Foto – Ariano Suassuna (1927 – 2014).
Hoje,
23 de julho de 2019, completam-se meio decênio que um dos grandes nomes da
literatura brasileira de todos os tempos, o dramaturgo, romancista, ensaísta,
poeta e professor Ariano Vilar Suassuna, nos deixou.
Nascido
nas dependências do Palácio da Redenção, a sede do executivo paraibano, na
atual João Pessoa (então Cidade da Parahyba) no dia 16 de junho de 1927, filho
de Cássia Villar e João Suassuna. Perdeu seu pai aos três anos de idade vítima
de um assassinato por motivos políticos no Rio de Janeiro na sequência da
revolução de 1930 e junto com sua família mudou-se para Taperoá, onde morou
entre 1933 a 1937. Lá, Ariano fez seus primeiros estudos e assistiu pela
primeira vez a uma peça de mamulengos e a um desafio de viola. Isso
A
partir de 1942 passou a viver no Recife (onde terminou três anos depois os
estudos secundários no Ginásio Pernambucano e no Colégio Osvaldo Cruz), e no
dia 7 de outubro de 1945 deu início a sua carreira literária por meio da
publicação do poema “Noturno” no Jornal
do Commercio do Recife. Dois anos mais tarde escreveu sua primeira peça,
“Uma Mulher Vestida de Sol”, e a ela seguiram-se outras tais como “Cantam as
Harpas de Sião” (1948) e “Auto de João da Cruz” (1950). Sua atuação no teatro
também foi marcada pela fundação do Teatro do Estudante de Pernambuco junto com
seu colega da Faculdade de Direito Hermilo Borba Filho (com o qual também veio
a fundar em 1959 o Teatro Popular do Nordeste). Em 1950, Ariano não apenas se
formou na Faculdade de Direito como também recebeu o Prêmio Martins Pena no
mesmo ano por “Auto de João da Cruz”.
Em
1953, um ano após voltar a morar em Recife, escreveu “O Castigo da Soberba” e
no ano seguinte “O Rico Avarento”. Mas foi o “O Auto da Compadecida” (1955),
que projetou seu nome a nível nacional. A sua obra máxima sucederam-se outras
como “O Homem da Vaca e o Poder da Fortuna” (1958) e a “A pena e a lei” (1959).
Em 1969, “A pena e a lei” veio a ser premiada no Festival Latino-Americano de
Teatro. Posteriormente, outras obras viriam a ser publicadas tais como “O
Romance d’A Pedra do Reino – o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta” (1971) e
“História d’O Rei Degolado nas caatingas do Sertão” (1976). Postumamente, mais
precisamente em 2017, foi lançada a obra “A Ilumiara – Romance de Dom Pantero
no Palco dos Pecadores”, cuja organização ficou a cargo de sua família reunindo
os escritos que o mestre levou seus últimos três decênios de vida para
escrever. Segundo as palavras do próprio Suassuna em entrevista concedida à
Veja nove dias antes de deixar este mundo, tal romance foi dedicado a três
pessoas: Miguel Arraes, Lula e Eduardo Campos.
Torcedor
do Sport Club Recife, Ariano Suassuna também se notabilizou por ter sido o idealizador
do Movimento Armorial, ao qual deu início em outubro de 1970. Tal movimento
tinha como objetivo o desenvolvimento de uma arte erudita a partir de elementos
da cultura popular do nordeste do Brasil e no conhecimento das formas de
expressão populares tradicionais. Para tal o movimento procurou direcionar
todas as formas de expressão artística, incluindo música, dança, literatura,
artes plásticas, teatro, cinema e outras. E para tal convocou nomes expressivos
da música com o intuito de procurarem uma música erudita nordestina que viesse a
juntar-se ao movimento. Além de Suassuna, também se destacaram dentro do
Movimento Armorial o artista plástico e ceramista pernambucano Francisco
Brennard, o desenhista e pintor pernambucano Gilvan Samico, o jornalista e escritor
pernambucano Raimundo Carrero, o músico compositor potiguar Antônio Madureira e
o artista e músico pernambucano Antônio Nóbrega, entre outros.
Foto – Ariano Suassuna ao lado de
Miguel Arraes e outros políticos.
Também
atuou na política, tendo sido secretário da educação e cultura do Recife entre
1975 a 1978 e secretário de cultura do Estado de Pernambuco entre 1994 a 1998,
durante o governo de Miguel Arraes. Também digno nota é o fato de que Ariano
Suassuna foi o sexto ocupante da 32ª cadeira da Academia Brasileira de Letras,
para a qual foi eleito no dia três de agosto de 1989 sucedendo a Genolino
Amado. Na cidade pernambucana de São José do Belmonte, cidade onde ocorre a
cavalgada inspirada no “Romance d’A Pedra do Reino”, Ariano Suassuna construiu
um santuário ao ar livre constituído de 16 esculturas de pedra de 3,50 de
altura cada (entre elas imagens de Jesus Cristo, Nossa Senhora e São José, o
padroeiro do município) e dispostas em formato circular, representando o
sagrado e o profano.
Como
pode ser visto em várias de suas aulas-espetáculo disponíveis em sites de
compartilhamento de vídeos como o You Tube, o Vimeo e outros, Ariano Suassuna
foi um notável defensor não apenas da cultura nordestina, como também do Brasil
como um todo. Haja vista, por exemplo, suas críticas a determinados setores da
sociedade brasileira que chegam ao ponto de dividir pessoas entre aquelas que
foram à Disney e aquelas que não foram à Disney e de modo geral sua postura de
valorização da cultura brasileira diante dos modismos vindos de fora (algo que,
diga-se de passagem, não começou hoje, e sim desde os tempos do Império e da
Primeira República, quando a alta sociedade brasileira queria ser francesa e
sonhava com os bulevares de Paris). Também nessas mesmas aulas-espetáculo,
Ariano (citando Machado de Assis) disse que existem dois Brasis: o Brasil
oficial e o Brasil real. O primeiro é o Brasil dos privilegiados, ou seja, daquilo
que Jessé Souza chama de a elite do atraso, que manda no país desde o século
XVI e seus associados. E o Brasil real é o Brasil do povo mais humilde, dos
condenados da Terra. Segundo as palavras do mestre, o primeiro é burlesco e
caricato, enquanto que o segundo é a parte boa do país.
No
presente momento em que temos na presidência do país um sujeito ligado ao
milicianato carioca que lambe as botas das grandes potências (a tal ponto que
faz parecer FHC e Temer nacionalistas) e que não teve o menor pudor em ofender publicamente
a região nordeste (para isso se utilizando da expressão “paraíba”, termo
pejorativo para se referir a nordestinos de modo geral no Rio de Janeiro –
similar ao “baiano” usado em São Paulo), é salutar homenagearmos e lembrarmos não
apenas de Ariano Suassuna, como também de outros tantos próceres da cultura
nordestina (incluindo também Paulo Freire, do qual Ariano Suassuna era grande
amigo e que o miliciano e sua gangue querem a todo custo caçar o título de
patrono da educação brasileira a ele concedido em 2012). É uma forma de lembrar
não apenas o grande homem que Suassuna em vida foi e toda a contribuição cultural
que a nós nos legou, mas valorizamos a cultura não apenas do Nordeste como
também do Brasil como um todo, ainda mais nesse momento crítico e nos dias
sombrios que o país vive.
ARIANO VILLAR SUASSUNA, PRESENTE!
Foto – Ariano ao lado de sua esposa Zélia,
companheira de vida com a qual foi casado durante 57 anos.