quinta-feira, 7 de abril de 2022

A escalada de russofobia pelo mundo e a dupla moral ocidental

 

Foto – Tweet da professora Roksana sobre o caso.

Nos últimos dias, temos visto alguns eventos no mínimo preocupantes, decorrentes da invasão russa à Ucrânia. Mais precisamente, uma escalada de russofobia varrendo o mundo.

No Brasil, tivemos o caso da professa Roksana Valeeva Rosa, casada com um brasileiro e que ministrava aulas de russo no interior paulista, resolveu sair do Brasil depois que passou a sofrer ataques russofóbicos após o início das operações militares da Rússia na Ucrânia. Em maio, o casal irá morar na Rússia.

Ataques a Igrejas ortodoxas ligadas ao Patriarcado de Moscou também foram observados: em Buenos Aires, capital da Argentina, a Catedral da Anunciação, principal templo ortodoxo russo portenho, foram feitas no dia dois de abril pichações comparando Putin a Stalin e os chamando de genocidas. Uma comparação que faz alusão ao famigerado Holodomor, ocorrido em 1932 e que segundo os nacionalistas ucranianos teria ceifado cerca de quatro milhões de vidas ucranianas à época. O Holodomor que, a propósito, nos últimos anos vem sendo utilizado pela Ucrânia pós-independência de uma forma similar a que o estado de Israel vem usando o Holocausto desde 1948 (assunto sobre o qual falaremos em um próximo artigo).

Foto – Pichações na Catedral da Anunciação, principal templo ortodoxo da Argentina, em Buenos Aires.

E antes mesmo desse evento, a presidente das associações de entidades russas na Argentina, Silvana Jarmoluk, esteve denunciando outras manifestações de hostilidade à Rússia e aos russos.

Desde que as operações militares na Ucrânia, para além de sanções econômicas levantadas pelos países ocidentais, viu-se uma escalada massiva de cancelamento da nação eslava. No âmbito esportivo, a FIFA excluiu a Rússia da repescagem das eliminatórias da Copa do Mundo (na qual ia enfrentar a Polônia, que por sua vez acabou ficando com a vaga) e os times russos foram barrados das principais competições europeias de clubes (entre eles o Spartak de Moscou, um dos principais e mais tradicionais times russos, que ia jogar contra o RB Leipzig pelas oitavas-de-final da Liga Europa [antiga Copa da UEFA]). O Grande Prêmio da Rússia, que ocorre em Soči desde 2014, foi limado do calendário da Fórmula 1 desse ano. Ainda na Fórmula 1, Nikita Mazepin foi despedido de sua equipe, a Haas.

Na área cultural, a 59ª Bienal de Veneza o pavilhão da Rússia ficará fechado e o evento não contará com a presença de Aleksandra Sukhareva e Kirill Savčenkov, os dois artistas escolhidos para representar a Rússia. Na semana de moda de Paris, a participação do estilista russo Valentin Judaškin foi cancelada por ele não ter se posicionado quanto aos acontecimentos na Ucrânia.

A música russa foi proibida na Polônia, e gatos de origem russa foram proibidos de participar de competições por ordem da Federação Felina Internacional.

Na Alemanha, tivemos o caso do maestro russo Valerij Georgiev, apoiador de Putin que foi demitido do cargo de condutor chefe da Orquestra Filarmônica de Munique por se recusar a condenar a ofensiva russa na Ucrânia. O mesmo aconteceu com a soprano russa Anna Netrebko, também apoiadora de Putin, que foi afastada de encanções de peças pelo Metropolitan Opera de Nova York.

A Universidade de Milão cancelou um curso sobre Fëdor Dostoevskij, um dos maiores nomes da literatura mundial. Também na Itália, mas em Genova, um festival de teatro também dedicado a Dostoevskij foi cancelado. Na França as delegações russas foram banidas do Festival de cinema de Cannes, exceto aquelas que se declarem contra o presidente Putin. A participação russa foi vetada do Eurovision.

E o mais gozado dessa situação toda é que quando a Alemanha incitou e provocou a guerra na Iugoslávia no começo dos anos 1990 ao reconhecer as independências da Croácia e da Eslovênia (a Alemanha recém-reunificada, sob a liderança de Helmut Kohl, inclusive armou os croatas e os eslovenos com armas até então armazenadas em depósitos militares da antiga Alemanha Oriental), ninguém cancelou a Nina Hagen, o Ivan Rebroff ou qualquer outro músico alemão.

Quando houve a guerra das Malvinas, em 1982, ninguém cancelou o Paul MacCartney, o Sting, o Freddy Mercury ou qualquer outro cantor ou músico inglês.

Quando a França invadiu a Líbia em 2011 (junto com os Estados Unidos e a Inglaterra) e o Mali em 2013, ninguém cancelou a Zaz, o Manu Chao ou qualquer outro músico francês. A França pode participar tranquilamente da Copa de 2014, assim como os times franceses das competições europeias de futebol à época.

E quando os Estados Unidos invadiram o Iraque em 1991 e depois em 2003, ninguém cancelou o Michael Jackson, a Madonna ou o Isaac Hayes.

Dois pesos, duas medidas. Uns podem mais que outros.

Fontes:

Artistas, pilotos, autores e gatos. A onda de cancelamentos aos russos depois da invasão ordenada por Putin. Disponível em: ObjetivaCast WebRadio - Artistas, pilotos, autores e gatos. A onda de cancelamentos aos russos depois da invasão ordenada por Putin – Observador

Gatos russos são banidos de competições pela Federação Felina Internacional. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/mundo/2022/03/4991478-gatos-russos-sao-banidos-de-competicoes-pela-federacao-felina-internacional.html

Não se pode cancelar uma cultura inteira ou prejudicar os russos só por serem russos. Disponível em: Não se pode cancelar uma cultura inteira ou prejudicar os russos só por serem russos - CartaCapital

Nomes da música erudita são “cancelados” por serem russos. Disponível em: Nomes da música erudita são “cancelados” por serem russos - Diário Causa Operária (causaoperaria.org.br)

Professora russa desiste de viver no Brasil. Disponível em: Professora Russa desiste de viver no Brasil por Russofobia - Diário Causa Operária (causaoperaria.org.br)

Rusofobia: vandalizan la principal iglesia ortodoxa del país y denuncian discriminación (em espanhol). Disponível em: Rusofobia: vandalizan la principal iglesia ortodoxa del país y denuncian discriminación - El Argentino Diario

Vandalizaron la principal iglesia ortodoxa rusa del país (em espanhol). Disponível em: Vandalizaron la principal iglesia ortodoxa rusa del país - Diario El Sol. Mendoza, Argentina.

2 comentários:

  1. Situação quase semelhante a casos de artistas que interpretam vilões em filmes ou novelas, que muitas vezes são hostilizados na rua pelos telespectadores. Só que esse caso dos russos é ainda pior, pois envolve xenofobia. E esses canceladores de plantão deviam saber muito bem que xenofobia é crime. E do jeito que as coisas estão transcorrendo, não duvido nada que logo irão vandalizar paróquias ortodoxas russas, clubes, escolas de idiomas, dentre outros estabelecimentos propriedade de russos viventes no Brasil.

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    1. Quem sabe até professores e estudantes de russo (como é o meu caso)...

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