segunda-feira, 20 de junho de 2016

As duas faces de Janus: direita neoconservadora e esquerda progressista.


Foto – Omar Mir Seddique Mateen (16/11/1986 – 12/06/2016), o atirador de Orlando.
Na madrugada de 12 de junho de 2016, um hediondo atentado teve lugar na Pulse Nightclub, uma boate gay de Orlando. Saldo: 49 pessoas morreram em decorrência do ataque e outras 53 ficaram feridas. O massacre foi perpetrado por um atirador chamado Omar Mir Seddique Mateen, 29 anos, nativo da cidade de Porto Saint Lucie (Flórida) e filho de imigrantes afegãos. Segundo informes da NBC News, Mateen, que trabalhava como guarda de segurança e era cidadão americano, jurou aliança ao Estado Islâmico (que, por sua vez, assumiu para si posteriormente a autoria do atentado) pouco antes de começar a atirar, e fez referência aos irmãos Dzhokhar[1] e Tamerlan Tsarnaev, os perpetradores do atentado à maratona de Boston em 15 de abril de 2013. Ele, que já fora investigado pelo FBI duas vezes, foi morto por volta das 5h00 do mesmo dia devido a um tiroteio travado com forças policiais e estava armado com um rifle de assalto e uma pistola, e chegou a fazer reféns entre as mais de 300 pessoas que estavam dentro da boate (onde havia apenas um segurança armado). Para chegar até Orlando, Mateen alugou um carro e viajou 200 quilômetros para cometer a atrocidade, que aconteceu em uma “gun free zone” (local onde o uso e a entrada de armas é proibida). O pai do garoto, Mir Seddique, disse à NBC que seu filho começou a odiar homossexuais há alguns meses, quando viu dois deles se beijando em Miami.
O que falar a respeito desse atentado? Uma única palavra: abominável. Nós do RTM repudiamos esse atentado e nos compadecemos de suas vítimas. Entretanto, nós, por outro lado, não recairemos no moralismo tacanho e rasteiro em que tanto os elementos de direita quanto os de esquerda recaem quando reagem a eventos como esses, tratando-os por vezes como uma mera questão de direitos humanos, de ódio aos diferentes e retóricas afins. O problema está muito mais embaixo do que pode parecer à primeira vista, e histórias como a de que o sujeito era homossexual, que ele fez isso por homofobia e afins estão para desviar a atenção do que está realmente por trás dessa tragédia.
E, como era de esperar, os ativistas de movimentos GLBT se aproveitam do evento em questão para levantar suas bandeiras contra o que eles chamam de “homofobia” (termo esse que eles muitas vezes utilizam como porrete linguístico para calar seus críticos. Ou seja, é um espantalho retórico similar ao uso dos termos comunismo e bolivariano feito pela direita reacionária brasileira em periódicas manifestações contra o PT e a esquerda como um todo), e os elementos reacionários de direita igualmente levantam as suas bandeiras, acusando mais uma vez o Islã de ser uma religião que incita à violência e ao ódio e a levantar a discussão a respeito da liberação do porte de armas.
Como já dito anteriormente, países como os Estados Unidos, Inglaterra e França tem todo um histórico de apoio ao terrorismo fundamentalista islâmico de matiz wahhabita direcionado contra os governos do Mundo Islâmico que não comungam com seus interesses (assunto sobre o qual debruçamos em “As imprecisões de Nando Moura,parte 2 – A Europa e o Islã, Políticos e Banqueiros”). Certamente, trata-se de mais uma operação de falsa bandeira, tal como foram, por exemplo, os ataques ao World Trade Center em Nova York e ao Pentágono em Washington no dia 11/09/2001, o atentado à maratona de Boston em abril de 2013, o ataque à redação do Charlie Hebdo em janeiro de 2015, o ataque ao Le Bataclan em novembro de 2015 e o atentado ao aeroporto de Bruxelas em março de 2016, de forma a justificar políticas como um recrudescimento da tal “guerra ao terrorismo” que os EUA promove no Mundo Islâmico desde 2001.

Foto – “Infelizmente: sim, ele pode”. As mazelas dos oito anos de governo Obama (vulgo Uncle Tom[2]) nos Estados Unidos.
Entretanto, a respeito desse recente ocorrido em Orlando, existem algumas coisas que precisam ser ditas ao público. Primeiro, a respeito de Omar Mateen. Inicialmente, foi dito que tal atentado teria sido perpetrado por algum partidário dos republicanos e de seu atual candidato à corrida presidencial, Donald Trump. Entretanto, posteriormente descobriu-se que ele era filiado ao Partido Democrata. Grande ironia do destino, diga-se de passagem, já que ele era filiado ao mesmo partido que sob sua administração legalizou o casamento entre pessoas do mesmo sexo para todo o território estadunidense. E não só isso: trata-se do mesmo Partido Democrata ao qual o discurso da esquerda liberal brasileira e de grandes veículos da mídia nacional como a Rede Globo e a Veja é afinado. Também surgiram histórias de que Mateen em verdade era homossexual. Segundo Sitora Yusufiy, sua antiga esposa, ele, além de homossexual levava uma vida dupla, frequentava a discoteca desde 2013 e era conhecido de drag queens que trabalhavam no local e usava os aplicativos Grindr e Jack’d para conversar com outros homens. Soube-se também que ele trabalhou durante muitos anos para a empresa multinacional G4S, uma empresa transnacional israelo-britânica que presta serviços de segurança em aeroportos da Europa e dos Estados Unidos e que foi acusada de torturas a presos palestinos em prisões israelenses sob sua jurisdição.
E, como era de se esperar, as repercussões que o atentado trouxe foram das mais variadas.  A página do Facebook “Meu professor de História” postou a imagem abaixo:

Foto – Imagem postada pela página do Facebook “Meu professor de História”, que insinua que caso Omar Mateen fosse brasileiro ele seria eleitor de Jair Bolsonaro, sendo que Mateen em realidade era filiado ao Partido Democrata.
Como já foi aqui dito em algumas ocasiões, no plano político-ideológico Jair Bolsonaro, assim como outras figuras da nova direita brasileira como Marco Feliciano, está muito mais próximo dos Republicanos que dos Democratas. De modo geral, o Partido Democrata demonstra muito mais abertura a pautas tidas como progressistas tais como implantação da ideologia de gênero, liberação de direitos para minorias específicas, de drogas e de aborto que o Partido Republicano. Isso já desmonta completamente a fala da página em questão, assim como a mensagem postada por Lindbergh Farias em sua página no Facebook às 14h32 de 12 de junho de 2016 dizendo que o atentado em questão teve motivação de cunho homofóbico e ainda dizendo que gente como Donald Trump e Jair Bolsonaro são cúmplices do crime por supostamente serem porta-vozes do ódio.
E, como de se esperar, Jean Wyllys se manifestou sobre esse incidente em sua página no Facebook. No dia do atentado, o ex-BBB e político do PSOL postou uma mensagem se queixando do fato de que existem pessoas que se incomodam com coisas como a expressão pública de afeto homossexual, que não querem que seus filhos vejam cenas de beijo gay, que são contra o kit gay que ele almeja implantar (e que ajudou a levar Jair Bolsonaro ao estrelato político), afirmando que o ataque teve motivação homofóbica, que o Estado Islâmico é um grupo que advoga a homofobia, atacando aquilo que ele chama de fundamentalistas religiosos e dizendo que a boate não foi escolhida por acaso (pelo visto o ex-BBB acha que o beijo gay em uma novela da Rede Globo é mais importante que, por exemplo, a miséria no Nordeste, a violência urbana no Rio de Janeiro ou o montante de dinheiro que o país perde todo ano através dos pagamentos dos altíssimos juros e encargos do serviço da dívida para bancos nacionais e internacionais [aquilo que em vida Brizola chamava de “perdas internacionais”]. Desse jeito, a esquerda que está ai apenas vai ficar sendo passada para trás pela direita).
Marco Feliciano, por seu turno, postou várias mensagens sobre o ocorrido em sua conta no Twitter. Na primeira, afirmou que os grupos de ativismo GLBT estavam tentando usar a tragédia para se promoverem. Na segunda, disse que esses mesmos ativistas se calam quanto a outros atentados e fala de um suposto apoio de partidos de esquerda para a Palestina em detrimento de Israel. Na terceira, acusa a esquerda radical de ser a líder do terrorismo global e de ter apoio de governos por ele tido como totalitários. Na quarta, se queixa do fato da indiferença das pessoas quanto às matanças promovidas pelo Estado Islâmico (que como já dito anteriormente é apoiado pelo Ocidente “livre e democrático” que essa gente tanto defende) contra os cristãos da Síria e do Iraque. E na quinta acusou o Estado de São Paulo (que é comumente tido como parte do PIG [Partido da Imprensa Golpista] por seus detratores) de ser um jornal de esquerda e de personalidades como José de Abreu, Rafinha Bastos, Felipe Neto e Jean Wyllys de serem fiéis ao Estado Islâmico.
Mas o mais patético de tudo, além do fato de que a mídia de massa ocidental ter dado pouca ou nenhuma atenção a respeito de tragédias como os 700 imigrantes africanos que morreram em naufrágios nos últimos dias tentando atravessar o Mediterrâneo rumo à França, é a ferramenta que o Facebook lançou em solidariedade às vítimas do ataque (como se não bastasse o que foi feito anteriormente na época da aprovação do casamento gay para todo o território estadunidense em que coloria o avatar da pessoa com as cores da bandeira arco-íris e depois o que foi feito na época do ataque ao Le Bataclan, onde criou uma ferramenta em que coloria o avatar da pessoa com as cores da bandeira francesa).

Foto – “We are Orlando” (Nós somos Orlando). Ferramenta lançada pelo Facebook em homenagem às vítimas do ataque à boate Pulse.
Mas eu não mudei meu avatar em solidariedade às vítimas do ataque recente em Orlando, assim como não colori meu avatar tanto na época da aprovação do casamento gay para todo o território estadunidense quanto na época do ataque ao Le Bataclan. Não agi como se fosse parte de um rebanho acéfalo que não sabe o que está comendo como muitos agiram, até pelo fato de ver toda a patifaria e o circo midiático em que isso está envolto. Uma pessoa, quando coloca a bandeira GLBT e o letreiro “We Are Orlando” em sua foto no Facebook e adere à campanha da GLAAD, automaticamente também está comendo, entre outras coisas, manobras da politicalha norte-americana para desviar a atenção do povo quanto aos problemas do país (entre eles os crescentes índices de pobreza e concentração de renda nas mãos de uma elite numericamente bem restrita), ações do imperialismo norte-americano no Mundo Islâmico, ataques de falsa bandeira para justificar ações militares norte-americanas em países como a Síria e a Irã e um maior recrudescimento de tensões com a Rússia e a China, relações escusas entre os Estados Unidos e o terrorismo wahhabita-takfirista, estratégia de caos e tensão da parte das elites globais, entre outras coisas.
E o mais importante de tudo: há mais uma coisa que deve ser dita a respeito desse último ocorrido, tendo vista o alegado motivo do atentado e o seu alvo (e que para variar não vejo ninguém falando uma única palavra a esse respeito). E isso não é se o pai de Mateen também é homofóbico e transmitiu isso para seu filho, se o país tem que liberar ou restringir o acesso a armas para toda a população, se o Islã é ou não é uma religião intolerante e belicosa ou algo do tipo (discussões essas que apenas desviam o foco da atenção das pessoas quanto às questões realmente importantes e da qual a mídia de massa se aproveita), e sim outra coisa totalmente diferente. Vamos tocar na ferida do problema. O atentado na boate Night é o retrato do tipo de país que os Estados Unidos, no plano social, ideológico e moral, hoje são.
Por um lado, é um país com grande concentração de fundamentalistas religiosos, geralmente de matiz ideológico neoconservador e favoráveis ao Partido Republicano. São os mesmos que vivem tentando impor o ensino de criacionismo nas escolas e fazendo mil e uma artimanhas para refutar a teoria da evolução de Charles Darwin. É também o país dos rednecks, os brancos conservadores sulistas que são a massa de manobra do Partido Republicano (ao passo que minorias como gays, negros e latinos são usadas de forma análoga pelo Partido Democrata). Mas, ao mesmo tempo em que há esses elementos neoconservadores e puritanos no país, o país também está repleto de liberais e tem um grande antro liberal chamado Hollywood, além do fato de ser governado por um grupo político, o Partido Democrata, que advoga o mesmo liberalismo de esquerda que advoga partidos como o PSOL aqui no Brasil, o Partido Socialista na França (partido do atual presidente François Hollande[3]) e o Frente Ampla no Uruguai (partido do ex-presidente José Mujica[4] e do atual presidente Tabaré Vázquez), entre outros. Muitos artistas de grande penetração popular demonstram simpatia a essas pautas tidas como “progressistas”, entre eles Madonna, Katy Perry, Lady Gaga, Demi Lovato (a qual em um show na Parada do Orgulho Gay de Nova York do ano retrasado promoveu um beijo entre dois dançarinos seus, e um deles segurava uma máscara do presidente russo Vladimir Putin na cueca, pelo simples fato de Putin ter proibido paradas gays na Rússia por mais de 100 anos. Essa atitude por parte da cantora estadunidense causou muita irritação entre os russos, até mesmo entre fãs russos da cantora), Christina Aguilera, Jessica Alba, Miley Cyrus, Bruce Springsteen, Barbra Streisand, Cindy Lauper, Ricky Martin e tantos outros artistas e personalidades do meio que são favoráveis a causa GLBT.
Muitos desses artistas, após o atentado em Orlando, participaram de vigílias e postaram mensagens de solidariedade às vítimas do atentado em redes sociais como o Twitter, o Instragam e o Facebook, como por exemplo, a mensagem postada por Madonna onde ela postou a foto do beijo com Britney Spears no Video Music Awards de 2003 com uma legenda abaixo com o letreiro “Parem com o ódio, parem com a violência #RevoluçãodoAmor” e intitulada “Gay ou hétero, sem ódio”. No Instagram, Lady Gaga postou uma mensagem onde disse “Mantenha o seu orgulho firme, ele pertence à você. Amor é o oposto de ódio. Meu sincero luto aos LGBTQ que estão sofrendo hoje. Eu rezo pelo controle das armas e por uma revolução cultural de gentileza. Para todas as pessoas. Não podemos nos dividir diante do mal, devemos permanecer juntos e curar uns aos outros. Somos irmãos e irmãs”. Johnny Massaro disse na mesma rede social “Lá, aqui, já passou da hora... vamo lá, minha gente! Para frente, com AMOR. E sempre bom lembrar: TCHAU Bolsonarxs, Felicianxs e agregadxs. Levem com vocês o ódio, a intolerância e toda essa ignorância. NINGUÉM precisa do que vocês têm a oferecer”. Ariana Grande, em sua conta no Twitter, se pergunta “Como como como como alguém pode ter tanto ódio??? Meu coração... está partido. Estou rezando pelas famílias das vítimas de Orlando. Estou muito triste”. Nas falas desses artistas e de outros, que praticamente só sabem falar de amor, ódio, homofobia, intolerância, ignorância e palavras afins, vemos o quanto elas são alienantes da realidade e das questões cruciais nele envolvidas, e nisso elas se igualam a fala de alguém como Marco Feliciano. É o típico ativismo de gente famosa não toca nas mazelas do sistema e que tem o efeito prático de endossar o circo que a grande mídia cria em torno de eventos como esses.
E o pior é que esse é o país em que pessoas como Olavo de Carvalho (vulgo Sidi Muhammad Ibrahim) olham como o mais cristão do mundo (o qual certamente recebeu uma grande bofetada na cara com a aprovação do casamento GLBT em todo o território ianque). Sendo que em realidade o conservadorismo social que gente como Olavo de Carvalho, Marco Feliciano e Jair Bolsonaro tanto pregam é, ironicamente, mais forte não nos Estados Unidos, na União Europeia e no Israel que eles tanto defendem, e sim em países que eles acham a escória do mundo como a Rússia, o Irã, a China, a Coréia do Norte, a Venezuela, a Síria e a Líbia durante a era Kadaffi, entre outros. Até por que como chamar de cristão um país que aprova o casamento gay para todo o seu território e que é o quartel general do liberalismo no mundo (e dai exportando suas mazelas para os quatro cantos do globo)? Parece que para essa gente os Estados Unidos ainda vive no final do século XVIII e começo do século XIX.
E o que será que esses dois lados em questão tem em comum? Diferente do que possa aparentar à primeira vista, a direita neoconservadora e a esquerda progressista, não são diametralmente opostas entre si. Muito pelo contrário. Elas são como o Yin e o Yang[5] no taoísmo, as duas faces do deus Janus[6] na mitologia romana e os personagens Piccolo e Kami Sama em Dragon Ball: dois elementos opostos entre si, mas que ao mesmo tempo se completam entre si formando uma unidade contraditória, a ponto de um não existir sem o outro e vice-versa. Entre os dois polos, há uma retroalimentação em que um deles puxa votos para o outro e vice-versa, como se fosse um cachorro correndo continuamente atrás de seu próprio rabo. A direita de matiz puritana neoconservadora se arvora de ser a “guardiã da moral e dos bons costumes ante a pouca vergonha que ai está”. E a esquerda liberal progressista, por sua vez, fica se gabando de ser “a protetora dos direitos das minorias ante a truculência da direita neoconservadora”. E não é de hoje que essa complementariedade entre os dois lados foi percebida: em um trecho de sua obra “Humanismo Proletário” (1934), o escritor russo Maksim Gorkiï disse “Уничтожьте гомосексуализм – Фашизм исчезнет! (em português “Destruam o homossexualismo[7] – fascismo desaparece!”). Aplicando essa frase para o Brasil atual, poderíamos dizer “Уничтожьте Жана Уиллиса – Жаир Болсонаро исчезнет!”(“Destruam o Jean Wyllys – Jair Bolsonaro desaparecerá!”). Ou para o contexto dos Estados Unidos de hoje, poderíamos dizer “Уничтожьте Мадонну – Сара Пэйлин исчезнет!”(“Destruam a Madonna – Sarah Palin desaparecerá!”). E quando falo nessas figuras patéticas, não falo apenas nelas em si, e sim em tudo o que elas representam política e ideologicamente. E o que Gorkiï quis dizer com isso? Que da mesma forma com que em Dragon Ball quando Piccolo morreu na luta contra Nappa e Vegeta Kami Sama também morreu, se um dos lados vier a ser destruído o outro também desaparecerá. E é justamente por causa dessa complementariedade e retroalimentação entre os dois lados que eles podem coexistir sem se destruírem mutuamente.

Foto – “Unichtozhte[8] gomoseksualizm – fashizm inscheznet! (Destrua o homossexualismo – o fascismo desaparecerá)”, Maksim Gorkiï em um trecho de sua obra “Humanismo Proletário”, de 1934.
Com seu discurso que privilegia a luta de grupos minoritários em detrimento da luta do povo como uma totalidade, a esquerda liberal universitária aliena grande parte do povo com pautas como liberar aborto, drogas e empoderamento de minorias. E assim cria um vácuo do qual a direita neoconservadora se aproveita e ocupa, atraindo para si esse mesmo povo através de seu canto da sereia. Entretanto, essa mesma direita também produz um vácuo na medida em que ao mesmo tempo em que ataca o maconhista ou o abortista que está na mídia ou na universidade não ataca o grande capitalista que apoia esses grupos por trás das cortinas (ou seja, mata a cobra que está no jardim da sua casa, mas não destrói o ninho da mesma que está no mato). É aquilo que eu, parafraseando Alain Soral, chamo de “a direita dos valores sem a esquerda do trabalho”. E é a graças a esse vácuo que a direita neocon produz através de sua retórica rasteira, tacanha e tão ou mais alienante das massas que a esquerda liberal universitária floresce.
Aliás, falando em puritanismo, que diferença há do ponto de vista ideológico entre o wahabismo que grupos como a Al Qaeda e o Estado Islâmico professam e o fundamentalismo dessas Igrejas neopentecostais e o uso que eles fazem do criacionismo como uma ideologia de negação da teoria da evolução (ao ponto de quererem dar ao criacionismo um verniz científico, que eles dão o nome de design inteligente)? A meu ver, nenhuma, tirando o fato de que os primeiros tem um maior envolvimento com grupos terroristas na atualidade. Os dois se igualam no reacionarismo, no puritanismo e no mais rasteiro e tacanho moralismo.
E isso não é tudo: muitas dessas celeumas todas from United States estão sendo exportadas para o Brasil, entre elas a questão da polêmica entre evolucionismo e criacionismo, liberação de direitos específicos de minorias, ações afirmativas, cotas raciais, as teorias conspiratórias trazidas por Olavo de Carvalho, o tal marxismo cultural e outras. No Brasil, temos visto o crescimento de uma nova direita que ideologicamente se aproxima muito mais do Partido Republicano e que tem entre seus principais gurus figuras como Jair Bolsonaro e Marco Feliciano. Do outro lado, há uma esquerda que tem exportado essas pautas do Partido Democrata, e que entre seus principais gurus estão figuras como o ex-BBB Jean Wyllys e a ex-petista Luciana Genro. Os dois lados se igualam tanto na importação dessas celeumas vindas do norte quanto na importação de discursos vindos dos principais partidos da ordem burguesa dos Estados Unidos, assim como o uso de um figurino ianque (parafraseando Nildo Ouriques) e a desvinculação em relação à realidade nacional e seus reais problemas. E isso é no mínimo muito interessante para as classes dominantes nacionais, tal qual para as classes dominantes dos Estados Unidos é interessante o eterno cabo de guerra entre os Republicanos e os Democratas. Afinal, em uma esquerda como essa, muito mais preocupada em empoderar minorias que com a fome que aflige o povo ou com o Bolsa Banqueiro, será que surgirá um novo Brizola? E de uma direita como essa, muito mais preocupada em bater boca com seus adversários políticos, surgirá um novo Enéas? A resposta para as duas perguntas é não.

Foto – As duas faces de Janus contrapostas entre si: Jean Wyllys e o Pastor Marco Feliciano, dois grandes expoentes da esquerda liberal e da direita neoconservadora no Brasil na atualidade. Reparem que ambos se igualam no discurso da tolerância.
Fontes:
Atirador de Orlando é suspeito de aliança com o Daesh. Disponível em: http://br.sputniknews.com/mundo/20160612/5054540/atirador-orlando-tiroteio-mortes.html
Atirador era gay e usava apps de paquera LGBT, diz ex-esposa. Disponível em: https://www.noticiasaominuto.com.br/mundo/238331/atirador-era-gay-e-usava-apps-de-paquera-lgbt-diz-ex-exposa
Artistas manifestam apoio às vítimas do massacre de Orlando. Disponível em: http://oglobo.globo.com/cultura/artistas-manifestam-apoio-vitimas-do-massacre-de-orlando-19490820
Demi Lovato promove beijo gay com máscara de Vladimir Putin e irrita russos. Disponível em:
Estado Islâmico assume autoria do ataque em Orlando. Disponível em: http://brasil.elpais.com/brasil/2016/06/12/internacional/1465757788_103808.html
Imprensa culpa Feliciano, Malafaia, Macedo e Bolsonaro por massacre em boate gay. Disponível em: https://noticias.gospelprime.com.br/imprensa-feliciano-malafaia-massacre-boate-gay/
LGBT rights activists in USA (em Inglês). Disponível em:
Madona, Beyoncé, Kim Kardashian e outros famosos lamentam atentado em Orlando. Disponível em: http://gente.ig.com.br/2016-06-13/madonna-beyonce-kim-kardashian-e-outros-famosos-lamentam-atentado-em-orlando.html
Marco Feliciano faz comentários constrangedores sobre o massacre em Orlando. Disponível em: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2016/06/marco-feliciano-faz-comentarios-constrangedores-sobre-o-massacre-em-orlando.html
Matanza de homosexuales en los Estados Unidos (em espanhol). Disponível em: http://katehon.com/es/agenda/matanza-de-homosexuales-en-los-estados-unidos
Primeros elementos sospechos de la matanza de Orlando (em espanhol). Disponível em: https://elrobotpescador.com/2016/06/13/primeros-elementos-sospechosos-de-la-matanza-de-orlando/
Socialismo e direitos gays. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Socialismo_e_direitos_gays
Terrorista de Orlando referiu irmãos Tsarnaev durante o ataque. Disponível em: https://www.noticiasaominuto.com/mundo/604625/terrorista-de-orlando-referiu-irmaos-tsarnaev-durante-ataque
Terrorista responsável por massacre na Flórida era correligionário de Obama e Hillary. Disponível em: http://www.sulconnection.com.br/noticias/3453/terrorista-responsvel-por-massacre-na-flrida-era-correligionrio-de-obama-e-hillary
“Уничтожьте гомосексуалисм – Фашизм исчезнет” (em Russo). Disponível em:


NOTAS:


[1] Leia-se “Djorrar”, pois no russo as partículas zh (cirílico ж) e kh (cirílico х) tem valor de j e r aspirado, respectivamente.
[2] Termo comumente utilizado de forma pejorativa pelos negros norte-americanos para se referir a pessoas negras por elas vistas como subservientes aos brancos.
[3] Leia-se “Françuá Ollande”, pois no francês a partícula ois tem valor de oá e o h é mudo.
[4] Leia-se “Rrosê Murrica”, pois no espanhol a partícula é se lê como o ê no português e o j tem o mesmo valor do h no inglês, do ch no alemão e do kh no russo: r aspirado.
[5] Leia-se “Yan”. No mandarim, assim como no francês, quando uma palavra termina em consoante, a última é sempre muda.
[6] Leia-se “Ianus”. No latim, assim como em idiomas como o alemão, o holandês, o húngaro, o polonês, o servo-croata, as línguas escandinavas e bálticas, o tcheco, o eslovaco e outros tantos, a partícula j tem valor de i.
[7] Aqui, quando Gorkiï fala sobre homossexualismo, ele está falando a respeito do ativismo GLBT, e não sobre os homossexuais enquanto indivíduos.
[8] Leia-se “Unitchojte”, pois no russo as partículas ch (cirílico Ч) e zh (cirílico Ж) tem valor de tch e j, respectivamente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário