terça-feira, 19 de junho de 2018

Considerações sobre o péssimo comportamento de torcedores brasileiros na Copa do Mundo.



Foto – Charge do cartunista Gilmar sobre o episódio aqui abordado.
Recentemente, durante a Copa do Mundo na Rússia, os torcedores brasileiros aprontaram mais uma das suas, dessa vez na cidade de Rostov. Abordaram uma torcedora russa e se aproveitando do desconhecimento da russa para com a língua portuguesa, fizeram-na falar palavras como “buceta rosa” e “essa é bem rosinha”. Um outro grupo de torcedores abordou três russas e igualmente se aproveitando do desconhecimento as fizeram repetir palavras de baixo calão (que aqui não serão reproduzidas). Isso é simplesmente nojento, repulsivo e repugnante. Nós, do Resistência Terceiro-Mundista, repudiamos tais episódios constrangedores e repulsivos e que apenas arranham ainda mais a já péssima imagem que o brasileiro tem fora do país. Mas é bom recordar que essa não é a primeira vez que brasileiros perdem a linha com estrangeiros. Recordemos aqui alguns desses episódios.
No Facebook tivemos os casos dos atores Širo Izumi (Juma Oozora/Change Pegasus em Changeman, Burai/Dragon Ranger em Zyuranger), Sajoko Hagiwara (Rei Tačibana/Dyna Pink em Dynaman, Nefer em Flashman) e Džuniči Haruta (Kanpei Kuroda/Goggle Black em Goggle Five, Rjuu Hošikawa/Dyna Black em Dynaman, MacGaren [originalmente Mad Gallant] em Jaspion, Kazenin Storm em Džiraja), os quais bloquearam e excluíram os brasileiros de seus respectivos perfis depois de tantas marcações em fotos dos trabalhos por eles feitos nos anos 1980 e 1990, postagens em português (idioma esse que eles não entendem) e ainda se comportando como se fossem amigos próximos deles. No caso específico de Sajoko Hagiwara[1], chegaram até a fazer marcações de fotos dela nua de quando ela era jovem (provavelmente da mesma época em que ela participou dos seriados) e comentários em português com mensagens do tipo “Sajoko você continua linda, casa comigo?” e “japa linda, vem para o Brasil casar comigo”. Imagine o quão constrangedor deve ser para ela, que agora já é uma mulher de 55 anos e que desde então parou de adicionar brasileiros em seu perfil no Facebook. Ou mesmo o caso de Tota Tarumi (Džin/Red Flash em Flashman), que chegou a ser chamado de Deus por alguns desses indivíduos. Excetuando-se Džuniči Haruta (que periodicamente faz participações em seriados do gênero Kamen Rider e Super Sentai), todos os atores aqui citados há muito tempo se encontram afastados do meio e não participam mais desses seriados.
Mesmo com atores que até agora não bloquearam os brasileiros como Hiroši Tokoro (nome artístico Šohei Kusaka; Naoto Tamura/Džiban em Džiban, Kamenin Oruha em Džiraja) e Takumi Cucui[2] (Toha Jamaši/Džiraja em Džiraja e Ninninger) eles fazem o mesmo. Mas como Bone Lopes disse em um de seus vídeos sobre o assunto, como tais atores em questão ainda têm algum envolvimento com o meio, eles não têm o mesmo incômodo que têm atores que há muito tempo estão fora do meio (e o curioso é que no perfil de Džodži Nakata, notório por ter interpretado o caçador Kaura em Flashman e o Grande Professor Bias em Liveman e que hoje é dublador no Japão, não vi o perfil dele ser invadido por spams como outros atores). Chegou-se ao ponto de uma fã marcar que era namorada do Džiban (e o próprio aceitou, sem saber do que se tratava). Sobre esse assunto, o canal Resistência Tokusacu lançou vários vídeos a esse respeito, visando orientar o público sobre como se comportar com os atores nipônicos nas redes sociais.
Antes mesmo do Facebook, consta na edição número 55 da revista Neo Tokyo que a autora do mangá Love Junkies, Kjo Hacuki, nos idos de 2005/2006, recebeu vários e-mails de fãs brasileiros em português e assim não entendia nada do que eles falavam.

Foto – Campanha “Fã consciente”, lançada no ano retrasado por vários sites de tokusacu para conscientizar os fãs dos seriados.
Também é digno de nota o ocorrido em 2016 com o ator Tyler James Williams, notório por ter interpretado o Chris no sitcom “Todo mundo odeia o Chris”. Os fãs brasileiros do seriado começaram a encher o perfil do ator estadunidense no Instagram com mensagens contendo frases bem-humoradas do seriado, todas elas em português. A tal ponto que o perfil de Tyler James Williams tornou-se uma verdadeira caixa de spam e que ele perdeu a paciência e deu a seguinte resposta aos fãs brasileiros, aparentemente com a ajuda de um tradutor online: “Brasil eu te amo, eu realmente ‘fazer’, mas se você não parar ‘spamming’ meus comentários estou indo para começar a bloquear você”.

Foto – Fãs brasileiros postando spam no perfil de Tyler James Williams no Instragram.
Mas por qual motivo, razão ou circunstância falar sobre isso? Porque é por causa de coisas como essas que o brasileiro no exterior não raro tem má fama no exterior e que quem nada tem haver com isso literalmente paga o pato da FIESP nessa brincadeira toda (pato esse que, diga-se de passagem, é um símbolo do fato de que aqui no Brasil aqueles que pertencem ao 1% mais rico não pagam impostos e da secular prática de em tempos de crise os donos do poder econômico passarem o ônus da crise para o povão pagar).
A julgar pelo desânimo do povo brasileiro quanto à Copa do Mundo de 2018 e a calamitosa situação que o país vive, os torcedores que para a Rússia foram são sujeitos abastados, de classe média alta para cima, que tem dinheiro para se hospedar em hotéis caros e por vários dias. É o mesmo perfil do tipo de gente que bateu panelas, xingou a Dilma em pleno Itaquerão, foi às ruas com a camisa da seleção brasileira pedir intervenção militar e o impeachment de Dilma Rousseff e que comemorou com fogos de artifício a condenação e a prisão de Lula (e que certamente é o mesmo perfil daqueles que alopraram o perfil dos atores japoneses no Facebook e do Tyler James Williams no Instagram).
A julgar pela maneira como se comportaram diante das mulheres russas, é o tipo da gente que olha a mulher como um mero objeto de satisfação sexual. Por causa de pessoas assim que existem as piriguetes das quais não raro eles se queixam e as feministas das quais eles tanto demonizam. Certamente também é o tipo da pessoa que banca perante a sociedade o “homem de bem”, “homem de família”, entre outros rótulos, mas que em momentos como esse literalmente libera seu lado animalesco. E que, além de não perceberem a relação dialética existente entre eles (semelhante à existente entre Jean Wyllys e Jair Bolsonaro e tudo o que ambos representam no plano político-ideológico), que possuem uma noção bem deturpada de masculinidade, a ponto de achar que são os machões do pedaço só por verem fotos de mulheres nuas em revistas masculinas tais como Playboy, Sexy, Penthouse e outras similares.
E isso derruba com a falácia da tal da perfeição moral da classe média tanto em relação aos pobres quanto em relação aos ricos (os verdadeiros ricos, diga-se de passagem, não sujeitos que pensam que são ricos só por terem certa quantia de dinheiro e/ou morarem em um apartamento em um bairro nobre da cidade) que eles sentem. Isso mostra que não é porque o sujeito de classe média para cima, por ter educação e o chamado capital cultural, sabe se comportar e tem bons modos, ainda mais quando está fora do país. Certamente, trata-se do mesmo tipo de gente que reclamava dos rolezinhos em Shopping Centers há alguns anos. E sintomático do fato de que o Brasil é um país onde as pessoas são criadas não para serem cidadãs, mas telespectadoras, e que esse tipo de comportamento não atinge apenas cidadãos das classes populares e que aqueles que pertencem às classes abastadas igualmente estão sujeitos a serem infectados pelo tipo de cultura de massa que se produz aqui no Brasil, mesmo com todo o capital cultural que eles têm e a reproduzi-los.
Fontes:
Assédio dos brasileiros contra mulheres russas. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=JzuOSE4lzTw&ab_channel=TopChannel
Atores Tokusatsu: falta de respeito! Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=HKkKIOcsHZc&ab_channel=Resist%C3%AAnciaTokusatsu
Change Pegasus exclui fãs brasileiros!! Resistência Tokusatsu. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=1XX299aJBc4&ab_channel=Resist%C3%AAnciaTokusatsu
Coxinhas abusam de mulher russa com linguagem chula e ainda postam o vídeo. Disponível em: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/coxinhas-abusam-de-mulher-russa-com-linguagem-chula-e-ainda-postam-o-video/
Neo Tokyo nº55. São Paulo: Editora Escala, 2010. p. 27.
Resistência Tokusatsu: Fãs conscientes! União Tokusatsu. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=3S-to0C1Cwc&ab_channel=Resist%C3%AAnciaTokusatsu
Tyler James Williams, de “Todo Mundo odeia o Chris”, se irrita com brasileiros. Disponível em: http://ego.globo.com/famosos/noticia/2016/02/tyler-james-williams-de-todo-mundo-odeia-o-chris-se-irrita-na-web.html

NOTAS:

[1] Leia-se “Haguiuara”. No japonês, assim como em idiomas como o alemão, o polonês, o russo e o mongol, o som da partícula g não muda conforme a vogal seguinte tal como no inglês e nas línguas neolatinas.
[2] Leia-se “Tsutsui”.