Foto – Freeza e Rei
Vegeta (Dragon Ball Z).
Recentemente, navegando pelo Facebook, me deparo com a
imagem abaixo:
Foto – Monte Rushmore (EUA), com as faces de lideranças indígenas vencidas pelos americanos no século XIX acima dos presidentes americanos George Washington, Thomas Jefferson, Theodore Roosevelt e Abraham Lincoln (da esquerda para a direita).
Numa dessas postagens que vi, foi dito que quem deveria ter
sido retratado e homenageado no monte Rushmore não são os presidentes
americanos, e sim figuras históricas dos povos indígenas norte-americanos tais como
Touro Sentado, Gerônimo e outros. E ai eu pergunto aos que fizeram essa imagem
e a compartilham por ai: será que povos como os Dakota, os Sioux e outros que
foram exterminados pelos americanos no século XIX durante a expansão ao oeste e
depois disso confinados em reservas também não tiveram seus dias de
conquistadores e não desalojaram, mataram e escravizaram os povos e culturas
que viviam naquelas terras antes deles chegarem?
Peguemos, por exemplo, os casos dos Impérios Inca e Asteca,
os grandes impérios pré-colombianos que foram eliminados e destruídos pelos
espanhóis no século XVI antes destes estabelecerem seu domínio colonial sobre
terras americanas. Foi pela força das armas que ambos os impérios expandiram seu
território nos séculos XV e XVI, e não distribuindo flores aos povos que eles
conquistaram. E nesse processo muito sangue foi derramado, e tanto incas quanto
astecas acabaram colecionando inimizades com vários desses povos, como é o caso
dos tlaxcaltecas, que se aliaram aos espanhóis durante a expedição de Hernán
Cortez.
No Chile, durante as manifestações de 2019, tivemos o caso
de ativistas que derrubaram estátuas de conquistadores espanhóis e de generais
chilenos do século XIX sob a alegação de que elas são símbolos de uma história
falsa. Entre tais casos se incluem a destruição de uma estátua do navegador
Cristóvão Colombo datada de 1910 em Arica, estátua do militar espanhol
Francisco de Aguirre arrancada e em seu lugar uma estátua de uma mulher
diaguita (obviamente representando o povo pré-colombiano em questão – e uma
estátua para lá de cafona, diga-se de passagem), a derrubada da estátua de
Pedro de Valdívia (fundador de Santiago, morto pelos mapuches no século XVI)
por ativistas do povo mapuche em Temuco (e depois disso tendo a cabeça da
escultura colada na mão do guerreiro Caupolicán, representativo da resistência
à conquista espanhola) e a destruição da escultura do empresário espanhol José
Menéndez em Punta Arenas, que foi levada aos pés da estátua do índio Patagón,
que homenageia os indígenas que habitavam o local antes da chegada dos
conquistadores.
No Brasil, tivemos o caso da estátua de Borba Gato e do monumento
às Bandeiras, ambos localizados em São Paulo e que homenageiam aos bandeirantes
que desbravaram o interior do Brasil nos séculos XVII e XVIII. Ambos os
monumentos já foram alvos de pichações e vandalismos, sob a alegação de que
ambos representam o passado escravagista e de massacres aos povos indígenas do
Brasil.
Ante esses fatos, será que o que não está sendo proposto em
casos assim seria, fazendo uma analogia com Dragon Ball, derrubar uma estátua
do Freeza e do Rei Cold e no lugar erguer uma estátua do Rei Vegeta III (o pai
do Vegeta e do Tarble, sogro da Bulma e avô paterno do Trunks e da Bra)?
Foto – Rei Vegeta sobre uma cidade tsufururiana devastada (Dragon Ball GT).
É mostrado em Dragon Ball que os saiyanos tiveram seu
planeta destruído por Freeza por volta do ano 737, e desse extermínio
pouquíssimos deles sobreviveram, entre eles Kakarotto (vulgo Son Goku), o
príncipe Vegeta, Nappa, Raditz, Broly e seu pai Paragas. Segundo o que o anime
mostra no episódio 78, Freeza primeiro matou o rei do planeta, o Rei Vegeta
III, e depois lançou a Supernova sobre o planeta governado pelo pai de Vegeta.
Entretanto, o anime também mostra que os saiyanos, antes de aderirem ao exército do Rei Cold (que depois passou para o comando de Freeza, como o filme Dragon Ball Super – Broly mostra), viviam no Planeta Plant junto com outro povo, os tsufurianos (o anime conta essa história no episódio em que o senhor Kaioh conta a história dos saiyanos ao Goku). Segundo o calendário do mundo Dragon Ball, os saiyanos do sétimo universo inicialmente viviam no Planeta Sadala e por volta de 550 se estabeleceram no Planeta Plant.
A partir daquele momento os dois povos passaram a coabitar no Planeta Plant, com os tsufurianos vivendo nas cidades altamente tecnológicas e os saiyanos vivendo nas terras periféricas do planeta, muitas vezes em precárias residências. Até que na primeira metade do século VIII do calendário de Dragon Ball, mais precisamente entre 720 a 730, os saiyanos são unificados sob um único estandarte sob a liderança do Rei Vegeta III. E estes, após uma guerra que se arrasta por 10 longos anos, exterminam os tsufurianos e tomam o controle do Planeta Plant e o rebatizam de Planeta Vegeta, em homenagem ao Rei Vegeta III.
Embora tenham sido exterminados, os tsufurianos voltariam para tentar se vingar dos saiyanos por conta dos eventos da guerra de 720 a 730 em duas ocasiões: primeiro no OVA “Plano para destruir os saiyanos” (lançado entre 1993 a 1994), sob a liderança do Doutor Raiči e sua criação Hatchiyack. E depois em Dragon Ball GT, na saga Baby (em minha opinião o melhor dos arcos do GT; vai dos episódios 22 a 40), onde vemos a vingança de Baby (vingança essa que em minha opinião é mais interessante que a vingança levada a cabo pelo Doutor Maki Gero na saga Cell, por se tratar de algo relacionado à história dos saiyanos de antes mesmo deles se juntarem ao Rei Cold).
Foto – Baby e suas transformações.
Baby é uma máquina mutante criada pelo Doutor Myuu que
contem a informação genética dos tsufurianos que Goku, Trunks e Pan encontram
durante a viagem ao espaço em busca das esferas do dragão negras.
Algo que eu, particularmente,
acho bem bacana de se ver na saga de Baby é que ai há uma inversão de papeis em
relação à saga do Freeza: enquanto na luta contra o imperador do Universo Goku
luta contra o algoz dos saiyanos, na saga de Baby Goku luta contra um ser
pertencente ao povo que os mesmos saiyanos destruíram antes de conhecerem o Rei
Cold e Freeza. Ser esse que, ironicamente, se apoderou do corpo do filho do rei
que conduziu os saiyanos na guerra de extermínio aos tsufurianos. Ou seja, para
levar adiante seu intento vingador, Baby utilizou-se do poder dos saiyanos
contra eles mesmos.
Durante a saga Baby, em um
dos episódios há uma cena na qual o Rei Vegeta, ainda trajando as primitivas
roupas que os saiyanos usavam antes de se aliarem ao Rei Cold, aparece sobre
uma cidade tsufuriana (bem provavelmente a capital) devastada e flagelada por
fogos e explosões. Essa cena é claramente inspirada em um pôster da versão
animada de Teito Monogatari, no qual o vilão-protagonista da obra de Hiroši
Aramata, Kato Yasunori, aparece sobre uma Tóquio arrasada. Esse pôster também
serviu de inspiração para a Capcom criar um pôster de Street Fighter no qual as
mãos do vilão-mor da franquia de jogos de luta, M. Bison, aparecem cobrindo o
planeta Terra. E o Ryu à frente.
Dentro da cultura pop
nipônica, Kato Yasunori serviu de inspiração para a criação de inúmeros
personagens, e o mais famoso deles é M. Bison (que foi inspirado em Kato tanto
direta quanto indiretamente, por meio do vilão Wašizaki do mangá Riki-Oh). E tal
qual Coringa em relação ao personagem que o inspirou, o Gwynplaine do romance
de Victor Hugo “O homem que ri”, M. Bison (originalmente Vega) se tornou muito
mais famoso e icônico que os personagens que serviram de inspiração para sua
criação.
Foto – Kato Yasunori (esquerda) e M. Bison (direita).
Teito Monogatari é uma obra
muito pouco conhecida no Ocidente, embora tenha feito muito sucesso no Japão
nos anos 1980 e 1990. O sucesso da obra de Hiroši Aramata foi tamanho que recebeu
adaptações tanto em live-action quanto em anime (4 OVAs). Conta a respeito do
intento vingador do mago das sombras Kato Yasunori contra o Japão por conta do
que aconteceu ao povo ainu quando a corte de Yamato chegou ao arquipélago
japonês há mais de 2000 anos. Não é de se surpreender que os produtores de
Dragon Ball GT tenham se inspirado em elementos narrativos de Teito Monogatari
para criar a saga de Baby (a começar pela vingança dos tsufurianos). Da mesma forma
que Akira Toriyama se inspirou em filmes de Hollywood para criar as sagas
anteriores, como o caso de Exterminador do Futuro, que inspirou a saga de Cell.
Aliás, alguns dos poderes de Baby claramente foram inspirados nas habilidades
de Kato Yasunori, tais como a habilidade de possuir corpos e mentes alheias.
Muito do material de Dragon Ball produzido nos anos 1990 a
respeito do passado dos saiyanos e sua relação primeiro com os tsufurianos e
depois com Freeza, como também sobre o Rei Vegeta e Bardock, foi criado
exclusivamente para a versão animada. E em discussões envolvendo a obra de
Akira Toriyama é muito comum parte do fandom desqualificar tais materiais sob a
alegação de que eles não fazem parte do cânone oficial de Dragon Ball e que
eles não foram feitos pelo Akira Toriyama. Entretanto, na discussão que trago
com esse texto, é impossível desenvolvê-la sem falar deles. Além disso, o fato
de tais materiais não serem canônicos (ou seja, não estarem no mangá original) não
muda o fato de que eles estão lá e são oficiais.
Entretanto, recentemente teve início uma nova saga no mangá
de Dragon Ball Super, a saga do sobrevivente espacial, que sucederá à saga Moro
(que certamente daqui um tempo será animada em um eventual Dragon Ball Super 2).
Essa saga terá como antagonista principal Granola, um cerealiano, nativo do
planeta Cereal, que teve seu planeta arrasado e seu povo exterminado pelos
saiyanos no tempo em que estes trabalhavam para Freeza. Nesse extermínio,
tivemos uma ilustre presença: Bardock, o pai de Goku e Raditz, sogro de Čiči, avô
paterno de Gohan e Goten e bisavô por parte do avô paterno de Pan. O mesmo
Bardock que no especial “Bardock – o pai de Goku” (lançado originalmente em
1990) é visto arrasando o Planeta Kanassa junto com alguns companheiros de
armas. E que foi morto quando Freeza lançou a Supernova no Planeta Vegeta.
Pelo pouco que os capítulos já lançados mostraram, Granola
quer se vingar não só dos saiyanos, como também de Freeza (já que os primeiros,
na ocasião, lutavam sob o estandarte de Freeza). Aguardemos o desenrolar dos
próximos capítulos do mangá de Dragon Ball Super. Ao que tudo indica, Granola
irá atuar de um modo diferente do de Baby, que atuou sozinho. Irá se juntar a
mais alguns outros vingadores (provavelmente, criminosos que Moro libertou) e
assim formando um grupo bem ao estilo Irmandade dos Seis (grupo de antagonistas
da saga da vingança de Samurai X). E, também ao que tudo indica, essa saga
ainda irá revelar muita coisa não apenas sobre o passado dos saiyanos, como
também dos namekianos e de Freeza.
Resumindo a ópera, remodelar as faces dos Presidentes
americanos no Monte Rushmore pelas faces de lideranças indígenas como Touro
Sentado e outros, assim como substituir a estátua dos bandeirantes e
substituí-la por estátuas referentes aos negros e indígenas massacrados e
subjugados por estes, será o mesmo que derrubarmos estátuas do Freeza e do Rei
Cold e substituirmos por estátuas do Rei Vegeta III (o mesmo Rei Vegeta que,
pouco antes de morrer em combate, disse que iria dominar o universo no lugar de
Freeza – o episódio 78 de Dragon Ball Z mostra isso) e do Bardock.
E então eu pergunto a aqueles que derrubaram as estátuas de
conquistadores e militares espanhóis no Chile e as substituíram por estátuas
dos povos nativos locais e eventualmente também querem que no lugar do
monumento aos bandeirantes sejam erguidos monumentos aos indígenas e negros: como
que, por exemplo, um descendente dos povos que foram subjugados e massacrados
pelos diaguitas e mapuches antes dos espanhóis chegarem à América iria reagir a
tais estátuas? Obviamente, da mesma forma que um sobrevivente dos tsufurianos reagiria
caso se deparasse com uma estátua gigante do Rei Vegeta III no antigo Planeta
Plant. Ou se o Granola ou um sobrevivente do massacre do planeta Kanassa deparasse
com uma estátua dedicada ao Bardock. Ou seja, não ia gostar nem um pouco da
brincadeira de ver o algoz deles homenageado.
O presente texto é, antes de tudo, uma crítica à hipocrisia
daqueles que acham que só os brancos europeus são imperialistas e têm passado
de conquistadores e subjugadores de outros povos. Em especial a essas
militâncias politicamente corretas e movimentos do tipo Black Lives Matter, que
fazem um julgamento da história com base nos valores politicamente corretos
atuais e assim fazendo tábula rasa da mesma. E a maneira como eles vêm lidando
com monumentos ao redor do mundo é sintomática disso.
Tais pensamentos da parte dessas militâncias politicamente
corretas não apenas não correspondem à realidade, como também é uma grande
hipocrisia pequeno-burguesa, típico discurso politicamente correto de pessoas
que não sabem nada de história. Pessoas que, pelo que pelo que vejo, nunca
ouviram falar sobre impérios antigos não-europeus como Império Persa
Aquemênida, Império Huno, Império Árabe-Islâmico, China da Dinastia Tang, Império
Mongol, Império Timúrida, Império Inca, Império Asteca, Império Turco-Otomano e
outros tantos. E o caso da imagem que encontrei no Facebook recentemente é bem
emblemático disso.
Foto – A hipocrisia politicamente correta de certos indivíduos que acham que ao longo da história só os europeus é que tiveram um passado de conquistadores.
Fontes:
Chile: destrucción de monumentos como protesta contra la
historia oficial (em espanhol). Disponível em: https://www.dw.com/es/chile-destrucci%C3%B3n-de-monumentos-como-protesta-contra-la-historia-oficial/a-51202577
Dragon Ball Super: revelados os poderes de Granola.
Disponível em: https://www.einerd.com.br/dragon-ball-super-granola-poderes/
Dragon Ball timeline (em inglês). Disponível em: https://dragonball.fandom.com/wiki/Dragon_Ball_Timeline
15 secrets
only true fans know about the Cell saga (em inglês). Disponível em: https://www.cbr.com/dragon-ball-cell-saga-secrets/
Monumento às bandeiras. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Monumento_%C3%A0s_Bandeiras
Perfil – Quem é M. Bison? Disponível em: http://doutornerds.blogspot.com/2015/12/perfil-quem-e-m-bison.html
Todos têm um passado sangrento de barbáries e assassinatos, essa é a pura verdade. Tanto os conquistadores estrangeiros quanto os nativos que aqui viviam antes disso. Desde que o mundo é mundo, sempre foi assim. O ser humano, do alto de sua sede por poder, não para de perseguir e matar, e isso independe de raça, nacionalidade, cultura, credo, etc...
ResponderExcluirEba, publicação nova.
ResponderExcluirAinda vou relê-lo com mais calma, mas lendo rapidamente, foi mais uma grande análise, parabéns xará.
Eu não fui muito de falar sobre os povos originários, mas sempre citei o caso de como os mestiços são tratados no continente africano, além dos caucasianos receberem certos apelidos em países como na Nigéria.
E como o colego Marcelo Barreto falou, não somento o ser humano como qualquer vida sobrevive lutando nessas guerras, seja entre os de mesma raça ou não. Vitimizar um caso apenas é uma desinteligência da nossa espécie e movimentos como o "BLM" deveriam ser considerados conspiratórios contra o direito de identidade pessoal.
Correções gramaticais(prezemos pela integridade, respeito e bom uso da nossa linguagem):
Excluir- [...] como o colega Marcelo [...] (erro de digitação)
- [...] não somente o ser humano [...] (mesmo erro)
- [...] direito à identidade pessoal [...] (uso da preposição incorreta)
Peço perdão.