Foto
– Haddad e FHC.
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FHC e Serra (vulgo Nosferatu) lograram por meio de sua influência e prestígio
obstaculizar a difusão da versão crítica da Teoria da Dependência a tal ponto
que falsificações grotescas prosperaram durante muito tempo (p. 99).
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O fato é que a Teoria Marxista da Dependência foi um poderoso programa de
pesquisa que as letras paulistas evitaram com sucesso, e a ditadura civil-militar
foi sem dúvida a grande responsável pela derrocada do pensamento crítico
pré-1964. A partir de 1964, criou-se um ambiente universitário avesso ao
compromisso político com as classes subalternas e submetido aos programas de
pesquisa vindos dos centros metropolitanos, assim como hostil às iniciativas de
inspiração e tradição crítica. É a partir desse ponto que se verifica todo um
processo de ocultamento, ou mesmo falsificação, do pensamento de figuras como
Marini e Gunder Frank (p. 99).
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Os governos Lula e Dilma reproduziram, com algumas diferenças aqui e ali, a
política econômica de FHC. Não romperam com a lógica estabelecida em 1994 no
Plano Real e que fez do Estado Brasileiro um mero orçamento a ser dividido e
saqueado pela elite do dinheiro, uma espécie de Nova República Velha (apud
Jessé Souza). Daí o petucanismo, expressão condensada dos interesses das
classes dominantes tupiniquins, cuja consolidação impele o pensamento crítico a
uma radical revisão do programa de pesquisa de todos os interessados ou
comprometidos com a superação do capitalismo dependente. Nesse contexto está
inserido o colapso do assim chamado “figurino francês” (página 100).
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Após chegar à Presidência da República, o petismo lentamente renuncia em
enfrentar a hegemonia burguesa na periferia capitalista e se converte à
socialdemocracia tucana, no que ajuda a consolidar a hegemonia intelectual na
qual ambos participam (página 100).
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Mas, na medida em que o petucanismo consolida um consenso onde a única
diferença “importante” é quem dirige com mais “competência” o aprofundamento da
dependência e aquilo que Gunder Frank em vida chamava de “o desenvolvimento do
subdesenvolvimento”, mas também a teoria necessária para grandes transformações
sociais, a chamada Revolução Brasileira. Assim a teoria marxista da dependência
ganha nova relevância (página 100).
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A partir do momento em que até mesmo a resposta à “questão social” não
constituiu motivo de divisão entre as distintas frações do capital e por tabela
todos os partidos da ordem (em especial PT e PSDB) estão de acordo com a
necessidade de continuar “programas sociais” destinados a manter os pobres na
condição de condição de pobres, não sobra outra coisa a não a ser a “digestão
moral da pobreza” representada pela ideologia da emergência de um país de
classe média garantida por políticas públicas de transferência de renda. É
nesse contexto que surge um novo espaço para a tradição crítica da teoria
marxista da dependência para afirmar seus postulados principais e avançar
naqueles pontos e temas que não foram suficientemente abordados e desenvolvidos
no período anterior (página 101).
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Segundo Nildo Ouriques, Alberto Guerreiro Ramos (1915 – 1982) foi o mais
importante sociólogo que o Brasil produziu ao largo de sua história. Junto com
tantos outros nomes da chamada tradição crítica, seu nome caiu no limbo do
esquecimento a partir de 1964 e quando mencionado era classificado como apenas
pálida expressão do “nacionalismo populista” e/ou como expressão de um tempo e
uma perspectiva “ultrapassada”. Pensava-se, no tempo em que o professor de
Joaçaba e presidente do IELA (Instituto de Estudos Latino-Americanos) foi
estudante da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), que o essencial se
aprendia com a sociologia uspiana, sempre em sintonia com as modas vindas da
Europa e EUA (página 104).
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A ditadura venceu o pensamento crítico, e ao mesmo tempo alavancou a
perspectiva “progressista” que o regime precisava para não parecer fascista. O
que abriu caminho para o crescimento e vitalização da chamada “Escola Paulista
de Sociologia” (página 105).
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Para a geração universitária do começo dos anos 1980, o nome do alemão André
Gunder Frank sempre aparecia como sinônimo de polêmica, e por meio dessa
palavra o pensamento dominante tentava (e logrou) bloquear o conhecimento de um
autor tão importante (página 147).
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Desde 1994 a política econômica em curso no Brasil expressa um pacto de classes
que se manteve vigente tanto sob FHC quanto sob Lula e Dilma, baseado no tripé
taxa de inflação, taxa de juros e taxa de câmbio (página 167).
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Independente de quem seja o ministro da Fazenda, os “fundamentos” são
respeitados por ambos os partidos (página 168).
Reflexão
XIII – Sem sombra de dúvidas, pode-se dizer que o silenciamento e posterior
exílio de figuras como Ruy Mauro Marini, Guerreiro Ramos, Gunder Frank e outros
por parte da ditadura abriu o caminho para que ideias e conceitos como jeitinho
brasileiro, patrimonialismo, homem cordial e outras dos epígonos do liberalismo
conservador vira-lata (apud Jessé Souza), convenientes ao sistema, adquirissem
a popularidade que adquiriram, a ponto de que o pensamento de figuras como
Buarque e Faoro influenciaram, grosso modo, tanto a esquerda quanto a direita
que emergiram no Brasil no pós-ditadura. Pode-se dizer que inclusive foi
condição sine qua non para tal.
Reflexão
XIV – Se o petucanismo, do ponto de vista político, é a expressão condensada
dos interesses das classes dominantes do Brasil, então poderíamos muito bem
dizer que nos EUA existe um demorepublicanismo, já que em muitas coisas os dois
partidos de acordo estão: apoio a Israel e Arábia Saudita no Médio Oriente,
hostilidade a Rússia, China e Irã na Eurásia, fazem as vontades de Wall Street,
promovem políticas neoliberais, aumentam os gastos militares, entre outros.
Obama, que em sua primeira campanha eleitoral tanto falava em “Yes que can
change” e não raro era saudado por setores da esquerda brasileira pelo simples
fato de ser um negro na Presidência dos EUA, não apenas continuou com as
invasões aos países do Mundo Islâmico iniciadas por Bush II, como também
invadiu a Líbia em 2011 e deu início a partir de 2009 a uma nova escalada
golpista na América Latina (e mais o golpe de 2014 na Ucrânia), além de ter
deportado mais mexicanos que Bush. Peguemos o exemplo do muro da fronteira
EUA-México: Bill Clinton deu início à construção de tal muro, que foi
continuada por seus sucessores e só veio a receber alarde sob Trump. Ou que na
França existe um socialrepublicanismo. Enquanto que Sarkozy invadiu a Líbia em
2011 junto com Cameron e Obama, o socialista Hollande invadiu o Chade em 2013.
Além do fato de que Macron continua com muitas das políticas econômicas
neoliberais de Hollande.
Foto - O diagrama de Venn: os pontos nos quais democratas e republicanos estão de acordo na política dos EUA.
Reflexão
XV – Nildo Ouriques muito fala em Revolução Brasileira. Periodicamente viaja
pelo Brasil e dá palestras em vários lugares do país sobre esse tema. Em meu
entendimento, uma das tarefas da Revolução Brasileira da qual o presidente do
IELA tanto fala é colocar abaixo a estrutura de poder existente no Brasil que
gestou o petucanismo a nível político-econômico. Ou seja, colocar abaixo o
Estado profundo brasileiro, com o qual o PT teve que assinar certos
compromissos em 2002. Para que numa próxima vez em que um político de esquerda
suba ao poder não seja uma mera troca de gabinete. E
assim drenar o pântano, como dizia Trump em 2016.
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