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– Marcelo Odebrecht e Sérgio Moro: O Jin e o Jang, o Alfa e o Ômega, as duas
faces de Janus contrapostas entre si.
Aproveitando o jogo das
nove verdades e uma mentira que circula no Facebook, resolvi fazer um artigo
nesse formato a respeito do assunto corrupção, como se fosse uma espécie de FAQ
informativo a respeito do assunto.
1 – Primeiro de tudo, a
corrupção que volta e meia o noticiário televisivo mostra não é uma simples
questão de moralidade como a mídia e os setores mais reacionários (do alto de
seu tacanho e rasteiro moralismo) da política brasileira fazem crer, e sim um
problema estrutural do próprio sistema, fruto do fato de o Estado moderno ser
aquilo que Karl Marx definiu no “Manifesto do Partido Comunista” (ou seja, no
longínquo 1848) como o “balcão de negócios da burguesia”. E o que com isso Marx
quis dizer? Que a burguesia, sendo a máquina de governar do Estado moderno (termo
utilizado por Muammar al-Kadaffi na primeira parte do Livro Verde para se
referir a um partido, grupo ou classe social que se apodera do aparato de Estado
de um determinado país e passa a utilizá-lo em seu proveito próprio, ao mesmo
tempo em que lesa o resto da sociedade nesse processo), condiciona as políticas
desse mesmo Estado em seu favor. Assim, no Estado burguês as políticas que este
eventualmente adote são para atender acima de tudo os interesses de classe dos
grandes capitalistas e não da sociedade como um todo.
2 – E segundo, o
noticiário geralmente oculta ao público algo visceral a esse respeito: a
corrupção em realidade começa em agentes do setor privado e termina em
políticos, os quais por sua vez acabam sendo o bode expiatório da história.
Vide, por exemplo, PC Farias nos esquemas de corrupção do governo Collor e
Marcos Valério no mensalão. O que destrói com a falácia vendida pelos liberais
de que o mercado é o espaço das virtudes e o Estado é o espaço do que há de
pior que existe por excelência, como se só no segundo é que existe corrupção. O
tipo do discurso que ajuda a justificar a ideologia neoliberal.
3 – Juízes como Sérgio
Moro e procuradores como Deltan Dallagnol nada mais são que a outra face da
moeda do sistema da corrupção existente no Brasil. O sistema, sob a alegação de
combater a corrupção, a eles recorre para fazer seu trabalho sujo nos momentos
em que quer trocar as velhas peças dos esquemas de corrupção por novas, tão ou
até mais corruptas. Em outras palavras, Dallagnol de um lado e de outro Marcelo
Odebrecht são como o Jin e o Jang do taoísmo, os personagens
Kami Sama e Piccolo em Dragon Ball e as duas faces de Janus, o deus supremo do panteão
romano: dois elementos opostos entre si, mas que juntos formam uma unidade
contraditória a ponto de um não existir sem o outro e vice-versa. E, como Rui
Pimenta Costa pontua em um de seus vários vídeos, Dallagnol, Janot e companhia
limitada não se reconhecem como parte integrante desse mesmo sistema que gera
figuras como Marcelo Odebrecht, Marcos Valério, PC Farias e tantos outros.
4 – A corrupção que os
jornais dos grandes meios de comunicação em que políticos estão envolvidos em
realidade são o mais baixo nível da corrupção aqui no Brasil. O segundo nível
da corrupção, segundo Nildo Ouriques, envolve as privatizações (entre elas a
privatização da Vale do Rio Doce, feita em 1997) feitas no país desde o início
da experiência neoliberal nos governos Collor e FHC. E o terceiro e mais alto
nível da corrupção, também de acordo com o professor catarinense, se encontra
no sistema de multiplicação de dívida por meio da manipulação do câmbio e a
especulação em cima dos títulos dessa mesma dívida. O sistema da dívida é algo
que todo santo ano consome entre 40 a 50% do orçamento da União, enquanto que o
Bolsa Família em seus dias de glória consumiu não mais que 0,47% desse mesmo
orçamento. E tudo isso com a conivência do Banco Central Brasileiro. Isso é um
verdadeiro assalto a mão armada ao Estado brasileiro perpetrado por agentes do
setor privado. Nessa farra estão envolvidas as diversas frações capitalistas
brasileiras, entre elas o capital bancário, o industrial, comercial e agrário. E
foi para, entre outras coisas, garantir os lucros desse sistema que houve o
golpe do ano passado.
5 – Que moral será que
juízes como Sérgio Moro (que segundo dados do TRF4 ganhou em dezembro do ano
passado R$ 102.151,58), que ganham salários muito acima do teto permitido por
lei (R$ 33.763,00), têm para querer colocar Lula, José Dirceu, Marcelo
Odebrecht ou qualquer outra pessoa por eles tida como corrupta na cadeia? A meu
ver, nenhuma moral eles têm, na medida em que agem como parasitas do Estado
brasileiro. No fim não é uma questão de combate à corrupção, e sim de
perseguição política. Pessoas essas que não raro pensam que estão acima da lei
(haja vista o caso da fiscal de trânsito do Detran-RJ que em 2011 parou um
veículo sem placa, seu motorista não portava carteira de habilitação e estava
embriagado e o multou. O motorista em questão era um juiz, o qual se sentiu
mordido ao ouvir da boca dela que “juiz não é Deus”. Posteriormente, o caso foi
aos tribunais e o juiz em questão teve ganho de causa).
6 – Ao contrário do que
os alienados de plantão pensam, a justiça que Moro, Dallagnol, Janot, Gilmar
Mendes e companhia limitada exercem está muito mais voltada para atender aos interesses
de classe das elites dominantes que da população como um todo. Quando eles
fazem o que fazem com a Odebrecht e outras empreiteiras
nacionais, o que eles fazem na prática é abrir o caminho para que empreiteiras
de países como os Estados Unidos e a China venham para cá e façam as mesmas
coisas que as empreiteiras nacionais faziam antes (ou até pior). Em outras
palavras, arrancam a erva daninha do solo sem arrancar a raiz junto. Ou seja, o
que eles fazem em suas operações policialescas pirotécnicas é apenas atacar os
sintomas da doença, nunca a doença em si.
7 – Historicamente, o
flagelo da corrupção é muito antigo no Brasil, e tem sido usado da forma mais
tacanha e moralista possível pelos meios de comunicação e outros setores
reacionários contra governos de caráter popular como aconteceu nos anos 1950 e
1960 com o segundo governo Vargas, Juscelino Kubitschek e João Goulart. Pela
UDN (União Democrática Nacional) e por jornalistas como Carlos Lacerda, o
governo Vargas era acusado de ser um “mar de lama”. Depois de Vargas, o governo
Juscelino Kubistchek, que sofreu duas tentativas de golpe por parte de setores
conservadores, foi acusado por essa mesma gente de ser o mais corrupto da
história do Brasil. Jango, por seu turno, foi igualmente acusado de ser
corrupto e de querer implantar no Brasil uma “República Sindicalista”. Ou seja,
o que se viu durante os governos Lula e Dilma em episódios como o mensalão e o
petrolão não foi nada de novo. Os grandes meios de comunicação apenas se
utilizaram de um expediente que eles mesmos utilizaram meio século antes.
8 – Antes do PT chegar
ao poder, comumente os casos de corrupção eram acobertados não só pela grande
imprensa como também por Geraldo Brindeiro, o então procurador-geral da
República, que ganhou a alcunha de “engavetador-geral da República”. Casos como
a compra de votos da emenda da reeleição nunca chegaram ao STF nem em seus
responsáveis porque o procurador-geral simplesmente arquivava-os. Quando o PT
chegou ao poder, essa situação mudou drasticamente. O PT, para combater esse
flagelo, fortaleceu órgãos como o Ministério Público, a Controladoria da
Receita e a Polícia Federal para esse fim. Entretanto, acabou cometendo um erro
fatal ao fazer isso sem levar em consideração a presença de elementos
reacionários como Dallagnol, Janot e Gilmar Mendes incrustrados nessas
instituições. Elementos esses para os quais pessoas de esquerda como Lula,
Dilma, José Dirceu e os finados Brizola e Luís Carlos Prestes são pessoas cujo
lugar é apodrecendo atrás das grades e não na política. Ou seja, são pessoas
que tratam a questão social como “caso de polícia” que nem nos tempos da
República Velha (1889 – 1930). No fim, Lula e Dilma chocaram o ovo da serpente
que agora os pica.
9 – Se há algo que aqui
no Brasil é apartidário isso atende pelo nome de corrupção. Haja vista, por
exemplo, o fato de Marcos Valério, o operador do mensalão, ter começado sua
carreira de mensaleiro não no PT, e sim no PSDB. Algo sobre o qual Lucas
Figueiredo fala no livro “O Operador”, lançado em 2006. O mensalão, em
realidade, começou em Minas sob os auspícios de Eduardo Azeredo e Marcos
Valério, e só depois que Lula foi eleito é que Marcos Valério passou a irrigar
os cofres do PT, quando viu que Lula e não Serra ia ganhar o pleito
presidencial de 2002. Entretanto, o que vimos durante a Operação Lava Jato é
Moro, Janot e companhia limitada tratarem a coisa da forma mais partidária possível. No fim essa gente, a julgar por sua atuação ao largo da Operação Lava
Jato, não passa de políticos de toga.
10 – O que delações como
a da Odebrecht mostram? Uma coisa, basicamente: que grandes capitalistas como
ele e tantos outros tratam o processo eleitoral como se fosse a rinha de galo
particular deles, onde apostam em todos os competidores com o dinheiro que
ajuda a financiar suas milionárias campanhas eleitorais. Assim, independente de
quem ganhe o pleito eleitoral, os capitalistas que apostam rios de dinheiros em
todos os candidatos é que são os verdadeiros vencedores. E eles não fazem isso
de graça: querem favores e concessões em troca, assim como o dinheiro que eles
investiram de volta redobrado posteriormente. Como Kadaffi diz em um trecho da
página 10 do Livro Verde, “É possível comprar e manipular os votos quando os
mais pobres não podem estar no coração das lutas eleitorais; são sempre (e só)
os ricos que ganham as eleições!”. A seguinte pergunta fica no ar: será que a
Odebrecht era a única rinheira do pedaço durante todos esses pleitos eleitorais?
E por que será que Moro, Marcelo Bretas, Dallagnol e camarilha limitada tanta
questão fazem de demolir a Odebrecht e outras empreiteiras nacionais? E mais
uma pergunta: será que a ingerência do capital no processo eleitoral é uma
exclusividade da Terra Brasilis? Será que isso também não acontece em países do
dito Primeiro Mundo tais como Estados Unidos, Canadá, Islândia, França,
Inglaterra, Holanda, Bélgica, Alemanha, Dinamarca, Noruega, Suécia, Finlândia e
Japão? Levando em consideração que Marx há um século e meio já dizia que o
estado moderno é o balcão de negócios da burguesia, eu acho que não é.
11 – O problema da
corrupção se resolve com operações policiais pontuais e com ampla cobertura e
show midiático pirotécnico tais como a Mãos Limpas (em italiano Mani Puliti) e sua
inspiração tupiniquim que atende pelo nome de Operação Lava Jato.
Fontes:
Figueiredo, Lucas. O
Operador: como (e a mando de quem) Marcos Valério irrigou os cofres do PSDB e
do PT. Rio de Janeiro: Record, 2006.
Kadaffi, Muammar. O
Livro Verde. Gráfica Renascença: Lisboa, 1984.