sexta-feira, 24 de junho de 2016

Aleksandr Dugin - BREXIT, nada pessoal.


Por Aleksandr Dugin
Tradução por Lucas Novaes
Primeiramente, a própria existência do referendum é importante. A União Europeia foi fundada sem a consulta dos europeus comuns. Foi uma decisão das elites europeias apoiadas por Washington e por um clube de globalistas fanáticos tais como George Soros. Ninguém consultou a opinião do povo e isso foi decidido sem sua vontade. Na época, havia a União Soviética, então a integração europeia foi feita com o objetivo de ir contra nosso estado e o bloco do leste europeu. Entretanto, a União Soviética colapsou mais rápido do que o esperado, e a União Europeia teve de ser completada sob condições completamente diferentes das quais foi fundada.
No início dos anos 1990, a Europa Unida estava perto de surpreender os americanos. Sem mais inimigos no Leste, as elites nacionais francesas e alemães miraram a criação de um sistema de segurança independente, suas próprias forças armadas, as EuroCorps, com a visão de sair do controle da OTAN ou, pelo menos, do controle dos Estados Unidos. Logicamente, considerando que Moscou dissolveu o pacto de Varsóvia, era tempo de dissolver a aliança do Atlântico Norte também. A Europa era capaz de se tornar uma jogadora geopolítica independente, mesmo que não pró-russa, ao menos claramente não pró-americana.
Então, o Reino Unido entrou no estágio como o principal parceiro dos Estados Unidos no Velho Continente. Os americanos já foram uma colônia britânica, mas no século XX, os papeis se inverteram, e agora em termos políticos e estratégicos, a Inglaterra se tornou vassala dos EUA. Essas são as realidades duras da geopolítica; o centro do atlantismo se mudou ainda mais para o Ocidente. Então, a Grã-Bretanha criticou todas as iniciativas de Berlim e Paris e seus objetivos de criar uma Europa real, uma Europa europeia e não americana ou atlantista. E o Reino Unido preencheu esse papel com sucesso. Não interveio nos negócios da União Europeia, porém sempre que as potências continentais declaravam sua posição de ser diferente dos americanos, os britânicos se prostravam em defesa de Washington. Seu papel de vassalos requeria isso.
Esse foi o caso durante a Guerra do Iraque. Os britânicos, nem mesmo aceitando o euro (continuaram com a Libra), pareciam que estavam mesmo fora da Europa. Mas logo que os países europeus conceberam algo diferente, algo realmente europeu, Londres imediatamente se tornou ativa, geralmente se posicionando ao lado dos “europeus” mais estrangeiros, aqueles majoritariamente dos países do Báltico e do Leste europeu que rapidamente trocaram um mestre (USSR) pelo outro (EUA) e que começaram a se rebelar contra o velho mestre. A agenda gritante era, claro, decidida em Washington, mas o Albion Nevoento[1] contribuiu com um jogo anglo-saxão e anti-europeu bastante desagradável velado em um estilo altamente arrogante e fora de moda.
Mas agora, os britânicos decidiram sair. Brexit. Entretanto, depois de tudo, as pessoas não foram perguntadas quando entraram na Europa em primeiro lugar e, sendo honesto, os ingleses perderam pouco por estarem na União Europeia. Meras ninharias. A questão é outra. Quem ainda precisa da União Europeia? Os partidos eurocépticos, tanto da direita como da esquerda, estão vencendo em mais e mais países, então a tendência principal é claramente o fim da União Europeia.
Uma coisa é clara; Brexit significa que as mesmas forças que criaram a União Europeia, o mesmo velho clube globalista, agora estão dissolvendo-a para seus próprios propósitos, tendo ficado desapontadas ou procurando por uma estratégia diferente. De qualquer forma, isso claramente irá levar ao caos. Tal caos tem existido no Oriente Médio e no mundo árabe por um longo tempo, mas agora é a vez da Europa. E tudo está preparado para isso. Os britânicos devem estar, de alguma forma, simplesmente saindo do navio que está afundando. Mas isso não quer dizer que eles estão a salvo. A horda de imigrantes passando pelo Mar Mediterrâneo e Canal da Mancha ainda devem ser lidados por duas frentes. No túnel e na água. Isso os ensinará uma lição.
Se os britânicos decidirem ficar, isso significa que os estrategistas de Washington ainda vão temer que a Europa fique fora de controle, e que sob a ameaça de uma crise fatal eles podem aceitar a aliança proposta com a Rússia, por exemplo. Além disso, Moscou tem sublinhado isso, em qualquer caso, a oferta de amizade ainda está de pé.
A democracia europeia não é mais o mandamento do povo, mas o mandamento das elites. Portanto, o povo não decide nada. Uma sociedade puramente do espetáculo. Qualquer democracia é apenas uma fachada para o poder das elites. Hoje, isso se tornou óbvio para todos.
Texto retirado de:
http://katehon.com/article/brexit-nothing-personal


[1] “Albion Nevoento”, do inglês “Foggy Albion” é o mais velho nome conhecido dado à ilha da Grã-Bretanha. 

Um comentário:

  1. Primeiramente gostaria de parabenizar os autores do blog. O conteúdo é excelente e vai até o cerne das questões, deixando de lado a superficialidade vista nos sites brasileiros mais conhecidos tanto de "direita" quanto de "esquerda" .

    Queria pedir, se fosse possível, indicação de livros, documentos, sites, que posso utilizar para entender melhor as questões geopolíticas atuais, o papel do Brasil nestas próximas décadas, as mudanças no cenário político brasileiro, além, claro, de alguma teoria sobre um projeto de desenvolvimento nacional próprio, que abandone a submissão americana.

    Seria até mesmo interressante, fazer uma postagem no blog com estas indicações, para pessoas que como eu não tem quase nenhum conhecimento nestes assuntos.

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