segunda-feira, 10 de abril de 2017

Escola sem Partido, parte 8 - A pirotecnia de Fernando Holiday.


Foto – Logo do Escola sem Partido.
Recentemente, o deputado Fernando Holiday, vereador do Democratas (DEM, antigo PFL) e coordenador do membro do Movimento Brasil Livre (MBL), esteve em algumas escolas da periferia de São Paulo inspecionando-as sob a alegação de “coibir qualquer tentativa de doutrinação que nossas crianças e adolescentes possam vir a sofrer”. Isso obviamente está causando preocupação nos professores que trabalham na rede pública de São Paulo.
Fernando Holiday, filho de uma auxiliar de enfermagem com um garçom, lá foi cumprir o papel de censor do movimento Escola sem Partido. E ao que tudo indica o que ele intenta fazer, pelo que sua fala transparece, é que apenas as ideias mais retrógradas e reacionárias sejam ensinadas e discutidas em sala de aula. Em outras palavras, que não se discuta em sala de aula temas tais como a questão da reforma agrária, da auditoria da dívida (tanto interna quanto externa), os lucros astronômicos que bancos e empresas multinacionais aqui instaladas todo santo ano auferem aqui no Brasil e que remetem ao exterior por meio de remessas, royalties e outros artifícios, a questão da regulação dos grandes meios de comunicação, entre outras tantas questões de importância visceral para o país.
Segundo Leonardo Stoppa, Fernando Holiday em realidade não sabe o que está fazendo ao certo, que está cumprindo um roteiro do qual ele é um de seus muitos atores e criado por um esquema neoliberal cujo objetivo é criar entre as pessoas a sensação de que há um grande inimigo: a suposta doutrinação feita por professores de esquerda em sala de aula. E assim, enche-se a bola de tal inimigo de tal forma que desvia a atenção das pessoas para as mazelas desse mesmo sistema que tem um poder de dominação ideológica muito maior que a que esses professores dispõem. E assim, as crianças serão tiradas das escolas convencionais que ensinam matérias como História e Geografia e enviadas para escolas paralelas. Nessas escolas paralelas, fanáticos cristãos seriam criados em um clima similar ao que existiu nos EUA durante os anos do macarthismo e que poderão aprovar em plebiscito todas as vontades de um presidente títere dos grandes banqueiros que mandam na política por trás das cortinas.
E então pergunto: será que ele, que tanta questão faz de inspecionar escolas da rede pública para ver se há uma suposta doutrinação de esquerda nesses recintos, teria peito para visitar faculdades de cursos como gestão e administração de empresas, de onde saem os dirigentes de organizações patronais como a FIESP (Federação das Indústrias de São Paulo) e a CNI (Confederação Brasileira da Indústria) que aparecem por ai apoiando pautas como terceirização, golpes de Estado em momento de crise econômica, arrochos salariais e aumento da jornada de trabalho da classe trabalhadora? Será que é por mero do acaso do destino que os representantes da Casa Grande, em entrevistas e pronunciamentos, periodicamente dizem tais coisas na cara dura diante da população? Como, por exemplo, quando Robson Braga de Andrade, presidente da CNI, afirmou que a carga horária do trabalhador brasileiro deveria ser aumentada de 44 para 80 horas (no que faria o trabalhador brasileiro trabalhar por quase meia semana) e quando Benjamin Steinbruch, ex-presidente da FIESP disse que o trabalhador não precisa de uma hora de almoço e que ele pode ao mesmo tempo operar uma máquina e comer um sanduíche? Do nada é que aberrações como essas surgem. A ideologia da escravidão entre a elite brasileira até hoje, passados 13 decênios da Lei Áurea, também não se perpetua automaticamente. É como se fosse uma erva daninha que até hoje não teve sua raiz arrancada do solo. Ainda mais levando em consideração que ele é negro e o fato dele não se tocar que muito embora ele seja um vereador ele veio de baixo e, portanto os verdadeiros representantes da Casa Grande o olham de baixo para cima e como uma peça descartável de xadrez que a qualquer hora pode ser descartada. O que vai acontecer quando a Casa Grande achar que eles não têm mais utilidade alguma para eles (algo que talvez seja apenas questão de tempo acontecer). A Casa Grande jamais irá admiti-lo em sua confraria por mais que ele, um sujeito de origens humildes tal qual o Lula, se esforce. No fim vai nadar, nadar, nadar e morrer quando chegar na praia tal qual uma baleia encalhada.
E ele que tanta questão faz de patrulhar os professores da rede pública e querer dizer o que eles podem ou não podem ensinar em suas aulas, pelo visto parece não ter a mesma gana para fazer o mesmo nos grandes veículos de comunicação como a Rede Globo, a Rede Record e o SBT, que possuem um poder de assédio ideológico nas pessoas muito maior ao que professores de esquerda têm. Nunca vi o mesmo Fernando Holiday falar em proteger as crianças e inspecionar o conteúdo dos programas que a Rede Globo veicula em suas novelas, telejornais, programas de variedades e reality shows, por exemplo. Também nunca vi o mesmo Fernando Holiday cobrar isenção ideológica da parte dos juízes e procuradores que comandam a Operação Lava Jato e suas filiais espalhadas pelo Brasil, que tem sido conduzida da forma mais ideologizada possível. E será que ele teria peito para inspecionar o que os futuros aspirantes a juízes e procuradores de órgãos como a Polícia Federal, do Ministério Público Federal e do Judiciário aprendem em seus cursos de magistratura, ou como as nomeações para esses órgãos acontecem, já que o funcionamento dessas instituições é feito de maneira a ajudar na perpetuação ad eternum o status quo da classe dominante (e, portanto partidário até a medula)? Ao que tudo indica, não. Ou será que a mentalidade reacionária dessa gente, que acha que o lugar de gente que conteste o sistema é atrás das grades, se perpetua automaticamente? E é para essa gente, que não se dá conta de que na verdade são partes integrantes do sistema da corrupção vigente no Brasil (sistema do qual Deltan Dallagnol e Marcelo Odebrecht são as duas faces de Janus[1], o deus supremo do panteão romano) e que cuja função é punir aqueles cuja permanência em algum cargo importante é algo que não mais interessa aos verdadeiros donos do poder por meio de acusações eivadas com o mais tacanho e rasteiro moralismo tais como corrupção, desvios de dinheiro público e afins (haja vista o recente caso de Sérgio Cabral Filho, ex-governador do Rio de Janeiro, preso sob ordens de Marcelo Bretas), que o Escola sem Partido pretende que sejam levados os casos de proselitismo ideológico denunciados por lei (onde certamente será feita vistas grossas para com os casos de proselitismo ideológico mais afinados ideologicamente com a gente reacionária que pulula em órgãos como o Judiciário e o Ministério Público ao mesmo tempo em que os casos de proselitismo ideológico esquerdista serão punidos com todo o rigor da lei, ainda mais na situação em que o país se encontra, onde há um risco muito grande de se implantar um regime de terror de Estado similar ao que existente na Colômbia e amparado por gente como Moro, Dallagnol e Bretas).
Para gente como Fernando Holiday, Miguel Nagib e outros partidários do Escola sem Partido só configura assédio ideológico o que professores de esquerda fazem em sala de aula. Já para instâncias de poder bem mais altas e mais afinadas com o sistema que são tão o mais partidárias quanto o proselitismo ideológico de esquerda em sala de aula vistas grossas se faz. No fim das contas ele certamente não quer mexer com quem tem muito mais poder que ele. Ou talvez nem faça questão disso. É a corda mais uma vez rompendo no lado mais fraco, como de praxe.
No fim das contas, Fernando Holiday, para além do reacionarismo raivoso que está à vista de todos nós, nada mais é que o emblema de um sintoma. O sintoma do fato de que a política social petista nesses anos todos só se preocupou em inserir o pobre na sociedade por meio do consumo sem se preocupar ao mesmo tempo com sua politização. Uma figura como essa bem dificilmente apareceria, por exemplo, na Venezuela, onde o regime bolivariano politizou por meio dos círculos bolivarianos e das misiones as pessoas que foram beneficiadas por suas políticas sociais. Isso mostra que enquanto a esquerda não der a devida atenção à politização das massas, muitos outros Fernandos Holidays aparecerão engrossando as fileiras de movimentos reacionários como o MBL e defendendo pautas como Escola sem Partido, terceirização e políticas neoliberais.

Foto – Fernando Holiday e sua visão sobre o que a escola deve ensinar aos alunos.

Fontes:
05/04/2017 – Por que Fernando Holiday faz todo aquele espetáculo? Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=NUJecQ8LaEU
Análise na íntegra sobre Fernando Holiday (MBL). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=TxeVa9XhMtw
“Chutar Holiday e seu bando fascista das escolas”. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Y5UnOOMvvio
Dallagnol é parte integrante do regime político do Brasil. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=QHgF6ULA1VE
Fernando Holiday. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Holiday
Pela jornada de 80 horas para quem vestiu camisa amarela. Disponível em: http://www.blogdacidadania.com.br/2016/07/pela-jornada-de-80-horas-para-quem-vestiu-camiseta-amarela/
Por que Fernando Holiday está invadindo escolas públicas. Por Mauro Donato. Disponível em: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/por-que-fernando-holiday-esta-invadindo-escolas-publicas-por-mauro-donato/

NOTA:

[1] Leia-se “Ianus”. No latim, assim como em idiomas como o alemão, o holandês, o húngaro, o polonês, o servo-croata, as línguas escandinavas e bálticas, o tcheco, o eslovaco e outros tantos, a partícula j tem valor de i.

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