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- Petucanismo: as duas faces de Janus.
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Devido a uma combinação de fatores e circunstâncias, a “escola paulista de
sociologia” teve o triunfo que teve principalmente a partir do regime
civil-militar de 1964 a 1985 (página 22).
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Começa com a expulsão de figuras como Theotônio dos Santos e Ruy Mauro Marini
por Zeferino Vaz em 1964 e a criação da Unicamp em 1966. No que favoreceu tanto
o liberalismo nas ciências sociais quanto a hegemonia paulista no país (página
22).
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Posteriormente, a hegemonia liberal consolidou o apelo ao “pluralismo”, abrindo
espaço para a dissidência, de tal forma que a crítica bem comportada à ditadura
representou ao mesmo tempo o fortalecimento do regime e o posterior elogio à
ditadura (páginas 22 e 23).
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No Brasil as ciências sociais pensam a partir das seguintes dualidades:
“moderno x atrasado”, “democrático x autoritário”, que embalam o
desenvolvimento intelectual paulista, a tal ponto que não sabem pensar fora de
tais categorias. No que fez com que a temática do subdesenvolvimento fosse
relegada a uma posição subalterna e secundária (página 23).
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Tal temática era colocada para debaixo do tapete e subalternizada ao revelar
que as ilhas de modernidade eram provas inequívocas de que o Brasil poderia ser
tão quanto a Europa ou os EUA (página 23).
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O desenvolvimento uspiano das ciências sociais se desenvolveu contra a teoria
marxista da dependência, a qual no Brasil foi representada por figuras como Ruy
Mauro Marini, Theotonio dos Santos, Vânia Bambirra e outros (páginas 24 e 25).
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Na economia política, a perspectiva dessa gente sempre esteve centrada na
tentativa de uma articulação da classe operária com os interesses da burguesia
industrial paulista. Tal estratégia, em tese, iria assegurar em latitudes
tropicais resultados iguais ou melhores ao que os europeus conquistaram, sem
passar pelos horrores das revoluções (página 26).
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O comportamento da maior parte da sociologia paulista nessa questão é em
essência similar ao da intelectualidade francesa do século XIX em relação aos
clássicos da literatura russa (página 27).
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A partir de 1964, intelectuais de grande estatura tais como Álvaro Vieira
Pinto, Alberto Guerreiro Ramos e outros passam a ser amplamente ignorados e até
hoje grande silêncio sobre eles paira (página 31).
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Ao mesmo tempo em que a sociologia paulista era fomentada pela elite por razões
óbvias, a esquerda (e sua influência no resto do país) também foi tributária
dessa construção teórica e compartilhou o orgulho de sua “escola paulista de
sociologia” (página 37).
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Segundo Florestan Fernandes, tanto a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras
quanto a Escola Livre de Sociologia e Política eram um projeto do que ele
chamou de “liberalismo esclarecido” destinado a renovar o poder dos “estratos
dirigentes das classes dominantes, empenhadas na defesa da hegemonia paulista”
(página 37).
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Segundo Nildo Ouriques, o que ele chama de “figurino francês” consiste do velho
colonialismo intelectual e seu corolário: a tentativa de perpetuar no Brasil o
desconhecimento da importante contribuição latino-americana e seu pensamento
crítico no desenvolvimento de nossas ciências sociais (página 44).
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Mesmo com um operário no comando da presidência do Brasil, isso não significou
um rompimento radical do tucanato paulista. Continuou a operação destinada a
limitar o espaço teórico do radicalismo político. No Brasil, os partidos
políticos não produzem reflexão sistemática sobre os grandes problemas
nacionais, mas são eficazes na produção de bordões necessários para justificar
a dominação de classe (páginas 51 e 52).
Reflexão
IV – No que tange ao dualismo, ao que me parece, não é levado em consideração,
por exemplo, que dualidades binárias como “autoritário x democrático” e
“moderno x atrasado” na verdade são dois elementos opostos entre si que formam
parte de uma unidade contraditória, como o yin e o yang do taoísmo, as faces do
deus Janus na mitologia romana e os personagens Piccolo e Kami Sama da franquia
Dragon Ball. Haja vista, por exemplo, que a estrutura autoritária advinda do
fascismo continuou a existir na Itália mesmo após a queda de Mussolini, dessa
vez debaixo de um verniz democrático. Ou que a miséria afro-asiática em grande
medida é o alimento da prosperidade das nações metropolitanas.
Reflexão
V – Pode-se observar muito bem a presença do dualismo binário no discurso de
muitos partidos da esquerda brasileira, entre eles o PSOL do qual Nildo
Ouriques faz parte e o PSTU, quando determinado regime se fecha por uma questão
de sobrevivência e é obrigado a se usar da força para tal. E diante de tais
situações, o PSOL e o PSTU são os primeiros a prestarem apoios às revoluções
coloridas mundo afora, geralmente apoiadas por multibilionários como George
Soros e os irmãos Koch, como no caso da Líbia, do Egito e da Síria a partir de
2011 por meio da Primavera Árabe (vulgo Pesadelo Árabe) e o Euromaidan na
Ucrânia em 2014 (que levou a Ucrânia a um estado de guerra civil permanente e entropia
social que se arrasta até hoje – e que é o que a Sara Winter quer trazer para o
Brasil quando fala em “ucranizar o Brasil”). O PSTU também chegou a prestar
apoio à derrubada de Dilma Rousseff por meio da retórica “fora todos”. Para
eles, basta determinado regime usar-se de um pouco de repressão contra
determinados indivíduos que pronto. Em nome da liberdade, dos direitos humanos
e da democracia, esse regime tem que cair porque usa métodos autoritários, é
ditatorial e está contra o povo. Começam a entoar mantras do tipo fora Assad,
abaixo Maduro, Evo Morales tem que cair e outros do tipo. Tal discurso binário
também está presente quando esses partidos se posicionam na arena internacional
contra a Venezuela bolivariana, a ponto de fazerem discursos a favor da queda
de Nicolás Maduro diante da oposição reacionária venezuelana. Pelo fato de ter
comparecido à posse de Nicolás Maduro, Gleisi Hoffmann recebeu críticas de
Luciana Genro (a mesma Luciana Genro que não poucas vezes se posicionou a favor
da Operação Lava Jato e em 2014 prestou apoio ao golpe de Estado na Ucrânia) e
alfinetadas de Fernando Haddad e Tarso Genro. Ou mesmo na maneira como eles
olham a Coreia do Norte e as outras experiências socialistas do século passado.
Esse é um bom exemplo de como o discurso da esquerda brasileira não apenas se
pauta por discursos binários vindos da sociologia uspiana, como também em muito
repete o discurso da direita. É uma das frentes na qual o fenômeno ideológico
petucano se manifesta.
Reflexão
VI – E paradoxalmente, o curioso é que essa mesma esquerda geralmente é a
primeira a pedir leis mais rígidas quando o assunto envolve algo que diz
respeito às pautas identitárias que eles tanto defendem. Acham que problemas
como a homofobia, o racismo e a misoginia serão resolvidos criando novas leis e
reforçando as já existentes para que tais males sejam combatidos. Mal sabendo
que tais leis podem muito bem serem usadas de firma similar a que a Lei da
Ficha Limpa foi usada: a Lei da Ficha Limpa foi promulgada em 2010 pelo governo
Lula e apoiada pela grande maioria dos partidos de esquerda à época,
excetuando-se o PCO. Oito anos depois, essa mesma lei foi usada para impugnar a
candidatura Lula. Ou seja, é aquela velha máxima de Maquiavel: para os amigos
os favores, para os inimigos a lei. Acaso um Alexandre de Moraes ou um Deltan
Dallagnol da vida será mais rígido com quem, em um caso trivial envolvendo
homofobia e/ou racismo: com o Aécio Neves ou com a Érika Kokay? Ganha um doce
quem souber a resposta. Não a toa que Rui Costa Pimenta uma vez chamou tais
partidos de esquerda de esquerda chave de cadeia.
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