quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

30 anos do Caracazo: a esquecida rebelião popular venezuelana afogada em sangue pela direita "democrática" (postagem da página "Ideologias", do Facebook)


Foto - Caracazo, 1989.
Em 27 de Fevereiro de 1989, o povo venezuelano saiu ás ruas numa violenta onda de protestos que sacudiu o governo de direita da época.
Em 1958, após a derrubada do ditador Marcos Perez Jimenez, os principais partidos de centro-direita, a Ação Democrática e o COPEI, se uniram no Pacto de Puntofijo, para governar o país. Afirmando ser pela “estabilidade democrática” da Venezuela, o pacto acabou gerando um grande sistema de corrupção, em que somente os políticos dos dois partidos governariam o país, com todos os outros partidos (como o Partido Comunista) sendo excluídos da vida política, numa demonstração de elitismo político.
Em 1960, a Venezuela era chamada de “Venezuela saudita”, por causa da grande riqueza vinda da produção de petróleo. Esta riqueza, porém, não era sentida pela população. De acordo com Marta Harnecker, os 10% mais pobres da população detinham apenas 1,6% da renda nacional, enquanto os 10% mais ricos detinham 32%. A pobreza alcançava 85% da população, e as classes A e B, somadas, representavam apenas 3,5% dos venezuelanos.
Em 1989, foi eleito Presidente da Venezuela Carlos Andrés Pérez, do partido Ação Democrática. O país passava então por uma crise por causa da queda dos preços de petróleo. A crise tinha arrasado a economia venezuelana, com uma dívida externa cada vez maior, em que o governo era obrigado a entregar 50% de tudo que ganhava com a exportação de petróleo para tentar quitar a dívida. O dinheiro da Venezuela tinha desvalorizado 100%. Os salários se deterioraram e a população ficou tão pobre que teve de comer comida de cachorro para sobreviver.
O Presidente Perez implantou um pacote neoliberal para tentar resolver a crise. Ele liberalizou os preços, aumentou os preços da gasolina, privatizou estatais, e eliminou taxas de importação. Ao final dos anos 80, os preços da gasolina, eletricidade, telefonia e água aumentaram em 100% em um período muito curto. Os preços do transporte publico aumentaram em 30% da noite pro dia.
Foi este o estopim que gerou o Caracazo. Começando na cidade de Guarenas, em 27 de Fevereiro, e mais tarde se espalhando pra todo o país. Milhares de pessoas, principalmente trabalhadores e moradores das favelas, saíram em protesto contra as novas medidas econômicas. Ônibus eram apedrejados e queimados em todo o país; multidões enfurecidas saquearam lojas, supermercados, shoppings, pequenos comércios, lojas de eletrônicos, etc.
O Presidente Perez respondeu de uma forma brutal: Ele ordenou que a Guarda Nacional e o Exército acabassem com a revolta, permitindo a eles o uso de armas de fogo. Perez ainda decretou o Estado de Emergência, e suspendeu as garantias constitucionais. Desta maneira, o direito a liberdade e segurança pessoal, a inviolabilidade das casas, o direito de ir e vir, a liberdade de expressão, as reuniões em publico e o direito a se manifestar pacificamente foram suspendidos durante 10 dias.
Mais de 4 mil militares com tanques foram mandados para conter os protestos. E eles responderam as manifestações com balas de fogo. Milhares de pessoas foram mortas, a maioria de forma extrajudicial, e outras tantas foram torturadas e desaparecidas. As estimativas oficiais falam em mais 400 mortos, mas muitas outras estimativas falam em no mínimo 2 mil mortos. Algumas chegam a 3 mil mortos. Exército, polícia, a Guarda Nacional e a DISIP (polícia secreta) foram os principais responsáveis.
Não houve pressão internacional. Não houve ameaças do Presidente dos EUA ou de seu Vice. Não houve tentativa de tirar a Venezuela da OEA. Não houve pressão de outros países latino-americanos para que Andrés Perez saísse. Não teve mídia internacional falando disso 24 horas por dia.
A repressão violenta, junto com o contexto generalizado de pobreza e miséria da população e de intervenção externa do FMI, foi um dos motivos que levaram a uma tentativa de Golpe em 1992.
O tenente-coronel do Exército Venezuelano Hugo Chávez havia, antes do Caracazo, criado o Movimento Bolivariano Revolucionário 2000 (MBR-2000) junto de outros oficiais aliados. Este era um movimento de esquerda guiado pela ideologia do Libertador do país, Simon Bolívar. O Movimento de Chávez deu um golpe em 1992 que acabou fracassando. Chávez foi preso, mas não sem antes dar uma mensagem na TV dizendo que o movimento tinha fracassado "por ahora" (por enquanto).
A aparição de Chávez na Venezuela o tornou uma figura nacional conhecida, e muitos venezuelanos passaram a vê-lo como uma alternativa, um homem que se rebelou contra aquele estado desagradável de coisas em seu país. Um ano depois, Carlos Andrés Perez sofreria Impeachment por conta de desvio de dinheiro. O próximo Presidente, Rafael Caldera, perdoaria Chávez que, com sua popularidade, se elegeria Presidente da Venezuela em 1998.
Hoje a oposição venezuela é herdeira de Andrés Perez e sua brutalidade - o que ajuda a explicar porque mesmo com a crise os venezuelanos não confiam na oposição. O partido de Andrés Perez, a "Ação Democrática", é uma das principais lideranças contra o governo de Maduro. Um dos principais organizadores dos grupos violentos repletos de jovens venezuelanos ricos e de classe média alta que causam vandalismo, morte e destruição, e que afirmam ser "vítimas da ditadura" quando levam um merecido corretivo.
Lembrem-se disso quando alguém lhes disser que a Venezuela é uma "ditadura". Lembrem-se disso também quando algum pirralho do MBL ousar te disser que a Venezuela era o país mais rico do mundo antes do chavismo.

sábado, 9 de fevereiro de 2019

Carta a Ciro Gomes - você na UNE



Foto – Ciro Gomes na UNE, 07/02/2019.
Caro Ciro Gomes, é com muita consternação e preocupação que fico sabendo a respeito de sua recente ida a bienal da UNE (União Nacional dos Estudantes), em especial por você ter dito o seguinte: “Eu não sou corrupto. Eu ‘tô’ solto! É o Lula que está preso, babaca!”. Eu escrevo essa carta a você, na condição de pessoa que em você votou no primeiro turno por achar que você era entre os candidatos à presidência de 2018 o melhor e mais preparado.
Sinceramente Ciro Gomes, você com tais palavras fez pouco caso da prisão do Lula, que já está para completar um ano. Primeiro que quer queira, quer você não queira Lula, a despeito de todas as suas limitações e dos erros que cometeu ao longo de seus oito anos de governo, atualmente é a grande liderança popular da esquerda brasileira. Não é a toa que fizeram todo um processo articulando traidores internos dentro do próprio PT (entre eles o infame José Eduardo Cardozo, a quem Paulo Henrique Amorim carinhosamente chama de “Zé da Justiça”), grande imprensa e setores do judiciário e do empresariado nacional e internacional para prendê-lo que se arrastou por anos.
Segundo que a julgar por sua fala você não vê o viés político do processo contra Lula ao gabar-se de sua honestidade e achar que está solto por não ser corrupto e nem estar envolvido em esquemas de corrupção. Não vê que a Operação Farsa Jato tem agido de forma politicamente enviesada nesse tempo todo, beneficiando certos grupos políticos (como o PMDB e o PSDB) em detrimento de outros (em especial do PT). E não só isso, como você pelo visto acha que lawfare (ou seja, o uso da lei como instrumento de guerra para atingir inimigos políticos) é brincadeira. Pergunta para o Lula, para a Cristina Kirchner (que teve sua casa revirada, saqueada e parcialmente destruída pela polícia argentina) e para o Rafael Correa (o qual tem sido vítima de acusações de perseguição a opositores políticos nos 10 anos em que permaneceu no poder no Equador) o que eles acham disso e depois me fala.
Entenda uma coisa: você pode ser o homem mais honesto do mundo, que na hora em que os poderosos de plantão quiserem te destruir não terão o menor pudor em inventar uma história para lá de fantasiosa e cabeluda para tal, e que para isso vão usar de todos os meios possíveis e imagináveis. Os casos do tríplex e do sítio de Atibaia atribuídos a Lula e as delações usadas como provas contra ele são um bom exemplo disso que falo. Ou mesmo a igualmente fantasiosa história de que o Saddam Hussein tinha as tais armas de destruição em massa (que serviu de pretexto para os EUA invadir o Iraque em 2003).
A tua tese de que você está solto por não ser corrupto não se sustenta pelo simples fato de que políticos como Serra, Aécio Neves, FHC, Temer, Azeredo e outros tantos envolvidos em casos de corrupção estão ai lindos, leves e soltos. Isso para não falar dos grandes sonegadores de impostos do país e outros envolvidos com os altos níveis da corrupção. Todos eles rindo das nossas caras. Por seu turno, Lula foi preso em decorrência de um processo judicial no mínimo duvidoso (que é inclusive contestado por muitos juristas de renome internacional) e politicamente enviesado, visando tirá-lo das eleições presidenciais do ano passado. Até agora nada provaram contra o político nordestino. E mesmo que eventualmente provem alguma coisa, isso de forma não muda o caráter politiqueiro do processo contra ele movido.
Ou seja, se o Lula está preso, babaca, o Serra, o Yousseff, o Aécio Neves, o FHC, o Alckmin, o Temer, o Aloysio “500 mil” Nunes, o Marcelo Odebrecht, o Paulo Preto, o Palocci, o Romero Jucá, o Eduardo Azeredo, o Queiroz, o Nestor Cerveró, o Moreira Franco, os milicianos que mataram a Marielle e o motorista dela, a Dona APAE, o Zucolotto, o Beto Richa e tantos outros estão lindos, leves e soltos, babaca.
E terceiro, muito lamentável da tua parte você aparecer falando como se fosse um direitista raivoso como o Nando Moura, a Joice Hasselmann ou o Kim Kataguiri. Ainda mais para você que se diz de esquerda e hoje faz parte do partido que outrora foi do grande Brizola. Como já venho apontando aqui no meu blog, um dos grandes problemas da esquerda brasileira (incluindo o próprio PT) é que ela é especialista em reproduzir os discursos da direita, no que em muito prejudica sua práxis política. O simples fato de você gabar-se de sua honestidade e achar que você está livre por ser honesto legitima o moralismo de fancaria do conluio jurídico-policial-midiático que colocou Lula atrás das grades e que é usado na história do Brasil desde os tempos do segundo governo Vargas sempre que o Estado é ocupado por políticos que não são do agrado dos donos do poder. Nisso, você se iguala a figuras como Fernando Haddad (que fala que o PT precisa “sair do SPC” com a ajuda de juízes). E isso a meu ver é o que é o mais estarrecedor em sua fala recente na UNE. E enquanto a esquerda continuar a repetir os discursos da direita como papagaio amestrado, continuará a ser feita de gato e sapato pela direita ad eternum.
E que história é essa de que a luta por liberdade por Lula “afunda o Brasil”? Não sei se você sabe, mas lutar pela liberdade do Lula é algo essencial para que você, futuramente, não venha a ter o mesmo destino que o Lula teve nas mãos da meganhagem de toga do Paraná que hoje está do lado do governo Bolsonaro (algo que de forma alguma muda o fato de que eles sejam tucanos de coração e de carteirinha). Ou seja, para que mais adiante não apareça um juizeco provinciano ordenando uma condução coercitiva de você com ares de espetáculo pela grande imprensa e depois te colocando atrás das grades para apodrecer como um cadáver. E não é apenas isso: a luta pela liberdade de Lula é essencial para colocar no lixo da história não apenas a juristocracia que se estabeleceu no país por meio da Farsa Jato como também o governo Bolsonaro. E também para que os processos contra a Cristina Kirchner na Argentina e o Rafael Correa no Equador sofram grandes reveses.
E então lhe pergunto: em que mundo será que você vive, Ciro Gomes? Você, que junto com Haddad, Tarso Genro e Luciana Genro recentemente criticou a Gleisi Hoffmann por ter ido à posse de Maduro na Venezuela (e assim fazendo coro não apenas com Bolsonaro como também com os golpistas internacionais que querem a queda da Venezuela chavista, entre eles o senador Marco Rubio, o grande articulador da tentativa de golpe na Venezuela e do qual Guaidó não é mais que um garoto de recados). Só lhe digo uma coisa: não quero ouvir tua choradeira na hora em que meganhas de toga como a juíza Carolina Lebbos (a carcereira de Lula) resolverem te colocar atrás das grades em um processo como o feito contra o Lula.
Atenciosamente,
Eduardo Consolo dos Santos.

Foto – Estamos soltos, babaca!
Fonte:
Abutre vigarista: Ciro Gomes ataca Lula de maneira covarde e é repudiado por estudantes na Bienal da UNE. Disponível em: https://www.causaoperaria.org.br/abutre-vigarista-ciro-gomes-ataca-lula-de-maneira-covarde-e-e-repudiado-por-estudantes-na-bienal-da-une/
Aumenta a campanha da direita – perseguido político, Rafael Correa é acusado de perseguir opositores. Disponível em: https://www.causaoperaria.org.br/aumenta-campanha-da-direita-perseguido-politico-rafael-correa-e-acusado-de-perseguir-opositores/
Fantoche dos EUA – Ciro Gomes e PDT apoiam intervenção imperialista na Venezuela. Disponível em: https://www.causaoperaria.org.br/fantoche-dos-eua-ciro-gomes-e-pdt-apoiam-intervencao-imperialista-na-venezuela/
Vídeo – Cristina Kirchner denuncia destruição de sua casa pela polícia golpista. Disponível em: https://www.causaoperaria.org.br/cristina-kirchner-denuncia-destruicao-de-suas-casas-pela-policia-golpista/

domingo, 3 de fevereiro de 2019

Petucanismo: o PSDB dentro do PT. Ou as limitações ideológicas do PT (resumo do livro "A classe média no espelho", de Jessé Souza, parte 5/5)


Foto – Haddad e FHC.

Reflexão XVIII – A fragilidade simbólica ajuda a explicar não apenas a falta de oposição significativa ao moralismo da fancaria da Lava Jato e da Globo como também o fato de que setores expressivos da esquerda brasileira (incluindo figuras como Luciana Genro e Fernando Haddad) demonstraram simpatia à Lava Jato. Isso para não falar do apoio de partidos como o PSTU ao golpe contra Dilma. Diga-se de passagem, Bolsonaro mais fez que surfar no clima do “combate” à corrupção e do antipetismo, e nisso criou uma imagem de forasteiro do sistema que veio moralizar a coisa toda. Esse é o mesmo que essencialmente foi usado primeiro pelo juiz Moro à frente da Farsa Jato e depois por João Dória na campanha para prefeito de São Paulo de 2016.
Reflexão XIX – O simples fato de a Lava Jato ser comandada por juízes e procuradores que ganham muito acima do teto permitido por lei a eles já mostra o quão falso é o moralismo por eles pregado. Isso para não falar da Rede Globo, que é envolvida com sonegação fiscal milionária e Fifagate (esquema de propinas para a compra dos direitos de exibição das Copas do Mundo de 2002 e 2006). Junto com o fato de que o mesmo que hoje é ministro da justiça do governo Bolsonaro (o que não muda o fato de que ele é um tucano de carteirinha e de coração e que bem dificilmente irá afundar junto com o clã Bolsonaro a hora que o barco bolsonarista afundar caso isso venha a acontecer) arquivou o caso Banestado há mais de 10 anos, que sinto muito nojo de todo o processo que levou não apenas ao impeachment de Dilma como também da prisão de Lula. Mas o mais triste de tudo é ver que muita gente acredita que essa gente está fazendo a higiene moral do país. Quer coisa mais do sistema que um juiz?
Reflexão XX – Em um encontro recente do PT no Ceará, Cid Gomes, irmão de Ciro Gomes, disse que o PT, entre outras coisas, aparelhou o Estado brasileira, precisa fazer mea culpa e ajudou a criar o Bolsonaro (https://www.youtube.com/watch?v=hC3MvA72Qpw). Que esquerda é essa que repete as mentiras da direita, a ponto de fazer com o discurso da mídia venal de que o PT precisa de autocrítica? Esse exemplo prosaico é bem sintomático do fato de que a esquerda brasileira antes de tudo precisa de uma nova práxis política, abandonar ilusões e principalmente parar de falar como se fosse direita.
Reflexão XXI – Uma palavra sobre política exterior. Segundo Ramez Maalouf em um de seus artigos no Portal da Cidadania, a dinastia Bush fez o que fez no Iraque graças à mitos como o da ditadura unipartidária do Baath e o da opressão dos sunitas sobre xiitas e curdos que expressivos setores da esquerda mundial engoliram. E o mesmo certamente pode ser dito, por exemplo, a respeito do que Helmut Kohl e Bill Clinton fizeram na Iugoslávia nos anos 1990 e do que Hillary Clinton, Sarkozy, Cameron e Berlusconi (com uma mãozinha de Ignacio de La Russa, o mesmo que é um dos principais políticos italianos envolvidos na campanha pela extradição de Battisti) fizeram na Líbia em 2011.
Como dito no artigo anterior, vários elementos da esquerda brasileira andaram soltando pérolas de vestibular a respeito do que se passa na Venezuela (https://www.youtube.com/watch?v=Y5pgsgFBTgk).  Entre eles se incluem figuras como Luciana Genro, Tarso Genro, Fernando Haddad, Ciro Gomes e Jean Wyllys. Eles chegaram ao ponto de alfinetar Gleisi Hoffmann por ter ido à posse de Nicolás Maduro. Nisso, acabam fazendo coro não apenas com Bolsonaro como também com Marco Rubio, o senador republicano da Flórida que está por trás de todo o esforço golpista na Venezuela e que segundo a mídia cubana tem ligações com Bolsonaro (https://www.youtube.com/watch?v=-EOLMQafotI). Guaidó, diga-se de passagem, nada mais é que um garoto de recados de Marco Rubio. Infelizmente, tais figuras acham que a briga que se desenrola na Venezuela é uma mera luta por democracia e não se dão conta da ingerência do imperialismo anglo-americano na nação caribenha (que, diga-se de passagem, iniciou-se não agora, mas na crise venezuelana de 1902/1903 [https://pt.wikipedia.org/wiki/Crise_na_Venezuela_de_1902%E2%80%931903]). Ingerência essa que pode levar a Venezuela a uma situação similar à de países como a Síria e a Líbia. Mal eles se dão conta também de que esses que estão na oposição venezuelana são pessoas que querem que a Venezuela volte a ser o país miserável que era nos tempos da Quarta República. E essa não é a primeira vez que tais figuras fazem coro com as ações do imperialismo anglo-americano mundo afora: foi assim na Líbia, na Síria, na Ucrânia e outros casos onde eles apoiaram revoluções coloridas financiadas por multimilionários como os irmãos Koch e George Soros. Na prática, agem como inocentes úteis que fazem o jogo não só da direita brasileira e latino-americana como também do imperialismo anglo-franco-americano.
Conclusão – Em meu entendimento, a seguintes frases que Brizola e Darcy Ribeiro em vida usaram para classificar o PT definem bem o que é o petucanismo a nível ideológico: “esquerda que a direita gosta” e “galinha que cacareja pela esquerda e bota ovos pela direita”. Strictu sensu, o petucanismo de que Gilberto Felisberto Vasconcellos fala trata-se das semelhanças de cosmovisão entre petistas e tucanos (cujo ninho ideológico, como todos nós sabemos, é a USP). Latu sensu, as semelhanças de cosmovisão entre não apenas petistas e tucanos como também a direita e a esquerda brasileira de modo geral. Podemos dizer que Fernando Haddad, candidato à presidência pelo Partido dos Trabalhadores de 2018, é um bom exemplo de um petucano. Ou seja, um sujeito que se diz de esquerda, mas fala e age na prática como se fosse alguém de direita. Basta ver não só como ele olha problemas como o da corrupção e as alfinetadas que ele deu em Gleisi Hoffmann por ter ido à posse de Nicolás Maduro. Como que cheguei a essa conclusão? Belo dia, pensando comigo mesmo, fiz uma ligação de pontos com o que Gilberto Felisberto Vasconcellos fala sobre petucanismo, em seguida lembrei-me do que o Jessé Souza fala em suas obras sobre a fragilidade discursiva da esquerda a ponto de repetir chavões da direita e simplesmente liguei os pontos e cheguei a tal conclusão. Tenho batido muito nessa tecla ultimamente e continuo insistindo, porque se a esquerda quiser não só sobreviver aos dias negros que se avizinham como também reverter os nefastos resultados de toda a ação golpista iniciada em 2012 com o julgamento do mensalão (do qual a eleição de Jair Bolsonaro nada mais é que uma consequência direta), precisa antes de tudo uma práxis política nova e parar de falar como se fosse direita. Em outras palavras, rasgar o figurino direitista que veste.
Ou seja, enquanto a esquerda continuar a falar como se fosse direita, não só o sonho de uma Revolução Brasileira continuará sendo uma utopia como também a esquerda continuará a ser feita de gato e sapato pelas forças reacionárias que mandam no país desde o século XVI em toda e qualquer disputa ideológica que irromper. Em outras palavras, não é endossando políticas repressivas de Bolsonaro e do juiz do Banestado (como os governadores do PT no Nordeste tem feito), virar a página do golpe (como fizeram recentemente algumas lideranças de esquerda, entre elas Flávio Dino), fazendo elogios a Bolsonaro e ao juiz do Banestado (como os feitos por Haddad), renunciar às cores do partido (como a campanha de Haddad fez ao trocar o vermelho petista pelo verde e amarelo bolsonarista, que nada mais representa que a defesa do status quo privilegiado do 1% mais rico do país e do Brasil enquanto a sociedade escravocrata que é) e tirando o PT do SPC com a ajuda de juízes (como Haddad tem falado ultimamente – o que na prática é ajudar ao Judiciário fazer um expurgo dentro do próprio Partido dos Trabalhadores) que toda essa situação será revertida.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Petucanismo: o PSDB dentro do PT. Ou as limitações ideológicas do PT (resumo do livro "A classe média no espelho", de Jessé Souza, parte 4/5)



Foto – Haddad e FHC.
- Sem um projeto alternativo claro e de longo prazo, fica-se refém das conjunturas e dos acordos de conveniência, como aconteceu com o Partido dos Trabalhadores (página 158).
- A incapacidade de articular um projeto alternativo mostra o quanto somos pela hegemonia da visão de mundo liberal-chique, que com o golpe de 2016 se torna uma visão de mundo crescentemente “neoliberal-tosca” (página 158).
- Graças a essa fragilidade simbólica, o golpe de 2016 aconteceu da forma como aconteceu e o moralismo de fancaria da Globo e da Farsa Jato grassou praticamente sem oposição discursiva e articulada que pudesse denunciar a trama em seu nascedouro. A tal ponto que foi no próprio Ministério da presidente posteriormente deposta que montou-se a arcabouço legal que depois funcionaria como cortina de fumaça para o ataque à democracia (página 159).
Reflexão XV – Em 2013, Rui Costa Pimenta, presidente do PCO (Partido da Causa Operária), alertou para o fato de que já estava se formando uma articulação golpista para derrubar Dilma do poder. Alertou também para o fato de que o controle petista sobre o Estado brasileiro e seu aparato repressor era muito precário (https://www.youtube.com/watch?v=z2HxKa5aLSg). Não deu outra, pois três anos depois Dilma foi deposta por meio de um processo fraudulento, sem crime de responsabilidade nem nada. Percebe-se que o PT, nos anos em que ficou no poder, foi como um exército que invade um reino, vence os adversários nas batalhas em campo aberto, mas só que para consolidar seu poder precisa derrubar as fortalezas e os castelos do reino. E não tem as armas de assédio necessárias para tal. Daí que ficou nesse impasse até que a direita resolveu colocar um ponto final à brincadeira. E foi moleza colocar abaixo o castelo de cartas petistas. Talvez, por falta de interesse de importantes atores sócio-políticos é que o golpe não aconteceu antes.
Reflexão XVI – As gestões petistas foram marcadas, entre outras coisas, por um ingênuo republicanismo, que se revelou fatal à sua permanência no poder. A tal ponto que, entre outras coisas, o PT salvou a Globo da falência no primeiro governo Lula, não criou um canal de comunicação direta com o povo e empoderou o Judiciário e o MPF no combate à corrupção. Também não defendeu o José Dirceu e o José Genoíno das acusações sem provas do lawfare de Joaquim Barbosa no julgamento do mensalão em 2012 (que nada mais foi que o balão de ensaio para o que foi feito com Lula seis anos depois). Ao que tudo indica, o republicanismo petista foi fruto de uma incompreensão do fato de que o Estado e seus aparelhos ideológicos não são neutros e funcionam para atender prioritariamente a determinados grupos de poder (ou seja, estão muito mais para atender aos interesses de figuras como o Jorge Paulo Lemann, os juízes, promotores e desembargadores fura-teto, os ruralistas, o Paulo Skaf e o presidente do Itaú que o Seu Madruga [originalmente Don Ramón]). Também não nunca se deu conta de que em realidade não foi mais que um mordomo de uma mansão, tal qual Bolsonaro hoje em dia é.
Reflexão XVII – Durante os governos petistas, em especial no governo Dilma, o arcabouço legal que hoje Bolsonaro possui para criminalizar movimentos sociais e a esquerda como um todo foi criado, incluindo a lei anti-terrorismo e a lei das organizações criminosas (respectivamente lei 13260 [publicada em 16/03/2016] e lei 12850 [publicada em 02/08/2013]). Ou seja, Bolsonaro não vai precisar criar nada novo para fazer a caça às bruxas ideológica que ele pretende fazer. A Farsa Jato e todo seu lawfare também devem sua existência a tal arcabouço legal (incluindo o PGR todo-poderoso, diretor da PF “imexível” e relação entre Globo e sistema de justiça). Além do já citado caso da Lei da Ficha Limpa. Moral da história: a cobra que você cria para morder seu inimigo mais cedo ou mais tarde também irá te morder.