Foto – Vegeta (esquerda)
e Rei Vegeta (direita).
E com vocês a parte XI da série
de artigos “Freeza e Rei Vegeta”, iniciada em 2021.
Em São Paulo, no último carnaval, presenciamos uma cena bem
repulsiva e nojenta: a escola de samba Acadêmicos do Tucuruvi apresentou um
carro alegórico que retrata um índio tupinambá que parece um zumbi caótico
saído da capa de um álbum da banda Iron Maiden carregando na mão direita a cabeça
decapitada do imperador Dom Pedro II.
Foto – Dom Pedro II decapitado no carro alegórico da escola de samba Acadêmicos do Tucuruvi.
A escola de samba apresentou o enredo “Assojaba – a busca
pelo manto”. Tal enredo conta a respeito dos povos indígenas do Brasil e o
manto Assojaba, pertencente ao povo tupinambá, vestimenta sagrada para alguns dos
povos nativos do Brasil.
O carro alegórico em questão foi chamado de “O Ritual
Ibirapema”, o qual desfilou com 93 integrantes tingidos de vermelho para
representar o morticínio dos indígenas durante o processo de colonização do que
veio a se tornar o Brasil. Na frente do carro, pessoas vestidas de índio
seguravam arcos e flechas para defender suas terras.
No fim das contas, a escola em questão, antes tida como
favorita, foi rebaixada ao grupo de acesso I junto com a Mancha Verde por conta
das baixas notas que recebeu dos jurados.
Raphael Machado postou o seguinte texto a respeito desse
lamentável episódio:
“Carnaval 2025:
Celebração do Anti-Brasil?
Não sou dos puritanos
de espírito vitoriano que demonizam o Carnaval como um todo e já verti linhas
suficientes sobre o simbolismo da festa e sobre suas potencialidades catárticas
de fundo dionisíaco.
Vou, portanto, me
limitar a comentar algo um pouco mais objetivo dizendo que o Carnaval e, especificamente,
o desfile das escolas de samba poderiam ter uma função social e pedagógica
(como muitas vezes já teve) de estetizar de forma lúdica diversos temas
interessantes da história brasileira (e geral).
Sempre com um olhar
popular, é mais uma maneira pela qual símbolos e heróis nacionais poderiam se
espalhar pela cultura brasileira e recuperar presença no imaginário das massas.
Mas hoje em dia
estamos muito longe dessa potencialidade, e creio que a causa é a ‘onguização’ do
Carnaval, que acompanha a própria ‘onguização’ das favelas brasileiras. Hoje,
não há um m2 de uma favela que não contenha uma ONG ou projeto social, sempre
bem financiada e operada por universitários ou recém-formados de universidades.
E sempre carregados com uma bagagem ideológica hostil ao Brasil.
São as narrativas de
sempre: ‘o Brasil é dos índios’, ‘os portugueses roubaram o Brasil’, ‘a
escravidão no Brasil foi causada pelo racismo, que permanece hegemônico’, e por
aí vai.
O resultado são
samba-enredos antinacionais, apontando para a desconstrução do Brasil, para a
negação do caráter unitário de seu povo e para a dissolução do seu tecido
social.
Caso emblemático é o
do desfilo da Acadêmicos do Tucuruvi, que teve a ideia (em si, legítima), de
celebrar a herança tupi brasileira (particularmente a tupinambá), mas o fez não
pela síntese, mas pela oposição entre uma mítica e ilusória ‘Pindorama’ e o ‘Brasil’,
simbolizada na alegoria da decapitação do Imperador Pedro II.
Agora, não sendo
monarquista, posso apontar quão ridícula é a cena. Fundamentalmente porque
Pedro II, fluente em tupi, recebeu a vassalagem de praticamente todos os
caciques legítimos de sua época. Ele era bem quisto pelos índios, que apelavam
diretamente a ele contra autoridades locais de tendências tirânicas. Mais ridículo
é esse negócio de ‘Pindorama’, que nunca foi nome do Brasil, e sempre apenas
designou uma região do leste brasileiro.
Esse samba-enredo,
feito em ‘homenagem aos índios’, em nada ajuda aos índios. Ao contrário, os
instrumentaliza contra o Brasil, fragilizando ainda mais a sua posição no país.
Outros sambas-enredos
também demonstram origens ongueiras, basta ver o samba-enredo da Estrela do
Novo Milênio e da Paraíso do Tuiuti. Ademais, é impressionante como quase todos
os sambas-enredos desse ano foram sobre macumba.
O Carnaval sempre foi
macumbeiro e não há problema algum nisso. É da natureza da festa. Mas não é
normal que a maioria dos sambas-enredos seja especificamente sobre macumba, é
como se houvesse uma padronização temática do desfile, o que só se explica
pelas influências comuns que perpassam as escolas de samba e as favelas hoje, e
que visam insuflar artificialmente um identitarismo negro de cariz
antinacional.
Em conclusão, a
realidade é que a festa vendida como a ‘mais brasileira’ tornou-se aquela que é
a mais hostil à Brasilidade”.
Não há o que discordar do que foi dito acima. Aliás, vale
lembrar que isso que vimos no carnaval do presente ano não é nenhuma novidade:
no Chile, em 2019 incidentes similares aconteceram em cidades como La Serena e Valparaiso envolvendo depredações de estátuas de conquistadores espanhóis e militares chilenos, sobre os quais falamos na parte I.
Saindo um pouco do Brasil, também ficamos sabendo de umas
notícias um tanto quanto similares, só que vindas do México. Mais precisamente,
da atual mandatária da nação asteca, Claudia Sheinbaum, no exercício do cargo
desde 1 de outubro do ano passado, após suceder Andrés Manuel López Obrador.
Foto – Claudia Sheinbaum, atual presidente do México.
Recentemente, mais precisamente em 28 de fevereiro do
presente ano, aconteceu na praça da constituição da Cidade do México (também
conhecida como Zócalo) os funerais de Estado em comemoração aos 500 anos da
morte do último tlatoani asteca, Cuauhtémoc, executado pelos espanhóis em 1525,
durante o processo da conquista da Mesoamérica. Sheinbaum lá estava encabeçando
a cerimônia, além de integrantes do Exército, Aeronáutica e Guarda Nacional.
Sheinbaum, do alto de sua brincadeira de tlatoani asteca,
chegou ao ponto de dizer nessa e em outras oportunidades que a Espanha deve-se
desculpar por abusos durante o processo a conquista do Império Asteca aos
chamados povos originários. Sendo tal conquista se deu com massivo apoio de
povos insatisfeitos com o domínio asteca sobre a Mesoamérica, entre eles os
tlaxcaltecas, e de figuras como La Malinche, indígena da etnia Nahua que serviu
de intérprete para os exércitos espanhóis durante a conquista, foi batizada e
se converteu ao catolicismo romano sob o nome Marina.
No fim das contas, o que se vê tanto no caso do desfile da
Acadêmicos do Tucuruvi quanto nas falas e atitudes de Claudia Sheinbaum é que no
afã de atacar a figura do conquistador espanhol e português das Américas, eles
se ancoram em uma imagem idílica, idealizada e irreal dos povos que viviam nas Américas
antes da chegada de exploradores como Cristóvão Colombo, Pedro Álvares Cabral e
Leif Erikson. Imagem essa baseada no famigerado mito do bom selvagem.
E vejam só o grande paradoxo: no afã de atacar a figura do
conquistador ibérico das Américas e defender aquilo que eles chamam de os povos
originários, exaltam a figura de... povos que antes mesmo da chegada dos
colonizadores europeus ao continente americano também tinham todo um passado de
guerreiros, conquistadores e forjadores de impérios e reinos.
E ainda mais paradoxal é o fato de que a própria Sheinbaum,
a julgar pelo sobrenome dela, não descende de povos ameríndios que ela diz
tanto defender. Não só ela como também seu antecessor e padrinho político,
Andrés Manuel López Obrador (vulgo AMLO). Todos eles descendentes dos colonos e
conquistadores espanhóis e de imigrantes europeus que aportaram no México a
partir do século XVI, e que uma vez em solo mexicano lá ficaram, não retornando
a Espanha ou a qualquer outro país europeu.
E são esses mesmos descendentes de colonos, conquistadores e
imigrantes que nos dias hodiernos apontam o dedo para Portugal e Espanha e
chegam ao ponto de pintar a já citada Malinche como uma espécie de Quisling ou
marechal Pétain do século XVI. Mal sabendo eles que o México (assim como os
demais países americanos falantes do espanhol) que nós conhecemos hoje não
existia antes da conquista e colonização espanhola, assim como o Brasil também
não existia antes da conquista e colonização lusitana.
Falar que o México, o Brasil ou a Venezuela existiam antes
da chegada dos colonizadores e conquistadores ibéricos faz tanto sentido quanto
dizer, por exemplo, que a Hungria existia na época dos impérios huno e ávaro.
Ou seja, antes da chegada e estabelecimento dos magiares no atual território húngaro,
no final do século IX.
E, como já disse em outras oportunidades nesse mesmo espaço,
o que pessoas como a Claudia Sheinbaum e os ongueiros por trás do carro
alegórico da Acadêmicos da Tucuruvi fazem no fim das contas é, fazendo uma
analogia com Dragon Ball, derrubar as estátuas e monumentos dedicados ao
Freeza, ao Cooler e ao Rei Cold para no lugar erguer estátuas e monumentos
dedicados ao Bardock e ao Rei Vegeta. O qual, por seu turno, pretendia se
tornar o senhor do universo no lugar da lagartixa após vencê-lo em combate (o
episódio 78 de Dragon Ball Z mostra isso).
Resumindo a ópera: os grandes conquistadores passam a ser vistos como demônios e pintados com piores cores possíveis, ao passo que os conquistadores provincianos vencidos no passado por espanhóis e portugueses são exaltados e admirados. A tal ponto que se demoniza os primeiros precisamente por conta do que eles fizeram sobre os segundos.
Aliás, falando em Dragon Ball, falemos um pouco dos
desatinos do Super, que foi criado pelo Akira Toriyama ainda em vida em
parceria com Toyotaro (ou seja, algo canônico dentro da obra), em especial no
que diz respeito das relações entre os saiyanos e o império de Freeza.
Parte do fandom não apenas de Dragon Ball como também de
outras obras derivadas de mangás tais como Cavaleiros do Zodíaco, Naruto, One
Piece, Fly o pequeno guerreiro, Sailor Moon, Samurai X, Rosa de Versalhes e
outras tantas chega ao ponto de achar que para determinada história ou arco dentro
de obra x, y ou z ser boa ou não tem que ter sido escrita pelo autor da obra.
No caso específico de Dragon Ball, Akira Toriyama, finado no ano passado aos 68
anos de idade.
Mas eu não sou assim, e acho isso uma estupidez muito grande
essa história de ficar muito preso ao que é ou não é canônico dentro da obra
para avaliar a qualidade das histórias da mesma. Parece que para essa gente o
mangaká é um ser supremo e iluminado que não comete erros e nem pisa na bola. Sendo
que o próprio Toriyama, ainda na saga Buu, em minha opinião pisou bem feio na
bola ao misturar o humor do Dragon Ball clássico (o qual foi relegado a um
papel mais secundário a partir da saga do Piccolo) com a pancadaria do Z.
Como já falei na parte anterior, o Super, para muito além da
questão envolvendo Bardock (o pai de Goku e Raditz), promoveu uma espécie de
branqueamento da história dos saiyanos. Até meio que os apresenta como um grupo
de guerreiros que não tiveram outra escolha a não servir ao Rei Cold uma vez
que estabeleceram contato com o conquistador espacial. E mais toda aquela
história de saiyanos malvados e bons no planeta Sadala, Yamoši e tal. Só que
algumas dessas coisas para mim, que já tenho 40 anos e sou formado em história,
não colam.
O Z (em cenas exclusivas do anime), assim como o GT, mostram
que os saiyanos não apenas já eram conquistadores ANTES mesmo de conhecerem o
Rei Cold, como também que o atrito destes com Freeza que levou à destruição do
Planeta Vegeta e à quase extinção dos saiyanos foi uma briga de poder. De poder
e por poder.
O Super chega e muito do que foi dito sobre os saiyanos no Z e no GT é jogado para debaixo do tapete, incluindo a questão dos tsufurianos. Talvez, não por acaso, que na saga Granola os produtores do mangá optaram por mostrar parte do passado dos saiyanos como mercenários a serviço de Freeza envolvendo o pai de Goku, e não um caso de vingança por conta do que os saiyanos fizeram antes mesmo de conhecerem o Rei Cold, como o GT fez na saga Baby. E eu, particularmente, acho a vingança do Baby bem mais interessante que a do Granola. Por uma série de motivos, incluindo a inversão de papéis que há em relação à saga do Freeza.
Foto – Rei Vegeta sobre uma cidade tsufuriana devastada (Dragon Ball GT).
Fontes:
Carnaval 2025: Celebração do anti-Brasil? Disponível em: https://novaresistencia.org/2025/03/06/carnaval-2025-celebracao-do-anti-brasil/
Escola de samba mostra Dom Pedro II decapitado por indígena.
Disponível em: https://pleno.news/brasil/escola-de-samba-mostra-dom-pedro-ii-decapitado-por-indigena.html
Mancha Verde e Tucuruvi são rebaixadas para grupo de acesso de
SP. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/entretenimento/mancha-verde-e-tucuruvi-foram-rebaixadas-para-o-grupo-de-acesso-em-sp/
Presidenta do México insiste que Espanha deve pedir
desculpas pelas “atrocidades” da conquista. Disponível em: https://desacato.info/presidenta-do-mexico-insiste-que-espanha-deve-pedir-desculpas-pelas-atrocidades-da-conquista/?fbclid=IwY2xjawJFtAdleHRuA2FlbQIxMQABHXJEYjDGTKsP6KXS9gRRb7M6SlDZ8Kt9XEXjFXV7g3MqGCS801J9HtBWdw_aem_Gcgf4AmAEjaPCwerURJFEQ9