a remoção de monumentos comunistas e a renomeação de locais públicos com nomes relacionados a temas comunistas”.

“– Lei nº. 2538-1: ‘Sobre o status legal e a honra da memória dos combatentes pela independência da Ucrânia no século 20’ – elevando várias organizações, incluindo o Exército Insurgente Ucraniano, a Organização dos Nacionalistas Ucranianos e grupos pró-nazistas, ao status oficial que assegura benefícios sociais aos seus membros sobreviventes”.

“– Lei nº. 2539: Sobre a memória da vitória sobre o nazismo na Segunda Guerra Mundial, 1939-1945”.

“– Lei nº. 2540: ‘Sobre o acesso aos arquivos dos órgãos repressivos do regime totalitário comunista de 1917-1991”.

Como resultado da implantação da lei nº 2558, em 2016, as autoridades ucranianas, em uma canetada, renomearam 987 cidades/aldeias e 51493 ruas, além de removerem 1320 dedicados a Lenin e outros 1069 dedicados a outros eminentes comunistas, muitos dos quais foram vandalizados e depredados por grupos de extrema direita. Além disso, na mesma época, o Partido Comunista da Ucrânia e todas as organizações comunistas foram proibidos, a tal ponto que membros do Partido Comunista e da Juventude Comunista Leninista da Ucrânia foram submetidos a perseguições ao passo que os escritórios deles se tornaram alvo de recorrentes batidas policiais.

E, diga-se de passagem, esse fenômeno de reabilitação de colaboradores dos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial não é uma exclusividade ucraniana. Também ocorre em outras nações da Europa oriental tais como os países bálticos e a Polônia. Não apenas desfiles periódicos de veteranos de guerra que fizeram parte de divisões locais da Waffen SS periodicamente ocorrem (a exemplo dos países bálticos que outrora foram parte do Império Russo e da União Soviética), como leis foram passadas de criminalização simultânea do nazismo e do comunismo.

Foto – desfile de ex-membros de divisões da Waffen SS em Riga, Letônia, 2009.

Na Polônia, em 2018 o presidente Andrzej Duda sancionou uma lei que prevê pena de três anos para quem ousar falar sobre a participação de colaboradores locais dos nazistas no Holocausto. E isso nada mais é que uma forma de proteger e ocultar (e até mesmo glorificar) os colaboradores locais dos nazistas, ao mesmo tempo em que os nazistas alemães são feitos de bois de piranha (sendo que geralmente o elemento colaboracionista é quem sujava as mãos com chacinas e limpezas étnicas na Europa ocupada pelos nazistas). E o que é pior: Eduardo Bolsonaro (vulgo Dudu Bananinha) tentou trazer estas leis ao Brasil por meio do PL 4425/2020 (vale ressaltar que em manifestações pró-Bolsonaro apareceram bandeiras rubro-negras do Setor de Direita, e Sara Winter nessa mesma época falava em “ucranizar o Brasil).

Foto – Manifestante do Euromaidan carregando retrato de Bandera.

E ai eu pergunto, será que o Thiago Braga, em algum momento vai falar alguma coisa a esse respeito da gênese do mito do Holodomor? Será que em algum momento ele irá falar que os colaboradores ucranianos dos nazistas existiram, que eles formaram batalhões especiais dentro da Waffen SS e que alguns deles passaram a ser glorificados como heróis da Ucrânia a partir do governo Juŝenko? E de tudo o que o mito do Holodomor, originalmente gestado pela imprensa nazista e por Hearst (um dos muitos bacanas do mundo dos negócios americano que no período entre 1933 a 1945 fizeram negócios com os nazistas) e depois requentado e promovido pelo governo Reagan, pela diáspora colaboracionista ucraniana no Ocidente e pelos governos Juŝenko, Porošenko e Zelenskij, legitima, incluindo a glorificação como heróis de colaboradores ucranianos dos nazistas, assim como a limpeza étnica da população russófila do sul e do leste da Ucrânia e perseguições a partidos de esquerda na Ucrânia?

Em outras palavras, a narrativa do Holodomor no fim das contas serve como legitimador de um projeto de nação baseada no exclusivismo étnico-religioso em um país etnicamente diverso e da Ucrânia como se fosse uma a antítese de tudo o que a Rússia historicamente sempre representou, que faz com que a Ucrânia faça em regiões como Donbass a mesma coisa que Israel vem fazendo na Palestina desde 1948 e o que os curdos peršmergas (com a assessoria militar de Israel) fizeram no norte do Iraque ao promover limpezas étnicas de yazeditas, árabes, assírios e turcomenos após a queda do regime baathista em 2003.

Foto – Nakba ontem e hoje. Palestina em 1948 à esquerda e Donbass em 2014 à direita.

E, do ponto de vista geopolítico, transforma a Ucrânia em uma espécie de punhal prestes a ser fincado no ventre da Rússia (para se ter noção do que seria a Ucrânia com bases da OTAN para a Rússia, é só lembrar da situação que o Iraque amargou no período entre 1991 a 2003, no qual a nação mesopotâmica, à época comandada por Saddam Hussein, não apenas foi submetida a embargos econômicos e a zonas de exclusão aérea no norte e no sul, como também a periódicos ataques de mísseis balísticos disparados a partir de bases americanas em outros pontos da Ásia sul-ocidental). Sem levar em consideração o que vem acontecendo na Ucrânia desde 2014 (ou se quisermos recuar ainda mais, desde 2004, quiçá desde 1991), você não entende os motivos pelos quais a Rússia, no ano passado, promoveu a Operação Militar Especial contra a Ucrânia (operação essa que o mesmo Thiago Braga, no vídeo “terror em Israel: decapitações e a justificativa histórica terrorista”, classificou como assassina).

Mas, a julgar pelo fato de que o mesmo Thiago Braga quer polemizar com a esquerda com vistas a promoção pessoal e obtenção de engajamento no You Tube, tenho sérias dúvidas. Afinal, falar sobre essas coisas seria algo contraproducente para ele e o propósito dele, no mínimo. Além de tratar de coisas que o público majoritário dos vídeos dele não gostaria de ouvir.

Fontes:

A descomunização da Ucrânia e a ascensão do fascismo. Disponível em: A descomunização da Ucrânia e a ascensão do fascismo – PCB – Partido Comunista Brasileiro

Ato pró-Bolsonaro teve bandeira de movimento ucraniano. O que ela significa? Disponível em: O que significa a bandeira ucraniana usada em um ato pró-Bolsonaro (gazetadopovo.com.br)

Crise ucraniana: os crimes de Stepan Bandera, herói dos neonazistas ucranianos. Disponível em: A Página Vermelha: CRISE UCRANIANA: Os crimes de Stepan Bandera, herói dos neonazistas ucranianos (apaginavermelha.blogspot.com)

Governo ultranacionalista da Polônia aperta o cerco contra os historiadores do Holocausto. Disponível em: Governo ultranacionalista da Polônia aperta o cerco contra os historiadores do Holocausto | Internacional | EL PAÍS Brasil (elpais.com)

Holodomor hoax: Joseph Stalin’s crime that never took place (em inglês). Disponível em: Holodomor Hoax: Joseph Stalin's Crime That Never Took Place - 09.08.2015, Sputnik International (sputnikglobe.com)

MUNDO: Ucrânia, uma vez mais dividida. Disponível em: A Página Vermelha: MUNDO: Ucrânia, mais uma vez dividida (apaginavermelha.blogspot.com)

O Holodomor, novo avatar do anticomunismo europeu. Disponível em: O Holodomor, novo avatar do anticomunismo "europeu" - Vermelho

Os sete mitos criados pela mídia ocidental que ajudaram a destruir o Iraque (2). Disponível em: Os sete mitos criados pela mídia ocidental que ajudaram a destruir o Iraque (2) (correiocidadania.com.br)

PL 4425/2020: Projeto de lei. Disponível em: Portal da Câmara dos Deputados (camara.leg.br)

Presidente da Polônia sanciona lei sobre o holocausto. Disponível em: Presidente da Polônia ratifica lei sobre Holocausto – DW – 06/02/2018

Pre-war “democratic and peaceful” Europe. Western countries (em inglês). Disponível em: Pre-war "democratic and peaceful" Europe. Western countries (topwar.ru)

Projeto de lei de Eduardo Bolsonaro quer criminalizar apologia ao comunismo. Disponível em: Projeto de Eduardo Bolsonaro quer criminalizar apologia ao nazismo e comunismo (uol.com.br)

Stepan Bandera: quem foi o colaboracionista nazista que se tornou símbolo da direita ucraniana. Disponível em: Stepan Bandera: quem foi o colaboracionista nazista que se tornou símbolo da direita ucraniana | Hypeness inovação e criatividade para todos

Ukrainian nationalism as a ‘Cold War weapon’ (em inglês). Disponível em: Ukrainian Nationalism as a ‘Cold War Weapon’ | The Vineyard of the Saker

sábado, 18 de novembro de 2023

A conspiração Saddam-Al Qaeda (texto da página História Islâmica + comentários meus)

 

(Veja o carrossel na íntegra em: https://www.instagram.com/p/Czuf4joLegH/)

Os atentados de 11 de Setembro inauguraram uma nova era na geopolítica do Ocidente, com incursões injustificadas a países não-alinhados ao eixo estadunidense-europeu sob alegações dúbias e a criação de todo um aparato ideológico para justificá-las aos olhos da opinião pública.

Toda uma indústria de think tanks, pensadores e conspirações emergiu do dia para a noite - do resgate da teoria do “Choque de Civilizações” de Samuel P. Huntington, fortemente criticada no meio acadêmico desde sua gênese, ao destaque de figuras como Robert B. Spencer, um conspiracionista.

O impacto foi tamanho que antes minorias paquistanesas que eram categorizadas como “povos asiáticos”, dentre outros, passaram a ser catalogadas nos dados oficiais do Reino Unido como “minorias muçulmanas”, de modo a facilitar a investigação e a categorização de todo e qualquer aderente ao Islã como suspeito.

George W. Bush, buscando criar e resgatar toda uma imagética ancestral ligada à contenda contra muçulmanos, chegou a proclamar uma “cruzada contra o terrorismo” - invadindo posteriormente países de ideologia nacionalista-secular, como o Iraque governado pelo Baath de Saddam Hussein, que possuem inimizade histórica com extremistas.

Foi nesse caldeirão cultural de conspiracionismo e anseio por guerra que nasceu a conspiração Saddam-Al Qaeda, que segundo Tony Blair, a CIA, a NSA e outros atores geopolíticos e agências de inteligência, não possuíam factualidade, dada a ideologia baathista do presidente Saddam Hussein.

Posteriormente, então, a opinião pública e jornalistas independentes começaram a notar os furos na narrativa do Pentágono, ansiando por respostas por parte da Casa Branca. Veio então a alegação posterior, falsa, de que o Iraque estava produzindo e utilizando armas de destruição em massa.

Mesmo assim a guerra prosseguiu, deixando um rastro de mais de um milhão de mortos, direta e indiretamente, como consequência da guerra, além de surtos de anemia, tuberculose e diversas outras doenças ligadas à insegurança alimentar e à destruição da infraestrutura do país, que até os dias atuais não se recuperou.

O parlamentar democrata Jason Crow, veterano do conflito no Iraque, reconhecendo a responsabilidade do governo de seu país e das agências de inteligência, dedica parte de sua carreira à denúncia da guerra e à busca por respostas, dados os gigantescos danos que o conflito causou no povo iraquiano.

Fato é que o presidente George W. Bush, obcecado com o regime iraquiano segundo fontes ligadas à Casa Branca, iniciou um conflito sem justificativa no direito internacional que gerou fome, miséria, morte e um lastro de sofrimento que, até os dias atuais, segue marcando profundamente a geografia, o corpo e a alma dos iraquianos.

Bibliografia:

- “Ataques do 11 de Setembro”. Wikipedia.

- KARIM, Kaleef K. “5 LIES Robert Spencer Made On Islam In The Debate With James R. White”. Discover the Truth. 2017.

- ABRAHAMIAN, Ervand. “The US media, Huntington and September 11”. Carfax Publishing. 2003.

- “George W. Bush 1946 – American Republican statesman, 43rd President 2001–9”. Oxford Reference. 2017. “This crusade, this war on terrorism is going to take a while”.

- RIEDEL, Bruce. “9/11 and Iraq: The making of a tragedy”. Brookings. 2021.

- “Saddam-Al-Qaeda Conspiracy”. Wikipedia.

- MERCHANT, Nooman. “Iraq WMD failures shadow US intelligence 20 years later”. AP. 2023.

- KARAM, Zeina. ABDUL-ZAHRA, Qassim. “Death and suffering in Iraq a painful legacy of 9/11 attacks”. AP. 2021.

- NODELL, Bobbi. “Study: Nearly 500,000 perished in Iraq war”. UW News. 2013.

- “Iraqi Refugee Health Profile”. CDC: Center for Disease Control and Prevention.

- KESSLER, Glenn. “The Iraq War and WMDs: An intelligence failure or White House spin?” The Washington Post. 2019.

- POYNTING, Scott. MASON, Victoria. ““Tolerance, Freedom, Justice and Peace”?: Britain, Australia and AntiMuslim Racism since 11 September 2001”. Routledge. 2006.

- CHALLAND, Bottici. CHALLAND, Benoit. “The Myth of the Clash of Civilizations”. Routledge Advances in Middle East and Islamic Studies. 2010.

Fonte: https://www.youtube.com/post/UgkxRYRzWWdDWUgwusMmgDlRvXFVMOsz74gc

MEUS COMENTÁRIOS

Mais um ótimo texto que encontrei na comunidade do You Tube da página História Islâmica e que eu trago para este blog.

Depois de seis artigos seguidos sobre a questão palestina, trago um artigo sobre o Iraque e as mentiras que foram criadas ao longo de vários anos para justificar a destruição da nação mesopotâmica. E uma dessas muitas mentiras, ventiladas por figuras como Bush II e os ideólogos neoconservadores de sua administração com vistas a justificar as aventuras militares de seu governo, é a suposta ligação do regime baathista iraquiano com a Al Qaeda de Osama Bin Laden. Até insinuaram à época que o Iraque estava envolvido com os ataques do 11 de setembro de 2001 (sendo que dos 19 terroristas dos atentados em questão, 15 eram sauditas e nenhum deles era iraquiano).

Entretanto, a mentira da ligação do regime baathista iraquiano com a Al Qaeda não foi a primeira dessas que ao longo de vários anos foram criadas e depois espalhadas aos quatro ventos. Em outras palavras, é apenas a ponta do iceberg das mentiras que se criaram ao longo desse tempo todo.

Pode-se dizer que a acusação lançada em 1988 pelo então secretário de Estado dos EUA, George Schultz, foi o ponto zero, o momento no qual o ovo da serpente foi chocado. À época, Schultz, sem apresentar evidência concreta alguma, acusou Saddam Hussein de utilizar armas químicas contra os curdos iraquianos no vilarejo de Halabdža. Após a acusação de Schultz, sanções contra o Iraque foram aprovadas pelo Senado dos EUA.  Segundo o professor Ramez Maalouf em uma de suas colunas publicadas no Correio da Cidadania, “A acusação de Schultz contra Saddam Hussein foi brandida como a grande prova incomensurável da brutalidade, sadismo e selvageria de como o líder iraquiano tratava sua própria população. Ela serviu como o mais forte pretexto para as invasões ianques do Iraque em 1991 e 2003”.

A acusação contra Saddam feita por Schultz logo foi desmascarada pelo ex-analista da CIA, Stephen Pelletiere, que escreveu um artigo no qual mostrou que a acusação de Schultz não fazia sentido algum (e os meios de comunicação ocidentais se omitiram a esse respeito, visto que as provas que ele apresentou eram irrefutáveis). E que o ataque químico em questão não foi feito pelo Iraque, e sim pelo Irã, visto que o gás usado neste ataque era o cianeto, o gás usado pelo Irã na guerra Irã-Iraque, e não o gás mostarda, o gás usado pelo Iraque na mesma guerra.

Em 1990, com George H. W. Bush, o Bush I, à frente da Presidência dos Estados Unidos, houve o testemunho de Nayirah, uma garota de 15 anos, a qual acusou em um comitê de direitos humanos do Congresso dos Estados Unidos o exército iraquiano de promover crimes de guerra durante a invasão ao Kuwait. E uma dessas atrocidades, descrita por ela aos prantos, é que as tropas iraquianas invadiam hospitais e retiravam bebês de incubadoras para estes morrerem no chão frio. O depoimento de Nayirah foi retransmitido para todo o território dos EUA, além de ter sido amplamente divulgado na imprensa internacional e por ONGs de direitos humanos.

No fim das contas, o depoimento de Nayirah serviu de pretexto para Bush I, aproveitando-se do vácuo de poder que o enfraquecimento (e posterior esfacelamento) da União Soviética estava deixando sobre a Eurásia, primeiro levantar sanções econômicas ao Iraque ainda em 1990 e um ano mais tarde invadir a nação mesopotâmica por meio da Operação Tempestade do Deserto. E também se revelou uma farsa: depois do fim da Primeira Guerra do Golfo descobriu-se que a história descrita por Nayirah era falsa.

E o buraco era ainda mais embaixo: também se descobriu que o sobrenome dela é al-Sabah e que ela era filha do embaixador do Kuwait em Washington, Saud Nasser al-Sabah (que esteve presente na audiência da filha).

Bush I não conseguiu derrubar Saddam Hussein com a Operação Tempestade do Deserto, e por conta de seu fracasso no Iraque não conseguiu se reeleger Presidente dos Estados Unidos em 1992, visto que perdeu o pleito eleitoral daquele ano para o democrata Bill Clinton.

Sob o pretexto de que o Iraque tinha a posse de armas de destruição em massa, as sanções levantadas por Bush I continuaram sob Clinton. No período de 1991 a 2003, o Iraque foi submetido a seguidos ataques de mísseis balísticos lançados a partir de bases norte-americanas no Oriente Médio, como em 1993, 1994, 1996 (Operação Golpe no deserto), 1998 (Operação Raposa do Deserto), 1999 e 2002/2003 (Operação Foco Sul), além de sob o pretexto de proteger os curdos (os quais sob a liderança de grupos como os peshmergas há muito tempo vêm almejando estabelecer no norte do Iraque um estado à imagem e semelhança de Israel, calcado no exclusivismo étnico-religioso) e os xiitas de genocídios submeter o país a zonas de exclusão aérea no norte e no sul.

Data dessa época uma entrevista de Madeleine Albright, secretária de Estado dos EUA durante o governo Clinton, no qual ela diz que em nome da mudança de regime em Bagdá as mortes decorrentes das sanções econômicas impostas ao Iraque valiam a pena.

Em 2000, Saddam Hussein resolveu parar de negociar o petróleo iraquiano com base no dólar, dando preferência a outras moedas como o euro e o rublo. Do outro lado do Atlântico, George W. Bush, o Bush II, vence o democrata Al Gore no pleito presidencial americano.

Bush II, uma vez no poder, também lança seu arsenal de mentiras e lorotas para justificar a invasão ao Iraque (em conjunto com a Inglaterra) em 2003. Ele não apenas acusou o Iraque de cumplicidade e envolvimento com a Al Qaeda, como também de envolvimento com os ataques de 11 de setembro de 2001. Em 2002, inventou a história de que Irã, Iraque e Coréia do Norte formavam um famigerado “eixo do mal” (um eixo na prática inexistente, visto que Irã e Iraque, depois de 1979, nunca se entenderam – e nos primeiros anos após a queda do regime baathista no Iraque, Irã e EUA formaram uma espécie de condomínio no Iraque), e ainda por cima requentou acusações de posse de armas de destruição em massa que vinham desde os tempos de Bush I e Clinton e que ajudaram a justificar sanções econômicas contra a nação mesopotâmica.

Em 2014, o professor Ramez Maalouf publicou em suas colunas no Correio da Cidadania uma série de quatro artigos sobre os mitos difundidos pelos grandes meios de comunicação que ajudaram a destruir o Iraque, e que em última instância abriram o caminho para o surgimento do Estado Islâmico na nação mesopotâmica.

E o mais escabroso a respeito desses mitos é que amplos setores de esquerda engolem tais mentiras de forma acrítica. E é assim que a Dinastia Bush (e em menor grau os Clinton também) pôde fazer o que fez com o Iraque desde 1991.

Essa esquerda, representada no Brasil por partidos como PSOL, PSTU e outros afins (e até mesmo setores mais à direita dentro do PT), tem um comportamento, digamos, um tanto quanto peculiar e inusitado. Sempre que determinado regime, por uma questão de sobrevivência, precisa se fechar e até mesmo utilizar-se da força contra aqueles que conspiram para sua queda, eles passam a entoar mantras como “Assad tem que cair”, “fora Maduro”, “abaixo Evo Morales”, “Kadaffi nunca mais”, “tchau Dilma” e outros afins em nome da liberdade, dos direitos humanos e da democracia. Apoiam todo e quanto é tipo de revolução colorida mundo afora, que geralmente termina de forma catastrófica para o país por ela flagelado.

Em minha humilde opinião, a raiz de tal comportamento por parte de expressivos setores da esquerda brasileira em tais situações vem do fato de que, segundo o que Nildo Ouriques aponta em sua obra “O colapso do figurino francês” (sobre a qual fizemos um resumo dividido em cinco partes aqui mesmo há três anos), essa esquerda, influenciada pelo pensamento uspiano, pensa determinados fenômenos sociais e políticos a partir de dualidades binárias, entre elas o “moderno x atrasado” e o “democrático x autoritário”, sem levar em consideração que tais dualidades na verdade na verdade são partes de unidades contraditórias, e não elementos estanques entre si.

Dai que quando eles analisam, por exemplo, não apenas as experiências socialistas do século passado como a União Soviética, a República Popular da Mongólia, a República Popular da China, a Coréia do Norte e o Vietnã, como também o Iraque sob Saddam Hussein, a Líbia sob Muammar al-Kadaffi, o Egito sob Gamal Abdel Nasser, a Síria sob os Assad e outras, ficam muito presos à questão de direitos humanos e democracia. É, parafraseando o velho Brizola, uma esquerda que a direita gosta.

Lembremos que o Iraque, no tempo de Saddam Hussein, era um dos principais apoiadores da causa palestina dentro do mundo árabe. E após a morte de Nasser, pode-se dizer que o Iraque baathista era o inimigo número 1 de Israel no Oriente Médio. Também apoiou junto com Kadaffi a revolução sandinista na Nicarágua, ajudou na formação do Hezbollah ao permitir que membros da Guarda Revolucionária Iraniana atravessassem o espaço aéreo iraquiano em direção ao Líbano, em 1982. Posicionou-se a favor da independência de Porto Rico em relação aos Estados Unidos, e era aliado de Cuba. Entre tantas outras coisas.

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

As origens do sionismo cristão nos EUA (texto da Nova Resistência + comentários meus)

KEITH WOODS

Com tantos cristãos estadunidenses e brasileiros defendendo Israel irracionalmente, independentemente de suas mentiras e atrocidades, torna-se necessário examinar brevemente a origem do sionismo cristão nos EUA.

Um em cada quatro cristãos americanos diz acreditar que é sua responsabilidade bíblica apoiar a nação de Israel.

Mas por que há tantos sionistas cristãos nos Estados Unidos?

O que é o sionismo cristão?

Os sionistas cristãos acreditam que o povo judeu tem o direito bíblico de ter uma pátria na Palestina e que os cristãos devem ser ativos na promoção desse direito.

Essa crença tem suas raízes em uma heresia tradicional conhecida como “dispensacionalismo”.

Os dispensacionalistas acreditam que a nação de Israel é distinta da Igreja Cristã e que Deus ainda não cumpriu suas promessas à Israel nacional.

Os adeptos acreditam que a fundação do Estado de Israel em 1948 foi um cumprimento necessário da profecia.

Essas crenças são muito estranhas ao cristianismo tradicional – os Pais da Igreja viam a própria igreja como o Novo Israel.

Os dispensacionalistas desconsideram a tradição e fazem uma leitura literalista das escrituras, vendo a igreja como uma inserção temporária no fluxo da história.

Como essa leitura literalista da Bíblia se tornou tão predominante nos EUA?

Isso se deve principalmente a C.I. Scofield, autor da Bíblia de Referência Scofield de 1909.

Suas anotações induziram gerações de evangélicos americanos a acreditar que Deus exigia seu apoio ao sionismo.

Ao apresentar sua Bíblia, Scofield reivindicou o título de Doutor em Divindade, embora nenhum seminário nos Estados Unidos o tenha aceitado como aluno.

O comentário de Scofield sobre o Gênesis é fundamental para a crença sionista cristã, pois diz-se que ele contém uma ordem de Deus para servir à nação de Israel.

Um estudioso chamou a Bíblia de Scofield de “talvez a obra mais influente introduzida na vida religiosa dos Estados Unidos durante o século XX”.

Mas como um cristão renascido, com pouca qualificação, causou um impacto tão grande?

Na biografia O Incrível Scofield e Seu Livro, o autor escreve: “A admissão de Scofield no Lotus Club, que não poderia ter sido solicitada por Scofield, fortalece a suspeita que já havia surgido antes, de que alguém estava dirigindo a carreira de C.I. Scofield”.

Esse alguém, segundo se sugere, era o advogado de Wall Street Samuel Untermeyer.

A teologia de Scofield foi “muito útil para fazer com que os cristãos fundamentalistas apoiassem o interesse internacional em um dos projetos favoritos de Untermeyer – o Movimento Sionista”.

Samuel Untermeyer era um rico advogado judeu e sionista.

Untermeyer financiou a criação do Jewish Theological Seminary (Seminário Teológico Judaico), foi presidente da Keren Hayesod – a principal organização sionista da América na época – e foi vice-presidente do Congresso Judaico Americano.

Em “Teoria da Guerra Injusta: Sionismo Cristão e o Caminho para Jerusalém”, o Prof. David W. Lutz escreve:

“Untermeyer usou Scofield, um advogado de Kansas City sem treinamento formal em teologia, para injetar ideias sionistas no protestantismo americano.”

“Untermeyer e outros sionistas ricos e influentes que ele apresentou a Scofield promoveram e financiaram a carreira deste último, incluindo viagens à Europa.”

Enquanto estava na Inglaterra, Scofield conheceu o diretor da Oxford University Press, que ficou entusiasmado com o projeto.

Se não fosse pela Bíblia de Scofield, os presidentes dos EUA influenciados pelo sionismo cristão poderiam estar mais dispostos a colocar os interesses de seu país acima de Israel, e mais cristãos americanos teriam uma visão crítica de um estado onde os cristãos atualmente enfrentam intensa perseguição.

Fonte: As Origens do Sionismo Cristão nos EUA | Nova Resistência (novaresistencia.org)

MEUS COMENTÁRIOS

Este é um texto que eu encontrei no site do movimento Nova Resistência a respeito da questão do sionismo cristão. Algo sobre o qual pouco dei pouca atenção nas últimas postagens.

O fato é que vários elementos ligados a denominações religiosas neopentecostais, entre eles Rodrigo Mocellin, Silas Malafaia e outros, se manifestaram por meio de vídeos no You Tube a favor de Israel na presente crise no Oriente Médio (alguns dos quais receberam respostas por parte de Mansur Peixoto, da página “História Islâmica”). Outros elementos da direita neocon brasileira, como Carla Zambelli e Nikolas Ferreira, também se posicionaram a favor de Israel. E de cereja do bolo, os membros do clã Bolsonaro, com postagens como a seguinte no You Tube, claramente tentando vincular o governo Lula com o Hamas. Exemplo disso é a imagem abaixo, tirada da comunidade do You Tube de Carlos Bolsonaro:

Foto – Postagem datada de oito de novembro de Carlos Bolsonaro (vulgo 02) na comunidade do You Tube em que ele tenta vincular José Genoíno, eminente e histórico membro do Partido dos Trabalhadores, ao Hamas.

Bolsonaro, dado o fato de ser ex-presidente da República e a popularidade que ele ainda desfruta entre parcelas expressivas da população brasileira, é sem sombra de dúvidas o expoente máximo do sionismo cristão no Brasil. E isso é algo que vem de vários carnavais.

Nos governos petistas, Bolsonaro se queixava da política externa do país à época por conta das relações com países da América Latina governados por regimes de esquerda tais como Cuba, Venezuela e Bolívia, assim como de países como Irã, Líbia e Coréia do Norte. Até se queixou certa vez de que Lula “queria a bomba atômica para o Ahmadinežad”.

Em 2014, quando Dilma Rousseff, então Presidente da República, disse que as ações de Israel na Faixa de Gaza foram desproporcionais, Bolsonaro pai enviou uma carta de desculpas ao embaixador de Israel. Uma das coisas mais me deixam estarrecido a respeito dessa carta é que Bolsonaro pai começa falando sobre o passado de Dilma como membra de grupos de luta armada como o Colina e o VAR-Palmares no tempo da ditadura civil-militar brasileira. Vejam só que curioso: Bolsonaro se queixando do passado de Dilma para o embaixador de uma nação que foi forjada e formada sob o signo do terrorismo e que teve como premiês nomes como David Ben Gurion, Itzhak Šamir e Menachem Begin, egressos de grupos como o Haganah, o Likud e o Irgun.

Foto – A carta de Bolsonaro de 2014 ao embaixador de Israel.

É o mesmo Bolsonaro pai que nos idos de 2009 e 2010 não apenas se posicionou contra a presença de Cesare Battisti em solo brasileiro por conta do passado dele como membro do PAC (Proletários Armados pelo comunismo) nos anos de chumbo da Itália e os quatro crimes a ele atribuídos, como também contra a possibilidade de Dilma tornar-se Presidente da República por conta de seu passado nos anos de chumbo da história do Brasil (lembrando que o mesmo Bolsonaro, em 2005, quando o petista José Genoíno foi depor na CPI do Mensalão, trouxe para a mesma o coronel Lício Maciel, o captor de Genoíno na guerrilha do Araguaia, com a clara intenção de constranger o petista).

Em 2016, no mesmo dia em que o Senado brasileiro votou pela admissibilidade do impeachment de Dilma Rousseff, o mesmo Bolsonaro estava em Israel, e lá foi batizado nas águas do Rio Jordão pelo pastor Everaldo (o mesmo pastor Everaldo que em 2020, sob a acusação de corrupção e lavagem de dinheiro).

Foto – Batismo de Bolsonaro no Rio Jordão.

E as coisas não param por aí.

Mais recentemente, Bozo pai (o mesmo Bozo pai que na campanha de 2018 prometeu transferir a embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém) foi à Câmara dos Deputados, na qual se reuniu com o embaixador de Israel. Lá, assistiu a um filme sobre o Hamas.

Além disso, Eduardo Lima, do canal “anti-imperialismo”, trouxe a seguinte notícia: de que a Polícia Federal fez uma operação conjunta com o Mossad. Uma operação destinada a supostamente prender pessoas ligadas ao Hezbollah, sob a acusação de “constituir ou integrar organizações terroristas e realizar atos preparatórios de terrorismo”.

Lembram-se daquela foto em que Carlos e Eduardo Bolsonaro, os filhos 02 e 03 do ex-presidente Jair Bolsonaro, estão andando pelas ruas de Israel com camisa do Mossad e da IDF? Juntando os pontos, nada me tira da cabeça que eles possam estar envolvidos de alguma forma nessa recente operação da PF (que está acontecendo sob o impávido nariz de Flávio Dino). E mais do que isso: não me surpreenderia nem um pouco descobrir que eles são uma espécie de embaixadores da inteligência israelense no Brasil. Haja vista que no ano retrasado o próprio Carluxo procurou os programas israelenses Pegasus e Sherlock para espionar opositores tanto dentro quanto fora do governo, e mais o trânsito que Dudu Bananinha tem com a extrema direita internacional (vide as fotos dele ao lado de Steve Bannon).

Foto – 02 e 03 desfilando pelas ruas de Israel com camisas do Mossad e da IDF.

Fico imaginando o escândalo que os mesmos filhos do Bolsonaro (além de outros elementos da direita neocon brasileira) não fariam nas redes deles caso algum político da esquerda brasileira (em especial do PT) tirasse foto com camiseta do FSB russo, da Guarda Revolucionária iraniana ou do MSE chinês.

Foto – Bolsonaro e Netanyahu.

terça-feira, 7 de novembro de 2023

A ratoeira de Tarcísio de Freitas sobre a esquerda e a indústria do holocausto.

 

Foto – Tarcísio de Freitas, atual governador do Estado de São Paulo.

Em 30 de outubro do presente ano, a lei 17.817/2023, de autoria do ex-deputado Heni Ozi Cukier (Novo) e do deputado federal Gilmaci Santos (Republicanos), foi aprovada pela Alesp (Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo) e em seguida sancionada pelo governador do Estado de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Em sua ementa, a lei institui “a proibição do ensino ou abordagem disciplinar do Holocausto sob os prismas do negacionismo ou revisionismo histórico, no âmbito do Sistema Estadual de Educação Básica do Estado de São Paulo”. A lei foi sancionada e aprovada por Tarcísio de Freitas, tendo sido publicada no Diário Oficial em 30 de outubro do presente ano.

A proposta também obriga o estado a munir os alunos “com as ferramentas necessárias para a identificação de discursos de ódio em nossa vida contemporânea, de modo a estarem mais preparados para exercer responsavelmente sua cidadania”. O texto vale para as escolas públicas do Estado de São Paulo, mas não para a rede particular.

E essa iniciativa não é a única: no Rio Grande do Sul o deputado Rodrigo Lorenzoni (Partido Liberal), apresentou um projeto similar no dia 1º do presente mês na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul. Segundo a proposta de Lorenzoni, o holocausto e o sionismo, dentro do currículo educacional, não poderão ser ensinados ou ter abordagem disciplinar sob os prismas do negacionismo ou do revisionismo histórico.

Ambas as leis surgem dentro do contexto do que vem se passando na Faixa de Gaza desde os ataques do grupo Hamas a Israel em sete de outubro do presente ano. Segundo Lorenzoni, o holocausto é um evento inegável que não deve ser interpretado de maneira distorcida. Nas palavras dele, “Temos acompanhado estarrecidos manifestações da esquerda que igualam os recentes ataques premeditados do grupo terrorista Hamas à ação militar do exército israelense. Assim como no Holocausto, não há relativização possível para o que está acontecendo. Essa régua que iguala terrorista que ataca para matar – com uma crueldade insana – e quem se defende para não morrer já está chegando às salas de aula. Esse projeto é um freio à tentativa de doutrinação dos alunos”.

O que podemos dizer a respeito dessas leis? Para quem acha que esse tipo de lei é algo positivo e que irá eventualmente colocar filonazistas na cadeia por questionar narrativas sobre o Holocausto ou sobre o Sionismo, sinto muito, mas pode tirar o cavalinho da chuva. Ainda mais quem é de esquerda e aplaude esse tipo de coisa. Quem é de esquerda e aplaude esse tipo de coisa está é assinando um atestado de estupidez.

Primeiro de tudo: assim como no caso das leis contra as famigeradas notícias falsas, quem vai definir o que é ou não é discurso de ódio ou negacionismo, segundo a nova lei? E o mais importante: QUEM IRÁ DEFINIR o que é ou não é discurso de ódio?

Porque esse tipo de lei nada mais é que um balão de ensaio. Um balão de ensaio para depois a corda esticar e a coisa ser estendida para outros temas e assuntos, como veremos mais abaixo. E tudo sob o pretexto do combate ao negacionismo do Holocausto e daquilo que eles chamam de “discurso de ódio”.

Também se pode dizer que se trata de uma censura, uma mordaça, de modo que certos detalhes a respeito do próprio Holocausto nazista não possam ser discutidos em sala de aula. E um desses detalhes é sobre a colaboração judaica com o regime nazista no período de 1933 a 1945.

É sabido e muito bem documentado que da mesma forma que o Japão Imperial teve seus colaboradores chineses e coreanos (os quais ganharam as alcunhas pejorativas de handzian e činilpa, respectivamente), na Europa ocupada os nazistas tiveram vários colaboradores, das mais diversas nacionalidades. Esses colaboradores chegaram a formar divisões especiais dentro da própria Waffen SS, tais como a divisão Carlos Magno (franceses e belgas), Wiking (escandinavos, belgas, suíços e holandeses), Handžar (bósnios, albaneses e croatas) e Galícia (ucranianos). Também havia divisões de voluntários que serviam diretamente ao Exército Alemão, entre elas a Divisão Azul (voluntários espanhóis que lutaram no front oriental) e o Exército Russo de Libertação (voluntários russos). Geralmente, eram estes elementos que sujavam as mãos nas matanças e limpezas étnicas, e não os próprios alemães. Regimes fantoches, entre eles o regime de Vichy sob a liderança do general Pétain, o regime de Vidkun Quisling na Noruega, a Rada Central Bielorrussa em Belarus e a República de Lokot na Rússia, foram instalados em diversas partes da Europa.

E a coisa não para por ai: os nazistas também tiveram seus colaboradores judaicos. Sim, é isso do que estou falando. Começa pelo fato de que no próprio exército alemão houve soldados de origem de judaica, os chamados mischling (mestiços) e que, da mesma forma que os aliciadores de imigrantes da fronteira entre EUA e México geralmente são latinos (os chamados coiotes) e no Brasil colônia não raro negros alforriados adquiriam escravos e até se tornavam eles mesmos traficantes de escravos na África, os kapos dos campos de concentração geralmente eram judeus (e que estes formavam uma força policial para controle de levantes dentro dos mesmos, forças essas organizadas por conselhos judaicos locais).

E de cereja do bolo, a colaboração entre nazistas e sionistas (a saída que o Terceiro Reich encontrou como forma de driblar o boicote judaico mundial iniciado ainda em 1933, tão logo Hitler tornou-se chanceler da Alemanha) e o acordo de transferência Ha’avara decorrente dessa colaboração.

Foto – Frente e verso de uma moeda prateada nazi-sionista (cerca de 1934).

Como isso tudo vai ficar na equação? Será que não vão usar a nova lei como ratoeira para apanhar professores que eventualmente tratarem desses temas (ainda que pelo alto) sob o pretexto do combate ao negacionismo e ao discurso de ódio? Será que estamos diante de mais uma lei de mordaça e a esquerda não se dá conta disso?

E no caso em particular da história do movimento sionista como no caso da lei gaúcha, como ficará, por exemplo, todo o histórico de colaboração dos sionistas com a fina flor do anti-semitismo europeu desde a aurora do movimento? Como ficarão, por exemplo, Theodor Herzl e Plehve (ministro do interior da Rússia entre 1902 a 1904, um dos principais incitadores de pogroms da Rússia Imperial tardia)? Žabotinskij (sionista revisionista, do qual o partido Likud é herdeiro ideológico direto) e Petljura (que à frente da República Popular da Ucrânia perpetrou terríveis pogroms contra judeus na Ucrânia – e ele mesmo assassinado em Paris pelo anarquista judeu Samuel Schwartzbard, no ano de 1926)? Será que sob o mesmo pretexto também serão apanhados na ratoeira os professores que tratarem (ainda que pelo alto) sobre o histórico de colaboração dos sionistas com a fina flor do anti-semitismo europeu?

E a coisa não para por ai: Recentemente, saiu uma matéria no DCO (Diário da Causa Operária), ligado ao PCO (Partido da Causa Operária), falando a respeito de ligações entre partidos de extrema direita da Europa, alguns dos quais abertamente anti-semitas, entre eles o AUR da Romênia e o AfD da Alemanha, com o Estado de Israel. O último chegou ao ponto de lançar campanha entusiástica para que Jerusalém fosse reconhecida como capital de Israel em abril de 2018. Isso para não falar das relações de Israel com o regime ucraniano advindo do golpe do Euromaidan de 2014. Como isso vai ficar na equação?

Além disso, como já dito em artigos anteriores, na reação de muitos direitistas aos eventos que vem acontecendo na Faixa de Gaza desde o último sete de outubro, o que me chama mais a atenção é o fato de que eles falam muito em terrorismo do Hamas e de outros grupos afins (além de encher a boca a respeito do passado da ex-presidente Dilma e outros petistas de quando eram membros de grupos de luta armada no período da ditadura civil-militar brasileira), e em momento falam que ANTES da fundação do Estado de Israel, os sionistas também tiveram seus dias de terroristas, tendo se organizado em grupos como o Haganah, o Irgun, o Stern, o Lehi e o Palmach. Estes grupos estiveram envolvidos em terríveis atentados como o do Hotel King David e em massacres e limpezas étnicas como o de Deir Yassin. Inclusive graças a tais grupos que foi introduzido no Mundo Islâmico o conceito de guerra urbana por meio de atentados e atividades de grupos terroristas.

E de cereja do bolo, quadros egressos desses grupos se tornaram políticos eminentes e até mesmo premiês de Israel, entre eles David Ben Gurion (ex-Haganah), Itzhak Šamir (ex-Lehi) e Menachem Begin (ex-Irgun). É um processo que Mansur Peixoto, do site “História Islâmica”, chama de “transformação de terroristas em políticos oficiais”. Como que isso vai ficar na equação? Será que o professor que resolver tocar nesses assuntos ao tratar do tema sionismo e da questão palestina, mesmo que por cima, também vai sofrer sanções legais sob o pretexto de disseminação de discurso de ódio?

Por esse prisma, pode-se dizer que HOC, Gilmaci Santos e Tarcísio nada mais fazem que trazer para o estado de São Paulo uma lei similar àquela existente na Polônia desde 2018. Uma lei aprovada no Senado polonês e sancionada pelo presidente Andrzej Duda, segundo a qual todo aquele que ao falar do Holocausto ouse tocar no tema da participação de colaboradores poloneses no Holocausto sofrerá sanções penais. Uma lei que, no fim das contas, acoberta e protege os colaboradores poloneses dos nazistas ao mesmo tempo em que os nazistas são feitos de bois de piranha.

Mas a coisa não para por ai. Como dito antes, essa é uma ratoeira que visa em última instância apanhar não eventuais filonazistas, e sim esquerdistas, além de fazer valer as narrativas da direita neocon brasileira (à qual não apenas Tarcísio de Freitas, como também o professor HOC são ligados) sobre determinados fatos históricos. E dessa forma direcionar o debate a respeito desses temas na direção por eles desejada.

Sob o mesmo pretexto do combate ao que eles chamam de discurso de ódio e negacionismo, a corda inevitavelmente será esticada e também serão penalizados sob os mesmos pretextos professores de esquerda que eventualmente, ao tratar do tema da crise de fome ocorrida na Ucrânia nos anos de 1932 e 1933, resolvam questionar a narrativa do Holodomor, de que a União Soviética, sob a liderança de Stalin, teria empreendido uma fome-genocídio com vistas a promover um genocídio do povo ucraniano.

No chamado Holodomor fotos de fomes anteriores, entre elas a fome do Volga de 1921 (ocorrida dentro do contexto da Guerra Civil Russa), foram atribuídas como sendo da fome ucraniana de 1932 e 1933. Em 1932 e 1933 também foram afetadas pela crise de fome outras regiões da União Soviética tais como a bacia do rio Volga, o sul de Belarus, o norte do Cáucaso e o Cazaquistão. E a fome (fruto de fatores naturais como secas e epidemias de tifo, colheitas ruins, mais a reorganização do campo decorrente das políticas de coletivização da URSS e sabotagens por parte dos kulaks) não ficou restrita à União Soviética, visto que afetou até mesmo países como Polônia e Romênia. Mesmo nos EUA, desastres climáticos como secas severas foram observados nessa mesma época em regiões como o baixo Mississipi e o Oeste.

Foto – Capa de jornal de Hearst sobre a “fome soviética” na Ucrânia.

E mais paradoxal de tudo é que essa narrativa da fome-genocídio do poder soviético sobre o povo ucraniano durante nos anos de 1932 e 1933 é uma narrativa de origem nazista. Uma narrativa que foi originalmente promovida pela imprensa nazista (com vistas a preparar o terreno para a conquista das regiões ao norte do Mar Negro por parte da Alemanha hitlerista e justificar as ações ulteriores da mesma) e pelo magnata da imprensa marrom William Randolph Hearst, um dos muitos bacanas do mundo dos negócios americano que no período de 1933 a 1945 fez negócios com os nazistas.

Depois da guerra, a diáspora ucraniana no Ocidente (em especial no Canadá), composta pelos filhos e netos daqueles que colaboraram com os nazistas na Segunda Guerra Mundial, retomaram essa narrativa dentro do contexto da Guerra Fria. Em 1987 foi produzido o filme “Colheita do desespero”, sobre os eventos da fome na Ucrânia de 1932/1933. O filme em questão foi financiado por nacionalistas ucranianos, principalmente do Canadá. Na mesma época, a diáspora colaboracionista ucraniana também tentou incluir no currículo canadense de história para o ensino médio a narrativa da fome-genocídio. A fraude foi logo exposta por Douglas Tottle, por meio do livro “Fraud, Famine and Fascism”.

E a coisa não para por ai. Mesmo com o fim da União Soviética, a narrativa do Holodomor continua viva e desde a independência da Ucrânia em 1991 vem sendo usada por determinados grupos políticos para justificar políticas de aproximação da Ucrânia com o Ocidente e até de hostilidades contra a Rússia. Dessa forma, pode-se dizer que na Ucrânia atual há uma indústria do assim chamado Holodomor similar à do Holocausto. Como também de que a narrativa da fome-genocídio sobre o povo ucraniano é uma das principais alimentadoras do sentimento anti-Rússia mundo afora, algo que a Operação Militar Especial deixou bem evidente.

Algo digno de nota é que no Brasil, na trilha da Operação Militar Especial da Rússia na Ucrânia, surgiram algumas iniciativas de políticos como Álvaro Dias (Podemos – PR), que lançou um projeto de lei, o PL 423/2022, que propõe instituir no Brasil o dia de memória do Holodomor. Disso para se proibir por lei o questionamento da narrativa criada nos anos 1930 pelos nazistas, por Hearst e depois requentada pelo governo Reagan, por Robert Conquest e pela diáspora colaboracionista ucraniana no Canadá (e mais recentemente pelo Thiago Braga nos vídeos dele no You Tube) é praticamente que um pulo.

Foto – William Randolph Hearst, magnata da imprensa marrom dos EUA, ao lado de oficiais nazistas.

E depois disso, será que esse tipo de coisa não será estendido a professores que resolvam questionar narrativas como a de que, por exemplo, o Saddam Hussein não apenas massacrava curdos e xiitas, como também durante a guerra Irã-Iraque, teria supostamente gaseado os curdos no episódio de Halabdža?

A verdade dos fatos é que o próprio Saddam Hussein (à época o homem-forte do regime iraquiano) em 1970 não apenas reconheceu uma das línguas curdas como idioma oficial do Iraque, como também a bi-nacionalidade árabe-curda do Estado iraquiano. Com isso, os curdos ganharam parlamento próprio e ministros em Bagdá.

Que fique bem claro uma coisa: é verdade que em determinados momentos Saddam Hussein utilizou-se da força não apenas contra insurgências encabeçadas por facções xiitas e curdas, da mesma forma que a União Soviética utilizou-se do mesmo expediente para eliminar o nacionalismo ucraniano (incluindo até mesmo enviar agentes ao exterior para eliminar as principais lideranças do mesmo, entre eles Evgenij Konovalec, Lev Rebet e Stepan Bandera). O que é preciso ter em mente é o seguinte: que os enfrentamentos que o regime baathista iraquiano teve para com os curdos e os xiitas (incluindo os que tiveram lugar em 1991 após a Primeira Guerra do Golfo, no norte e no sul do Iraque), assim como os da União Soviética contra a OUN-UPA na Ucrânia ocidental no pós-guerra, não foi de natureza sectária, e sim política, com vistas ao esmagamento de movimentos separatistas que ameaçassem a integridade territorial de ambos os estados e a impedir o surgimento de estados reacionários baseados no sectarismo étnico-religioso.

Segundo o professor Ramez Maalouf, o que aconteceu em Halabdža foi o seguinte: na verdade o ataque em questão foi feito não pelo Iraque, e sim pelo Irã, o qual por sua vez cometeu um erro durante a batalha pela cidade de Halabdža, onde ambos os lados da contenda usavam armas químicas. A população local foi atingida por uma onda de gás cianeto, o gás usado pelo Irã na guerra, e não o gás que o Iraque usava. No caso o gás mostarda.

O primeiro a acusar Saddam Hussein de utilizar armas químicas contra os curdos foi o então secretário de Estado dos EUA George Schultz. Com base nessa acusação, o Senado dos EUA aprovou sanções contra o Iraque de forma unânime. Entretanto, essa mesma acusação foi desmascarada pelo ex-analista da CIA Stephen Pelletiere por meio de um artigo desmentindo as acusações de Schultz.

A CIA averiguou o fato, e como as provas apresentadas por Pelletiere eram irrefutáveis os grandes veículos de mídia ocidentais literalmente o jogaram para debaixo do tapete e passaram a ignorá-lo. Ao passo que a acusação de Schultz foi aceita até mesma por setores de esquerda como uma verdade incontestável de que o regime baathista do Iraque oprimia os curdos.

O fato é que a acusação de Schultz contra o Iraque serviu de base para que o Iraque fosse destruído. Segundo Ramez Maalouf, “a acusação de Schultz contra Saddam Hussein foi brandida como a grande prova incomensurável da brutalidade, sadismo e selvageria de como o líder iraquiano tratava sua própria população. Ela serviu como o mais forte pretexto para as invasões ianques do Iraque em 1991 e até mesmo em 2003”.

Podemos muito bem dizer que a lorota de Schultz foi o ponto zero, o momento no qual o ovo da serpente foi chocado. Mas não foi a única dessas, e outras lorotas ainda estavam por vir. Para justificar a primeira operação militar da dinastia Bush sobre o Iraque, outras mentiras foram ventiladas e utilizadas que ajudaram a jogar ainda mais lenha na fogueira (e aceitas de forma acrítica até por esquerdistas).

Quando o Iraque lançou a invasão ao Kuwait ainda em 1990, surgiu nos noticiários uma garota de 15 anos chamada Nayirah. Esta, com lágrimas nos olhos, lançou um testemunho em um comitê de Direitos Humanos do Congresso dos Estados Unidos, em 14 de outubro de 1990, no qual alegou que o exército iraquiano, entre outras coisas, invadia hospitais, arrancava bebês de suas famílias ainda nas incubadoras e os deixava para morrer no chão frio. O testemunho dela foi retransmitido em todo o território estadunidense.

Foto – Nayirah, a garota mentirosa do Kuwait cujo depoimento ajudou a empurrar os Estados Unidos para a Guerra do Golfo.

Posteriormente, revelou-se tratar-se de uma grande farsa. Revelou-se que seu sobrenome era Al-Sabah e que ela era filha do embaixador do Kuwait em Washington, Saud Nasser al-Sabah (o qual estava presente na audiência da filha). E mais do que isso: segundo algumas fontes, ela foi treinada por Michael Deaver, ex-assessor de comunicação do governo Reagan. E que a associação Citizens for a Free Kuwait, ligada ao governo do Kuwait no exílio, encomendou esta campanha à empresa de relações públicas Hill & Knowlton, no valor de cerca de US$ 10 milhões.

Com o tempo, revelou-se que as declarações da jovem garota eram um amontoado de lorotas, visto que não foram confirmadas por nenhum grupo de direitos humanos ou meios de comunicação. Mas, no fim das contas, o estrago já estava feito. Três meses após o depoimento de Nayirah, Bush I primeiro lançou a invasão ao Iraque. E ainda por cima usando como justificativa para sua aventura militar o testemunho de Nayirah.

E se acham que a coisa acabou com o falso testemunho de Nayirah, ai é que vocês se enganam. Anos mais tarde outras lorotas surgiram. Mais precisamente, as lorotas que justificaram a invasão do Iraque de 2003, agora sob o comando de George W. Bush, o Bush II. Como a de que o Iraque esteve envolvido nos atentados do 11/09/2001 (sendo que dos sequestradores desses atentados nenhum deles era iraquiano), das armas de destruição em massa e a de que o Iraque, segundo Bush II, formava um eixo do mal junto de Irã e Coréia do Norte (sendo que depois de 1979 Irã e Iraque nunca se entenderam, e após a queda de Saddam Hussein o Irã estabeleceu uma espécie de condomínio com os EUA na nação mesopotâmica), ainda em 2002, antes mesmo de a guerra ser iniciada.

Algo também digno de nota é o fato de que antes mesmo de Bush II tornar-se Presidente dos EUA, ainda durante o governo Clinton nos EUA, Madeleine Albright, então secretária de Estado dos EUA, disse em entrevista que as mortes decorrentes das sanções impostas ao Iraque à época valiam a pena em nome de uma eventual mudança de regime em Bagdá.

No fim das contas, o Iraque, que um dia foi um dos países mais ricos e desenvolvidos do assim chamado Terceiro Mundo e erradicou de seu território mazelas como o analfabetismo e outras, depois de sobreviver a oito anos de guerra contra o Irã, invasão ianque de 1991 e anos seguidos de embargos e sanções econômicas, após a queda do regime baathista encabeçado por Saddam Hussein virou um estado falido. E é nesse contexto de falência estatal e guerras intestinas não só no Iraque como também na Síria, na Líbia e em outros países do mundo islâmico que o Estado Islâmico surgiu e se proliferou como erva daninha.

Diante desses fatos, uma pergunta: um queijinho está sendo oferecido à esquerda, e este queijinho leva diretamente a uma ratoeira. Entenderam esquerdistas, ou precisa desenhar? Com isso, narrativas como a da fome-genocídio da União Soviética sobre a Ucrânia em 1932 e 1933, da opressão do regime baathista iraquiano sobre os curdos e o gaseamento dos mesmos no episódio de Halabdža, de que os sérvios provocaram o massacre de Srebrenica em 1992, de que na Líbia Kadaffi bombardeou a própria população em 2011 e de que na Síria Bašar al-Assad utilizou armas contra o próprio povo em 2012, do massacre russo em Buča, nada disso poderá ser questionado. E o mesmo valerá para as lorotas das Nayirahs e Schultz da vida.

Em tempo: segundo notícia do Diário da Causa Operária, ligado ao PCO (Partido da Causa Operária) datada do dia dois de novembro do presente ano, de que um professor da rede privada de Porto Alegre (RS) está sendo investigado por ter dito que o Hamas é um grupo político, e não um grupo terrorista (e detalhe: o Hamas não é considerado grupo terrorista nem pelo governo brasileiro e nem pela ONU).

Em tempo (parte II): há quem diga que os serviços de inteligência de Israel tinham conhecimento do fato de que o Hamas estava para fazer o ataque que fez, e que Netanyahu, às voltas com problemas políticos em Israel e na iminência de ser preso, deixou que as coisas ocorressem da forma como ocorreram para justificar o que ele vem fazendo em Gaza. Será que vão querer censurar sob o pretexto do combate ao “negacionismo” e ao “discurso de ódio” professores de esquerda que eventualmente resolvam questionar as narrativas de Netanyahu e do partido Likud sobre o que vem ocorrendo em Gaza desde o dia sete de outubro do presente ano?

E esse tipo de manobra não é nada de novo, diga-se de passagem: ele está fazendo de Gaza o mesmo que Leopoldo Galtieri tentou fazer ao lançar a desastrosa Guerra das Malvinas em 1982, como forma de afastar a crise que se avolumava para o lado da junta militar argentina e que levou ao fim da mesma um ano mais tarde. Resumindo a ópera, Gaza é as Malvinas de Netanyahu.

Fontes:

A influência BRASILEIRA na colonização da ÁFRICA PORTUGUESA. Disponível em: A influência BRASILEIRA na colonização da ÁFRICA PORTUGUESA - YouTube

La mentira de Nayirah, el montaje en el Congresso de EEUU que sirvió para justificar la primera guerra de Irak (em espanhol). Disponível em: La mentira de Nayirah, el montaje en el Congreso de EEUU que sirvió para justificar la primera guerra de Irak (eldiario.es)

Lei 17.817/2023. Disponível em: Lei nº 17.817, de 27/10/2023 ( Lei 17817/2023 ) (al.sp.gov.br)

Os sete mitos criados pela mídia ocidental para destruir o Iraque (2). Disponível em: Os sete mitos criados pela mídia ocidental que ajudaram a destruir o Iraque (2) (correiocidadania.com.br)

Os sete mitos criados pela mídia ocidental para destruir o Iraque (3). Disponível em: Os sete mitos criados pela mídia ocidental que ajudaram a destruir o Iraque (3) (correiocidadania.com.br)

Polônia aprova polêmica lei que impede vincular o país aos crimes do Holocausto. Disponível em: Polônia aprova polêmica lei que impede vincular o país aos crimes do Holocausto | Internacional | EL PAÍS Brasil (elpais.com)

Professor é perseguido por dizer que Hamas não é terrorista. Disponível em: Professor é perseguido por dizer que Hamas não é terrorista • Diário Causa Operária (causaoperaria.org.br)

Rodrigo Lorenzoni apresenta projeto que veda revisionismo histórico do Holocausto nas escolas. Disponível em: Rodrigo Lorenzoni apresenta projeto que veda revisionismo histórico do Holocausto nas escolas | Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul

Silvered bronze medal, undated (1934) (em inglês). Disponível em: Silvered bronze medal, undated (1934) (kuenker.de)

Sionismo e nazismo: duas faces da mesma moeda do fascismo. Disponível em: Sionismo e nazismo: duas faces da mesma moeda do fascismo • Diário Causa Operária (causaoperaria.org.br)

Tarcísio sanciona lei que proíbe professores de ensinarem Holocausto de um ponto de vista negacionista. Disponível em: Tarcísio sanciona lei que proíbe professores de ensinarem Holocausto de um ponto de vista negacionista (terra.com.br)