Foto – Charge do cartunista Gilmar
sobre o episódio aqui abordado.
Recentemente,
durante a Copa do Mundo na Rússia, os torcedores brasileiros aprontaram mais
uma das suas, dessa vez na cidade de Rostov. Abordaram uma torcedora russa e se
aproveitando do desconhecimento da russa para com a língua portuguesa, fizeram-na
falar palavras como “buceta rosa” e “essa é bem rosinha”. Um outro grupo de
torcedores abordou três russas e igualmente se aproveitando do desconhecimento as
fizeram repetir palavras de baixo calão (que aqui não serão reproduzidas). Isso
é simplesmente nojento, repulsivo e repugnante. Nós, do Resistência
Terceiro-Mundista, repudiamos tais episódios constrangedores e repulsivos e que
apenas arranham ainda mais a já péssima imagem que o brasileiro tem fora do
país. Mas é bom recordar que essa não é a primeira vez que brasileiros perdem a
linha com estrangeiros. Recordemos aqui alguns desses episódios.
No
Facebook tivemos os casos dos atores Širo Izumi (Juma Oozora/Change Pegasus em
Changeman, Burai/Dragon Ranger em Zyuranger), Sajoko Hagiwara (Rei Tačibana/Dyna
Pink em Dynaman, Nefer em Flashman) e Džuniči Haruta (Kanpei Kuroda/Goggle
Black em Goggle Five, Rjuu Hošikawa/Dyna Black em Dynaman, MacGaren [originalmente
Mad Gallant] em Jaspion, Kazenin Storm em Džiraja), os quais bloquearam e
excluíram os brasileiros de seus respectivos perfis depois de tantas marcações
em fotos dos trabalhos por eles feitos nos anos 1980 e 1990, postagens em
português (idioma esse que eles não entendem) e ainda se comportando como se
fossem amigos próximos deles. No caso específico de Sajoko Hagiwara[1], chegaram até a fazer
marcações de fotos dela nua de quando ela era jovem (provavelmente da mesma
época em que ela participou dos seriados) e comentários em português com
mensagens do tipo “Sajoko você continua linda, casa comigo?” e “japa linda, vem
para o Brasil casar comigo”. Imagine o quão constrangedor deve ser para ela,
que agora já é uma mulher de 55 anos e que desde então parou de adicionar
brasileiros em seu perfil no Facebook. Ou mesmo o caso de Tota Tarumi (Džin/Red
Flash em Flashman), que chegou a ser chamado de Deus por alguns desses indivíduos.
Excetuando-se Džuniči Haruta (que periodicamente faz participações em seriados
do gênero Kamen Rider e Super Sentai), todos os atores aqui citados há muito
tempo se encontram afastados do meio e não participam mais desses seriados.
Mesmo
com atores que até agora não bloquearam os brasileiros como Hiroši Tokoro (nome
artístico Šohei Kusaka; Naoto Tamura/Džiban em Džiban, Kamenin Oruha em Džiraja)
e Takumi Cucui[2]
(Toha Jamaši/Džiraja em Džiraja e Ninninger) eles fazem o mesmo. Mas como Bone
Lopes disse em um de seus vídeos sobre o assunto, como tais atores em questão
ainda têm algum envolvimento com o meio, eles não têm o mesmo incômodo que têm
atores que há muito tempo estão fora do meio (e o curioso é que no perfil de
Džodži Nakata, notório por ter interpretado o caçador Kaura em Flashman e o
Grande Professor Bias em Liveman e que hoje é dublador no Japão, não vi o
perfil dele ser invadido por spams como outros atores). Chegou-se ao ponto de
uma fã marcar que era namorada do Džiban (e o próprio aceitou, sem saber do que
se tratava). Sobre esse assunto, o canal Resistência Tokusacu lançou vários
vídeos a esse respeito, visando orientar o público sobre como se comportar com
os atores nipônicos nas redes sociais.
Antes
mesmo do Facebook, consta na edição número 55 da revista Neo Tokyo que a autora
do mangá Love Junkies, Kjo Hacuki, nos idos de 2005/2006, recebeu vários e-mails
de fãs brasileiros em português e assim não entendia nada do que eles falavam.
Foto – Campanha “Fã consciente”,
lançada no ano retrasado por vários sites de tokusacu para conscientizar os fãs
dos seriados.
Também
é digno de nota o ocorrido em 2016 com o ator Tyler James Williams, notório por
ter interpretado o Chris no sitcom “Todo mundo odeia o Chris”. Os fãs
brasileiros do seriado começaram a encher o perfil do ator estadunidense no
Instagram com mensagens contendo frases bem-humoradas do seriado, todas elas em
português. A tal ponto que o perfil de Tyler James Williams tornou-se uma
verdadeira caixa de spam e que ele perdeu a paciência e deu a seguinte resposta aos fãs brasileiros,
aparentemente com a ajuda de um tradutor online: “Brasil eu te amo, eu
realmente ‘fazer’, mas se você não parar ‘spamming’ meus comentários estou indo
para começar a bloquear você”.
Foto – Fãs brasileiros postando spam
no perfil de Tyler James Williams no Instragram.
Mas
por qual motivo, razão ou circunstância falar sobre isso? Porque é por causa de
coisas como essas que o brasileiro no exterior não raro tem má fama no exterior
e que quem nada tem haver com isso literalmente paga o pato da FIESP nessa
brincadeira toda (pato esse que, diga-se de passagem, é um símbolo do fato de
que aqui no Brasil aqueles que pertencem ao 1% mais rico não pagam impostos e
da secular prática de em tempos de crise os donos do poder econômico passarem o
ônus da crise para o povão pagar).
A
julgar pelo desânimo do povo brasileiro quanto à Copa do Mundo de 2018 e a calamitosa
situação que o país vive, os torcedores que para a Rússia foram são sujeitos
abastados, de classe média alta para cima, que tem dinheiro para se hospedar em
hotéis caros e por vários dias. É o mesmo perfil do tipo de gente que bateu
panelas, xingou a Dilma em pleno Itaquerão, foi às ruas com a camisa da seleção
brasileira pedir intervenção militar e o impeachment de Dilma Rousseff e que
comemorou com fogos de artifício a condenação e a prisão de Lula (e que
certamente é o mesmo perfil daqueles que alopraram o perfil dos atores
japoneses no Facebook e do Tyler James Williams no Instagram).
A
julgar pela maneira como se comportaram diante das mulheres russas, é o tipo da
gente que olha a mulher como um mero objeto de satisfação sexual. Por causa de
pessoas assim que existem as piriguetes das quais não raro eles se queixam e as
feministas das quais eles tanto demonizam. Certamente também é o tipo da pessoa
que banca perante a sociedade o “homem de bem”, “homem de família”, entre
outros rótulos, mas que em momentos como esse literalmente libera seu lado
animalesco. E que, além de não perceberem a relação dialética existente entre
eles (semelhante à existente entre Jean Wyllys e Jair Bolsonaro e tudo o que
ambos representam no plano político-ideológico), que possuem uma noção bem
deturpada de masculinidade, a ponto de achar que são os machões do pedaço só por
verem fotos de mulheres nuas em revistas masculinas tais como Playboy, Sexy,
Penthouse e outras similares.
E
isso derruba com a falácia da tal da perfeição moral da classe média tanto em
relação aos pobres quanto em relação aos ricos (os verdadeiros ricos, diga-se
de passagem, não sujeitos que pensam que são ricos só por terem certa quantia
de dinheiro e/ou morarem em um apartamento em um bairro nobre da cidade) que
eles sentem. Isso mostra que não é porque o sujeito de classe média para cima,
por ter educação e o chamado capital cultural, sabe se comportar e tem bons
modos, ainda mais quando está fora do país. Certamente, trata-se do mesmo tipo
de gente que reclamava dos rolezinhos em Shopping Centers há alguns anos. E sintomático
do fato de que o Brasil é um país onde as pessoas são criadas não para serem
cidadãs, mas telespectadoras, e que esse tipo de comportamento não atinge
apenas cidadãos das classes populares e que aqueles que pertencem às classes
abastadas igualmente estão sujeitos a serem infectados pelo tipo de cultura de
massa que se produz aqui no Brasil, mesmo com todo o capital cultural que eles
têm e a reproduzi-los.
Fontes:
Assédio
dos brasileiros contra mulheres russas. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=JzuOSE4lzTw&ab_channel=TopChannel
Atores
Tokusatsu: falta de respeito! Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=HKkKIOcsHZc&ab_channel=Resist%C3%AAnciaTokusatsu
Change
Pegasus exclui fãs brasileiros!! Resistência Tokusatsu. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=1XX299aJBc4&ab_channel=Resist%C3%AAnciaTokusatsu
Coxinhas
abusam de mulher russa com linguagem chula e ainda postam o vídeo. Disponível
em: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/coxinhas-abusam-de-mulher-russa-com-linguagem-chula-e-ainda-postam-o-video/
Neo
Tokyo nº55. São Paulo: Editora Escala, 2010. p. 27.
Resistência
Tokusatsu: Fãs conscientes! União Tokusatsu. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=3S-to0C1Cwc&ab_channel=Resist%C3%AAnciaTokusatsu
Tyler James Williams, de “Todo Mundo
odeia o Chris”, se irrita com brasileiros. Disponível em: http://ego.globo.com/famosos/noticia/2016/02/tyler-james-williams-de-todo-mundo-odeia-o-chris-se-irrita-na-web.html
NOTAS:
[1] Leia-se “Haguiuara”. No japonês,
assim como em idiomas como o alemão, o polonês, o russo e o mongol, o som da
partícula g não muda conforme a vogal seguinte tal como no inglês e nas línguas
neolatinas.
[2] Leia-se “Tsutsui”.
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